Casa

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— Falta alguma coisa? - Phillip me pergunta.
— Não tenho certeza - digo observando as malas.
— Vamos pagar mais caro no peso extra do que na passagem - ele diz.
— Não tem como deixar nada pra trás - digo.
— Não é como se estivéssemos indo embora para sempre - ele diz.
— Estamos indo para casa.
— Vai dar tudo certo - ele diz beijando minha cabeça e tirando a necessarie vazia da minha mão.
— Parece longe de estar certo.
— Diga á mamãe, filha - ele diz pegando Sammy nos braços - O quão dramática ela é.
— Dramática? Você me escondeu que estou prestes a perder meu bebê judicialmente - digo.
— Nem que precisemos fugir pra as Maldivas, que eu precise me especializar em medicina natural para sobrevivermos de coco e peixe e possamos ver Sammy crescer entre as ondas, com o pé sujo de areia e como fugitiva.
— Samantha merece o mundo - digo - Não quero restringi-la.
— Ela já vive restrita - ele diz enrolando o tubo de oxigênio nos dedos.
— Pra mim se ela usasse a cânula até um ano, não se lembraria disso e poderia correr livremente.
— Falta tanto pra ela fazer um ano.
— Passa mais rápido do que imagina.
Ele acaricia meus cabelos, Sammy começa a chorar e Phillip a pega.
— Vi um restaurante online, é bem reservado, pensei em irmos antes do voo - ele diz ninando-a.
— Encontro você e Sammy lá - digo - Ainda tem algo que tenho que fazer.
— O que? - ele pergunta dedilhando os dedos pelos cabelos de Sammy que deita em seu ombro.
— Nada muito importante - digo voltando minha atenção as malas - Deixei umas roupas reservadas, e preciso buscá-las.
— Você está brincando?
— Tudo bem, - digo virando os olhos - Mas ainda preciso ir pra cancelar o depósito.
— Ok, mas esteja no restaurante as 14h.
— Mande o endereço por mensagem - digo - Melhor eu já ir pra não te atrasar, deixei a roupa de Sammy sobre a cama, pode trocá-la pra mim?
Beijo a bochecha de Sammy e selo os lábios de Phillip. Pego o casaco e uso o celular para chamar um táxi.
Chego ao meu destino, entro e logo me reconhecem.
— Estava esperando por você - uma funcionária diz.
— E então? - pergunto.
— Veja por si só - ela diz me levando pelos corredores.
— Hey - digo sentando - Como está mãe?
— Segure a mão dela - a mesma enfermeira diz. Ao fazer isso sinto ela apertar levemente minha mão de volta - Suas visitas estão sendo boas para ela, acredito que há chances dela acordar.
— Vou precisar ficar um tempo longe.
— Tem certeza? Helena não progride tanto há muito tempo.
— Samantha precisa de mim, e nesse momento ela é meu foco.
— Sua filha é importante, mas não se esqueça da sua mãe - ela diz - Vou deixar vocês a sós.
— Mamãe - sussurro, um pouco mais alto do que a primeira vez que disse essas palavras aqui - Queria levá-la comigo, queria tanto que pudesse segurar Sammy em seus braços e dizer o quanto ela não se parece comigo, vovó diz que vocês têm os mesmo olhos, eu os acho parecidos com o de Phillip, então tenho certeza que me perderia nos seus olhos também.
— Sabia que não tinha nada a ver com loja - ouço a voz de Phillip atrás de mim.
— O que está fazendo aqui? - pergunto virando-me e me deparando com Sammy em seus braços - Não devia ter trazido ela.
— É uma clínica privada, não um hospital público, ela está segura - ele diz entregando-a - Sempre imaginei como sua mãe se parecia.
— Como descobriu que eu estava aqui? - pergunto.
— Sua avó me contou - ele diz - Além de que tenho analisado o caso da sua mãe, e recebo o histórico de visita de bônus.
— Privacidade não existe?
— Moraremos juntos, acostume-se - ele diz tocando o rosto dela.
— Pare de ser estranho - digo.
— Estou vendo os reflexos dela.
— Você não é neurologista.
— Tenho uma noção básica - ele diz ignorando minha presença.
— Pare de fazer isso - digo colando Sammy sobre a cama e puxando o ombro de Phillip.
— Fique quieta - ele diz tapando minha boca e apontando para Sammy.
Samantha engatinha pela primeira vez sobre o corpo inerte da minha mãe, Phillip aponta e percebo que a mão de minha mãe está mexendo.
— São espasmos - digo com sua mão, um pouco mais frouxa, mas ainda sobre a minha boca.
— Não parece ser involuntário - ele sussurra.
— Qual a diferença? - pergunto.
— Fique quieta Rebecca - ele diz com a voz mais firme.
Assustando-me minha mãe se mexe.
— O que está acontecendo? - pergunto.
— Rebecca - ele me repreende, com isso minha mãe respira fundo mexendo os dedos - Seu nome é o gatilho - ele sussurra ao meu ouvido.
— Ela está em coma, não em hipnose - digo.
— O subconsciente funciona de forma parecida nos dois casos - ele diz.
— Phillip alguém já disse meu nome nesses anos - digo.
— Mas não com você presente - ele diz.
— Estou vindo aqui a meses.
— Me refiro a versão mini de você - ele diz apontando para Sammy que está sentada nos encarando.
— O que fazemos? - pergunto.
— Vou chamar um dos médicos, não saia daqui - ele diz soltando-me.
Espero Phillip voltar, antes de o médico checar minha mãe, pego Sammy no colo.
— Senhorita Monelise vou levá-la para exames conclusivos - ele me informa.
— Quanto tempo temos? - pergunto pra Phillip.
— Um pouco mais de duas horas - ele diz.
— Eu não quero fazer isso - digo com meus olhos cheios de lágrimas - Vá com Sammy pra Boston, te encontro quando minha mãe estiver estável.
— Tem certeza? Seus avós estão dispostos a ficar com sua mãe.
— Eu sempre quis uma mãe - digo - Não posso abandoná-la agora.
— E quanto a Sammy?
— A única pessoa que confio minha filha é o incrível pai dela.
— Esteja conosco o quanto antes - ele diz segurando minha mão.
— Cuide bem dela - digo - Qualquer coisa me ligue, qualquer coisa mesmo.
— Digo o mesmo.
— Vou sentir sua falta - digo.
— Morrerei de saudades de você.
— Eu não queria desmama-la agora.
Phillip me abraça, e afundo meu rosto molhado em seu peito.
— Faça o que achar certo - ele diz acariciando meus cabelos. Sammy entre nós empurra para nós afastar.
— Você vão ficar bem com o papai, não é meu amor? - digo encarando seus olhos - Lá você vai ter a vovó Phoebe para te apertar, e sei que seu avô está morrendo de saudades de você.
— E de você também - Phillip completa.
— Não posso deixá-la agora - digo.
— Sammy precisa de você.
— E também precisa estar nos Estados Unidos.
— Venha conosco - ele insiste.
— Você foi o que mais me incentivou a ficar do lado da minha mãe - digo.
— E você fez isso magistralmente.
— Tenho que continuar fazendo - digo.
— Posso contratar o melhor neurologista do mundo, só venha comigo - ele diz segurando minha mão livre.
— Não Phillip, você não pode - digo - Estamos quebrados, esqueceu?
— Eu estou quebrado, você tem uma herança pendente.
— Não existe mais eu ou você, somos nós, os três - digo - Além de que o dinheiro é da minha mãe.
— Primeiro, nem que eu precisasse pegar dias de plantão seguidos, eu faria pra ver vocês felizes - ele diz - E também eu não quero ficar longe de vocês, nem deixá-la longe da mãe dela.
— O que faremos? - pergunto.
— Vou adiar o voo pra amanhã - ele responde - Os exames já terão saído e poderemos ir juntos embora.
Beijo os lábios de Phillip concordando com a ideia.
— Vamos para o apartamento, esperaremos eles ligaram - digo.
Passamos a tarde esperando a clínica ligar. Acabo por dormir no sofá enquanto Phillip assiste algum filme.
Sou acordada pelo som insistente do telefone fixo. Minha avó atende e conversa com a pessoa do outro lado da linha. Ao desligar ela abandona o cômodo sem me dar explicação, levanto-me e a sigo.
— O que foi? - pergunto.
— Houve atividade cerebral - ela diz na presença de meu avô.
— E o que faremos? - ele pergunta.
— Eles são os melhores na área, vamos esperar para ver o que acontece - ela diz.
— Esperar? - digo cabisbaixa.
— Rebecca, pelo menos uma vez me escute - minha avó diz segurando minhas bochechas - Helena é minha filha e eu vou cuidar dela, Samantha é sua e é seu dever lutar por ela, vá e qualquer novidade que tiver te ligarei no mesmo instante.
Concordo com um movimento de cabeça, ainda com suas mãos frias no meu rosto.
— Qualquer coisa que vocês precisarem nos avisem - meu avô diz me abraçando.
— Pedi para João remarcar o vôo de vocês, acredito que seja melhor viajarem a noite por causa de Sammy - minha avó diz acariciando meu rosto - Vou sentir sua falta, me mande fotos de vocês todos os dias.
— Eu não sei o que teria feito sem vocês - digo abraçando-os.

Por AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora