De volta ao mundo real

370 57 29
                                    

Depois de um dia de saída com Frank, Gerard precisava voltar para a faculdade. Era incrível a forma como sua rotina, que antes era natural e a qual o garoto já havia se acostumado, se tornara uma junção de ações obrigatórias e sem graça desde que Way estava se sentindo mais livre e feliz nos momentos ao lado de Frank. 

Os únicos momentos realmente aproveitados por ele eram quando conseguia fazer arte da forma mais pura e simples, colocando de fato toda sua alma naquilo em que estava desenhando e produzindo. Ele não gostava de ouvir o professor falando palavras e mais palavras sobre uma das matérias. No fundo, ele sabia que saber da história dos artistas que viveram anteriores a ele não serviria de muita coisa. Gerard podia até gostar do ambiente universitário, de encontrar Ray e passear pelo campus, mas sentia sono e indisposição pela forma que o ensino era dado.

A verdade é que ele tinha de continuar na faculdade para obter o diploma. Não faltava muito, de qualquer maneira, e ele sabia que seus pais haviam investido muito para que os dois filhos pudessem ter um futuro no meio acadêmico. Mas o mais velho dos Way, ao contrário do brilhante irmão que era o pequeno prodígio do Direito, teria que se esforçar para completar sua formação, ainda mais depois da péssima nota em um dos exames mais importantes. Para recuperar, ele teria que estudar. Só de lembrar disso, Gerard grunhia em reclamação.

No fundo, não era aquilo que ele queria. É claro que amava arte, mas, partindo do princípio que a expressão artística é um tipo de libertação, por que ele deveria se sentir preso em um sistema daqueles? Era contraditório demais, e isso fazia com que o rapaz se questionasse se aquele era o caminho certo. Ele já havia mencionado suas inseguranças para Frank, e apenas para ele. Tinha medo do que poderia ouvir se confiasse essa informação para sua família ou para Ray, que o chamassem de desistente ou que mencionassem a dificuldade de se tornar artista sem formação oficial com um diploma universitário. Gerard podia se imaginar chegando na casa de seus pais e anunciando que iria largar seus estudos. "Mas nós fizemos de tudo para que você e seu irmão para você fazer isto?! Você espera que seu nome esteja nas principais galerias de arte francesa se você não se esforçar para isso agora? Não nos deixe envergonhados, Gerard.". Porém, aquela era uma opção que passava demais por sua cabeça para não ser considerada.

Se tudo que Gerard queria era estar com o rapaz que amava, fazendo aquilo que amava sem ter um comprometimento e pressão esmagadora sobre si, o que havia de errado? Por que ele não deveria se agarrar ao espírito de liberdade que os jovens tanto defendiam e se soltar do jeito mais puro que podia em sua vida?

Por esses motivos, o garoto chegou na universidade, teve sua primeira aula e recebeu sua prova, praticamente zerada. Não ficou mais nenhum minuto depois e saiu pelos corredores.

Enquanto o amigo ia sem limites caminhando pelo campus, Ray abriu mão da próxima aula que estava prestes a começar e decidiu tentar entender o que estava acontecendo.

- Gerard, Gerard! - ele o chamou enquanto corria atrás, chamando a atenção de alguns outros estudantes. O óculos de Ray deslizava em seu rosto pela velocidade ao tentar alcançar o outro, que se virou ao escutar o nome. Aquele era um dia frio, mas a corrida logo o esquentou e o deixou ofegante.

- Oi, Ray, o que houve? Você saiu da aula por minha causa? - o tom de Way tinha uma mistura de gratidão e surpresa.

- Eu que te pergunto! O que está acontecendo? Você simplesmente saiu sem dizer uma palavra!

Um sorriso se abriu no rosto de Gerard, que logo após apoiou suas mãos nos ombros do amigo a sua frente.

- É porque eu entendi meu propósito, Ray. Eu estou determinado e sei que vou saber como segui-lo.

Ray parecia mais confuso conforme o amigo dizia as palavras.

- Eu não entendo. Pensei que seu propósito sempre foi a arte.

- E ele continua sendo. Só que não aqui.

A expressão do amigo mudou para uma leve tristeza ao entender o que estava acontecendo.

- Então quer dizer que você vai abandonar os estudos? É isso?

- Sim. Agora mesmo vou passar na reitoria e explicar que decidi fechar minha matrícula.

- Seus pais já sabem que você vai fazer isso!

- Eles não tem a mínima ideia.

- Cara, com quem eu vou reclamar dos professores e trabalhos agora? - Ray parecia decepcionado, e Gerard envolveu ele com seu braço para consolá-lo.

- Ei, nós continuamos sendo amigos! Mas não posso continuar nessa, Ray. E, mais, eu tenho alguém agora. Um apoio que posso contar.

Ray o encarou.

- Frank, certo?  - Gerard concordou com um sinal.

- O futuro começa agora.

Ray se afastou e respirou fundo por um segundo. Olhou para as pessoas ao redor, sérias, concentradas nos livros, e percebeu que aquela era uma despedida do amigo no ambiente.

- Você sabe que eu também estou aqui para apoiar, cara. Você vai ser um artista brilhante independente de onde for. E eu já vi seu trabalho para saber disso. Além disso, meu apoio vale para você e aquele garoto, Frank.

O amigo começou a rir e o abraçou.

- Obrigado. Você é como meu outro irmão.

Eles se distanciaram e Gerard precisou correr para anunciar sua saída aos diretores do local onde estudava.

•••

Ao final daquele dia, havia apenas uma pessoa, fora seus pais, o que demoraria mais do que poucas horas, que não sabia da novidade de Gerard.

Felizmente, Mikey soubera e havia sido compreensivo como Ray, mas, como irmão, também se preocupou. Ele sempre assumia o papel de mais velho cuidador, mesmo tendo três anos a menos que o outro.

A pessoa que faltava era Frank e, por isso, seu namorado se encontrava na tentativa de ligar para ele. Era a quarta vez que estava parado no telefone tentando tomar coragem para finalmente chamar seu número e saber o que receberia de retorno. Sua mente  já estava devaneando entre as possibilidades que ele poderia responder. Na quinta tentativa, ele atendeu.

- Frank! Eu estava tentando falar contigo. Uma coisa aconteceu agora, e eu...

- Gerard... - a voz de Frank estava trêmula e ele ouvia a voz femina de alguém chorando no fundo. - Me desculpe, eu não posso falar agora.

- O que aconteceu? - Way gelou em preocupação.

- Meu pai. Ele sofreu um acidente. Ele está... Ele está morto, Gerard. - Frank desabou no choro.

Seu namorado não soube o que responder naquele momento. Frank se sentia destruído pela perda e não tinha ideia do que fazer agora.

1968; frerardWhere stories live. Discover now