Capítulo 6 - Rejeição

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Dormir – mesmo que apenas uma ou duas horas de um sono ruim e turbulento – foi um luxo com o qual eu não fui agraciado durante a noite. Mas depois de muito rolar pela cama e me embolar em meio aos meus lençóis eu já me encontrava sentado no sofá da nossa sala de visitas a pedido de mamãe, que entrou no meu quarto e se deitou comigo antes mesmo do Sol nascer, permanecendo ao meu lado e me fazendo carinho nos cabelos até que Mi Hee viesse nos dizer que o café da manhã já estava pronto e logo seria servido.

Mas eu não consegui comer nada, sequer coloquei algum alimento no meu prato, pois apenas o cheiro do pão e dos bolinhos recém assados por Seokie era o suficiente para me deixar enjoado. A minha cabeça parecia prestes a explodir em milhares de pedacinhos e os meus olhos pesavam por causa do acumulo de sono e do cansaço dos últimos dias, mas eu simplesmente não conseguia fechá-los porque toda vez que eu tentava relaxar e me deixar levar pela escuridão que dominava as minhas pálpebras a imagem do rosto machucado de Jungkook invadia a minha mente, esmagando o meu coração em dor e culpa.

E pensar que aquilo tudo havia acontecido por minha causa estava me matando pouco a pouco. Eu me odiava por ter deixado papai tratá-lo daquela forma. Eu fui fraco, uma criança boba e impotente, e não pude ajudá-lo quando tudo o que ele fez por mim foi me manter a salvo e em segurança quando as velas se apagaram. E eu deveria ter feito o mesmo por ele, deveria ter impedido papai de continuar com aquela selvageria, mas eu não fui capaz de protegê-lo e me odiava por isso. Me odiava tanto!

— O Senhor está bem, Senhor Park?

Eu ouvi a voz de Jungkook, que estava sentado ao meu lado e até então em completo silêncio, chegar aos meus ouvidos de maneira lenta e abafada, seu tom rouco e tão baixo quanto um sussurro denunciando que ele estava sentindo dor até mesmo para falar. E eu sequer havia percebido que as minhas mãos suavam e tremiam fortemente sobre o meu colo até sentir a sua palma as envolver em um toque macio e suave, reconfortante.

— Vai ficar tudo bem, Senhor Park. Vai ficar tudo bem.

Ele acariciou os nós dos meus dedos com o polegar, os massageando com pequenos movimentos circulares, e eu gelei no mesmo instante, engolindo a saliva acumulada na minha boca. Tomei um suspiro de coragem e ergui meu rosto na sua direção, me arrependendo no mesmo instante em que meus olhos encontraram o seu supercílio com um corte aberto e muito avermelhado, pequenos filetes de água vertendo da ferida e se acumulando nos pelos da sua sobrancelha. Seus lábios e sua bochecha também estavam muito inchados e com círculos arroxeados manchando toda a sua pele alva, mas foi o seu olho esquerdo que me assustou e roubou todo o meu ar, me deixando paralisado em descrença. Ele estava fechado, preto e tão gordo quanto uma ameixa, seus cílios colados por causa da secreção que escorria e depois secava em forma de remela nas linhas das suas pálpebras.

E vê-lo tão debilitado e machucado daquela forma fez o resto do meu coração se despedaçar em migalhas dolorosas, uma enorme vontade de chorar me devastando por dentro. E eu funguei pesado, piscando os meus olhos para afugentar as lágrimas que queriam escapar. Eu queria ajudá-lo, queria fazê-lo sarar logo ou então dividir a sua dor comigo porque eu era tão culpado quanto qualquer um por tudo o que estava acontecendo. Mas apenas fiz a única coisa que eu podia fazer: suspirei e me afastei dele, me sentindo agoniado demais com a sua gentileza. Era muito errado que ele agisse daquela forma comigo. Eu não merecia que ele fosse bom quando tudo o que eu esperava dele era o seu ódio e a sua aversão.

— Não. — eu finalmente respondi a sua pergunta, a minha voz saindo tão baixa quanto a dele. — E o senhor? O Senhor está bem, Duque Jeon?

Jungkook suspirou fortemente e devolveu o meu olhar com o seu olho bom, vasculhando todo o meu rosto em busca de algo. Ele desceu sua íris negra pelo meu peito e a parou sobre o meu abdômen, onde a minha camisa estava folgada e o nosso filho – por Deus, nosso filho! – já começava a crescer, e ergueu apenas um canto dos seus lábios, me dando o vislumbre de um sorriso que ele não conseguiu demonstrar, embora estivesse tentando.

Um mais um igual a quatro ✹ JikookOnde as histórias ganham vida. Descobre agora