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A vida de Pamela não estava toda aquela Coca-cola de boa. A propósito, ela nem se quer gostava de Coca-cola. Simplesmente a detestava. Quando bebia, parecia que o líquido queria queimar seus pulmões. Sem falar, quando, do nada, o gás da bebida passava por seu nariz, causando-lhe uma sensação detestável.

É, vai ver que sua vida realmente estava uma Coca-cola.

Desde que seu pai, Donalberto, se assumiu gay e as abandonou para viver da dança em uma boate LGBT, do tipo que nunca para em um lugar só, as coisas ficaram bem mais difíceis.

Pamela se levantou da cama, e ignorou os livros empilhados perto da mesma. Passou pela cortina que separava seu quarto da cozinha e encontrou a mãe separando os feijões bons dos estragados em cima da velha mesa "manca". Um fio reluzente de sol passava pela brecha no telhado, refletindo nos cabelos castanhos e lisos de sua mãe. Pamela precisava concerta logo aquele buraco. Não só aquele, mas também todos os outros espalhados pela casa. Quando a chuva chegasse, não queria ficar distribuindo baldes e copos para que a água pingasse dentro.

---- O gás do fogão ta acabando. O fogo ja ta ficando fraco.

Renata, sua mãe, disse ao ouvi-la pegar um pão ja adormecido dentro da sacola encima da bancada, do lado do fogão.

---- Amanhã eu recebo meu dinheiro. Talvez dê pra comprar um botijão pequeno e mais comida.

Deixou o pão de lado, fazendo uma careta para o mesmo.

---- Também tem que comprar ração pra Beyoncé -- Renata disse ao ver a cadela passar. Uma vira-lata, cadela de Donalberto, que também foi deixada para trás ---- Não sei porquê teu pai não levou essa peste junto com ele. Essa coisa só da trabalho.

A vira-lata parou e sentou-se em frente os pés de Pamela, com uma cara de pidona de quem queria o pão encima da bancada.

---- Não fala assim dela -- jogou o pão para a cadela ---- É só um animal.

---- Um animal que da trabalho.

Pamela não respondeu, sabia que a mãe só queria um motivo para voltar a velha discussão. A cadela era sempre um bom motivo para que reclamasse. Na verdade, Renata nem se quer conseguia ver Beyoncé sem dar um jeito de contornar a situação de um jeito que conseguisse falar mal do pai de Pamela. Até o fato de não poder chamá-lo de ex-marido, de certa forma, a irritava. Não eram casados, apenas, juntados.

Palmas foram escutadas do lado de fora e a garota foi correndo atender. O alívio se expandido cada vez mais por seu corpo. Quando viu quem era, o sorriso só faltou lhe rasgar o rosto.

---- Mãee, o Vitor chegou. Posso ir lá?

---- Vai pela sombra, menina!

Ela fechou a porta e foi para a casa do amigo. Um sorriso enorme lhe enfeitava a face, sorriso no qual ele também retribuira.

Uma semana antes haviam combinado de passar o domingo inteiro assistindo filmes na casa de Vitor (seu grande e único amigo desde que se mudou para o bairro, 2 anos antes). O dia em que ele ganharia um aparelho DVD novo. Ela estava feliz, e ele mais ainda em tê-la como companhia. Passaram o dia inteirinho assistindo dos mais melosos romances, até os mais pavorosos filmes de terror.

Ela estava aproveitando ao máximo. No dia seguinte, teria que volta para o emprego.

Fellipe.

Fellipe xingava e resmungava. Sua irmã teria que ir naquele baile de qualquer jeito. Qualquer. jeito. Ele bem sabia do que o manda-chuva do morro era capaz de fazer quando desobedecido. Os resultados da desobediência ao "manda-chuva", por mais ridícula que pudesse ser a ordem, eram simplesmente catastróficos.

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