5.Maurice

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—Casou hoje. — Respondi Eugene que me questiona sobre o repentino sumiço de William Blake.

Sumiu de onde? Dos teatros onde junto com Eugene cortejava Daisy, uma atriz oriental. Sabem os deuses a razão dessa moça ter acabado aqui em Londres. Digo 'os deuses' porque não dou a mínima.

— Coitada da noiva. — Fala Eugene sem emoção alguma. Está debruçado entre os livros de Direito e um pequeno rabisco de Daisy. Ela possuí os olhos grandes, a face miúda e os cabelos muito pretos. Lindíssima.

— De fato, coitada. — Completo sem vontade de continuar conversando. É extremamente desmotivador fofocar com quem nada compartilha.

Estou prestes a trocá-lo por companhia mais interessante quando me lança a questão.

— Com quem? — Uma rusga de interesse. Decido ficar. Apenas dois meses fora do país e meu amigo havia se tornado completamente alienado dos mexericos da sociedade.

— Pauline Watson. — Troco a informação sem grandes acréscimos.

— O anjo caído? — A conheço de longa data, durante a última temporada de debutantes fomos sempre os primeiros a chegar e últimos a sair. Dançamos tantas vezes que é até imoral não ter tido sequer uma visita privada. Pena que ficou noiva tão cedo, torci bastante para que encalhasse pelo menos até os vinte e dois. 

— Só anjo. É apenas fama e beleza, a moça é molenga — Posso afirmar sem sombra de dúvida. Assumo que é perspicaz, muito inteligente. Porém não tem cacife para lidar com o marido que lhe arrumaram, saiu boazinha demais.

— Nesse caso, pobrezinha, porque só Judas, Ferrabrás ou os acionistas aguentam aquele sujeito.— Eugene tem negócios com William. Ele é ótimo em gastar, Blake em ganhar. Boa associação, diga-se de passagem.

— Tem Adelia Needham. — uma viúva afamada por roubar corações, espremê-los e jogá-los no Tâmisa. Foi o sonho de qualquer aristocrata solteiro ou que simplesmente respirasse quando colocou o pé no salão pela primeira vez.  

Suspeito que ela e o noivo tem uma associação perigosa,  acho que os vi sair do quarto oculto do teatro na semana passada, mas estava bêbado demais para ter certeza e sou discreto demais para passar isso adiante. 

— Adelia, Ferrabrás...Dá no mesmo.— Eugene se cala e torna a olhar o retrato com ar saudoso e embasbacado, acabando com qualquer plano meu de continuar fofocando no quarto sem procurar ocupações fora. 

— Verdade...Dá no mesmo.— Concordei. Depois fui de fato procurar ares mais agradáveis, Eugene danou a suspirar profundamente e vê-lo dessa forma me fez sentir falta de Ava, a filha do juiz Jullian, cujo hobby é me deixar plantado ou falando sozinho. 

Creio que demorará para meu amigo remediar a paixonite. Duvido que Daisy ceda facilmente as investidas e desconfio qual seja a motivação. 

Homens a olham como se fosse um bicho raro. Aceitá-los é se colocar a exposição e disposição. 


ARSÊNICO (em andamento, repostando)Onde histórias criam vida. Descubra agora