Capítulo 10

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POV Inês

Fiquei muito feliz com a mudança de atitude de Eduardo. Agora ele colabora com todas as minhas ideias e iniciativas. Todos os dias damos nosso passeio, fazemos nossos testes de percepção e lemos nossa trilogia, já estamos no segundo livro.

Nos aproximamos ainda mais. Ele já é a minha melhor companhia e sei que estou me apaixonando, mesmo contra minha vontade.

Amanhã fará dez dias que comecei a trabalhar e iremos ao médico no período da tarde. Após dar-lhe o jantar, arrumo minhas coisas para ir embora, assim que seu pai chegar. Estou triste, pois sei que se aproxima a hora em que ele não mais precisará de mim e serei dispensada.

- Inês, venha aqui – ele me chama para sentar ao seu lado.

- Precisa de algo?

- Quero conversar com você – vejo que está nervoso, e fico apreensiva também.

- Pode falar. Algum problema?

- Sinceramente? Talvez... Eu... Eu... – sua reticência me deixa ansiosa. Por fim, respira fundo e termina – Eu posso estar apaixonado por você.

Não consigo falar nada, apenas olho para ele muda. Após uns segundos constrangedores, ele raspa a garganta e continua.

- Quis te dizer antes de tirar a bandagem de meus olhos. Não sei se voltarei a enxergar, mas sei do que sinto e nada vai mudar isto.

- Mas se não gostar de minha aparência?

- Gosto de você pelo que é. Foi meu suporte na época mais difícil de minha vida, sou grato em extremo.

- E se for só gratidão?

- Não acredito nisso. Mas e você? Posso ter esperanças?

- Eu me apeguei muito, posso inclusive estar apaixonada, mas tenho medo.

- De quê?

- E se o que sente for apenas por estar fragilizado e deixar de existir quando não precisar mais de mim?

- Inês – ele tateia até encontrar minha mão e a segura – nunca me senti tão completo como quando estou com você. Aceitaria até a cegueira de bom grado desde que estivesse ao meu lado.

Sua mão sobe por meu braço e pescoço até encontrar meu rosto. Faz o contorno de meus traços com leveza.

- Tão delicada... Quero tanto ver seu rosto, mas não por questão de beleza física, quero apenas olhar em seus olhos e repetir tudo que disse na minha escuridão.

Se aproxima lentamente e roça o nariz no meu. Seus lábios tocam os meus e não recuo. Ele aprofunda o contato e é um beijo suave, reverente.

- Conversaremos amanhã novamente, querida – diz com sua testa encostada na minha – Não tenha medo, vou provar para você que não é passageiro.

Me beija mais uma vez e é tudo que deveria ser. Nos afastamos quando a porta da entrada se abre, e seu pai chama por nós. Vou recebê-lo e me despeço constrangida de Eduardo, quando volto para a sala. Tomara que Sr. Amauri não perceba o que aconteceu, pois devo estar muito corada.

No caminho para casa, fico relembrando seu beijo. É como se fosse meu primeiro, pois as outras vezes em que aconteceu, foi pelos motivos errados, ou por pena do rapaz, ou roubado.

Porém, estou com muito medo. Não dele me achar horrível, sei que não sou feia, pelo menos é o que todos dizem, recebo muitos elogios. O problema é ele estar confuso, misturar gratidão e carinho com algo mais. Eu sei que estou apaixonada e tenho medo de sofrer quando ele perceber que não sente o mesmo.

- Boa tarde, vovó.

- Boa tarde, minha neta. O que aconteceu?

- Por que a pergunta?

- Não me engana, menina. Desembucha logo.

- Eduardo disse que gosta de mim e me beijou.

- Divera? E qual o problema? Sei que está gostando dele também.

- E se ele perceber, quando sarar, que o que sentia era apenas devido à solidão e debilidade?

- Pode ser que sim, pode ser que não. Mas, menina, não podemos vivê com medo dos "se" da vida e de sofrê. Deixa acontecê.

- Tem razão, vovó, obrigada.

- Eu sempre tenho – diz com a maior naturalidade, nem fica vermelha.

- Sim, senhora humildade.

- Fatos são fatos – me abraça forte – Vai dar tudo certo, minha neta. Meu Santo Antônio não falha.

Coloco música para tocar, Ed Sheeran para ser mais exata, e fico deitada em minha cama sonhando com meu Eduardo. Amanhã saberemos se ela voltará a ver, Deus queria que sim.

Chego a sua casa às 8h e ele me espera já vestido. A seu pedido, deixo sua roupa separada antes de ir embora, para que ele não tenha problemas.

- Bom dia, Inês.

- Bom dia – não sei como agir agora. Devo me aproximar? Beijá-lo?

- Me dê um abraço, venha cá. Senti saudades.

- Eu também – respondo tímida, ele me envolve em seus braços e estou vermelha de vergonha de admitir.

- Não quero que fique estranho entre nós. Você pensou no que conversamos?

- Sim, muito. Tenho medo, mas não vou recuar.

- Ótimo, me deixa muito feliz, pois eu não posso me afastar nem que queira. Já me tomou por inteiro – beija todo o meu rosto até chegar aos meus lábios.

- Hoje saberemos se a cirurgia deu certo – diz quando nos afastamos.

- Ansioso?

- Sim, mas a cegueira já não é mais um fardo tão pesado.

- A diferença está na forma como encaramos o problema. Estou muito orgulhosa de você.

- Obrigada, querida. Você foi crucial para minha mudança.

- Vamos tomar café da manhã? Trouxe algumas delícias da padaria de minha mãe.

- Sim, e depois faremos uma caminhada longa, pois você está me engordando.

Parte de meu trabalho é abrir sua correspondência. Fico assustada quando encontro uma carta simples, impressa, mas com uma mensagem ameaçadora:

"Você merece morrer"

Não entendo quem poderia enviar algo assim, e guardo para mostrar para seu pai. Não falo nada para ele para não estressá-lo hoje. Às 15h, seu pai vem nos buscar para a consulta, mas não consigo falar a sós com ele.

No consultório, somos logo atendidos e chegou a hora da verdade. Entro com eles na sala, mas fico afastada. O médico tira as bandagens lentamente. Nunca vi seu rosto por inteiro, já que não há fotos suas na casa e não tirava tudo quando arrumava seu curativo.

Ele abre seus olhos, pisca algumas vezes e procura por mim. Quando seu olhar azul cruza com o meu, um sorriso enorme se abre. Minhas preces foram atendidas.


Uma pitada de suspense. O que acharam?

Ensinando a sonhar - Livro 3 da Série SonhosWhere stories live. Discover now