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 Futuros problemas

  Lidi acompanhou Iani até a porta do quarto se despedindo com um breve sorriso, assim que se viu novamente sozinha a jovem jogou o corpo sobre a grande cama afundando em meio as cobertas macias e os pensamentos confusos. 

—Estou em um lugar onde as pessoas são lobos — sua voz ecoou pelo silencio — O quão maluco isso parece? — sem que se desse conta estava sorrindo — O que você acharia disso senhora Lara? — mais uma vez as palavras se chocaram com o vazio, só que esse se encontrava dentro dela.

Com a saudade crescendo no peito Iani conteu as lágrimas procurando outra coisa no que se ocupar, por sorte, o que ela mais tinha no momento eram motivos para ocupar a cabeça. Mirando o teto ela deixou os pensamentos voarem, sabia que não ia conseguir processar todos de uma só vez então simplesmente os aceitou, como um sonho na qual você não espera acordar tão cedo.

—Ah!É mesmo...

Lembrando do ferimento ela se colocou de pé indo em direção ao grande espelho oval. Pelas janelas o brilho alaranjado do fim da tarde começava a preencher o cômodo, logo iria anoitecer, seria sua primeira noite fora de casa mas Iani não parecia preocupada com isso, seus pensamentos estavam em outra coisa, algo que havia apagado completamente qualquer um dos outros pensamentos.

—Mas como isso...

Os olhos castanhos miravam com assombro a pele integra onde deveria estar o ferimento profundo causado pela arma do caçador. Iani não sabia mas ainda havia muito a se descobrir sobre aquele estranho mundo. Da mesma forma que havia muito a descobrir sobre ela mesma. 

...

Pelo vasta sala abarrotada de livros um homem se encontrava sentado de frente a uma mesa com pilhas e mais pilhas de pergaminhos. Aaron havia utilizado boa parte da manhã tentando ler cada uma daquelas folhas mas, com o passar do tempo se deu por vencido largando os pergaminhos e se concentrando justamente no que lhe havia feito perder a concentração. Iani. Por décadas precisou lidar com muitos problemas e situações inusitadas mas dessa vez era diferente e ele sabia disso.

—Aaron?Posso entrar?

Uma voz abafada ecoou do outro lado da porta arrancando-o momentaneamente dos seus pensamentos.

—Entre Esteve.

O rapaz de cabelos cinzas e olhos verdes surgiu pelas prateleiras com um sorriso no rosto.

—Consegui lidar com Maicon e os outros três encrenqueiros!Acho que depois da nova tarefa que os atribui vão pensar muuuitas vezes antes de aprontarem qualquer gracinha.

Sem cerimonias Esteve se largou na poltrona vaga de frente com a mesa onde Aaron estava.

—Pelo visto os problemas não param de chegar — um assovio saiu dos seus lábios antes dele pegar uma folha de pergaminho — Pensei que fosse só aquela pilha da manhã.

—É porque ainda é a pilha da manhã.

—Uau, confesso que estou surpreso, o que aconteceu para não ter terminado?

Aaron não respondeu, não de imediato, simplesmente se levantou para pegar uma taça de vinho na qual tomou escorado em uma das paredes ásperas da sala, o ar pensativo e olhar perdido na imagem do pôr do sol.

—Fez o que eu te pedi?

—Ao que se refere exatamente?

Aaron o encarou, o olhos dourados brilhando.

—Seria sobre a humana?

—Isso.

—Ela me parece bem, nos encontramos nos jardins.

Então ela já saiu do quarto?

—Aliás, Aiko estava junto, parece que aquela bola de pelos gostou mesmo da garota.

—É compreensível, devem ter se apegado no tempo que passou no mundo humano.

—A sensação que tive é que pareciam velhos amigos mas, talvez seja mesmo isso que você falou, afinal, o tempo corre de maneira diferente nos dois mundos.

Pelo vidro da janela Aaron encarava a vastidão da floresta mantendo o ar pensativo. No fundo queria que o dia de hoje nunca tivesse acontecido, talvez assim evitasse futuros problemas relacionados a humana, problemas na quais já o perturbavam antes mesmo de existirem.

—O que foi?Está com cabeça nas nuvens hoje, mais do que o normal.

Por breves segundos Aaron havia se esquecido de que tinha companhia.

—Não é nada.

—Hmn, por acaso esse "nada" teria alguma relação com a nova membro da alcatéia?

Como se lesse seus pensamentos o homem de olhos dourados largou a taça sobre a mesa respirando fundo.

—Fico pensando em como os outros vão reagir a isso?

—Os outros, outros, ou aqueles dois?

—O que você acha? — Aaron largou o corpo sobre a poltrona sem paciência para explicar o óbvio.

—Bom, se esses outros são os outros povos, eles que se danem!Cada um cuida dos problemas da sua especie, não foi sempre assim?Ainda não me esqueço daqueles gatos sarnentos rindo da minha cara quando fui levar a proposta da rota alternativa de comércio — Esteve largou a folha de pergaminho sobre a mesa bufando — Espero que os saqueadores puxem aqueles bigodes finos e metidos até o infer-

—Já terminou de aliviar as magoas?

—Não, mas um dia eu irei — os olhos verdes brilharam — Agora, se os outros forem aqueles dois nada que o dialogo não resolva, certo?

Só de imaginar quantas reuniões teria que participar Aaron sentia sua cabeça doer.

—No máximo Dave vai querer tirar alguma vantagem em cima da humana já que a presença deles por aqui é rara, agora Maron... — Esteve ficou em silencio, o ar preocupado transparecendo em seu semblante — Eu já não sei, não faço ideia no que se passa na cabeça dele e para ser sincero nem quero imaginar — em um movimento rápido ele abraçou o próprio corpo em uma postura defensiva — Só sei que o terceiro me dá calafrios.

Lembrando das desavenças com o homem de ar sombrio Aaron respirou fundo por várias vezes, ambos tinham muitas pendências a resolverem, algumas que só os dois sabiam e que infelizmente poderiam voltar a tona com a presença da humana.

—De qualquer forma...

Esteve o trouxe de volta.

—Você já tomou a decisão de aceita-la aqui, o que mais aqueles dois podem fazer?Cada um tem sua alcatéia e seus problemas para tomarem conta e afinal, creio que Iani fará muito bem ao Aiko, talvez assim ele pare com aquelas ideias malucas de ouvir a voz da nossa antiga senhora, falo com todo respeito é claro.

O problema com seu irmão mais novo era algo que realmente andava tirando o sono de Aaron, o que antes parecia uma mera questão de sonambulismo se tornou no desaparecimento de Aiko por duas luas com seu paradeiro no mundo humano.

—Mas e então, o que vai fazer a respeito disso?A essa altura imagino que a notícia já se espalhou chegando aos ouvidos daqueles dois.

Cansado de mais para pensar nos futuros problemas que chegariam Aaron se reeconstou na poltrona deixando os olhos se perderem no céu estrelado que começava a surgir do lado de fora. Era noite de lua cheia, período em que os lobos achavam sagrado dado ao sacrifício de Mahala sob o mesmo tipo de luar. Era um período  de renovação de votos, onde a alcatéia pensava no bem de todos como um mas, naquela noite o grande líder não conseguia se concentrar em nada disso, sequer apreciar o brilho prateado que começava a inundar as planícies dos seus domínios, sua mente só conseguia focar em uma unica coisa, precisamente uma pessoa, cujo nome era Iani.







Lobos na floresta | Livro 1 (Repostando)Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon