Surpresa!

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Adália, triste, assistia pela janela o cair violento da água da chuva que descia pelas telhas e jorrava no chão produzindo um som característico. Era um escurecer melancólico. Ela cruzou os braços frente o corpo abraçando o xale pesado que jogara sobre os ombros. Tinha vontade de se deitar, mas não seria de bom tom deixar o doutor Astronildo sem a atenção dela antes do jantar.

Pedro conversava com o homem sobre assuntos aleatórios. Estava tão triste quanto a esposa. O olhar denso e sem esperança focava o chão mais que o rosto do médico, que infelizmente não teria meios de voltar para casa. Não era aconselhável que conduzisse sob tanta água que caía dos céus.

Era bom que tivesse ido até a fazenda, assim pôde examinar e medicar Tomaz e Luando que se recuperavam hospedados em um quarto da casa.

- Acha que não seria aconselhável viajar agora, doutor? - Pedro questionou.

- Não. A senhora condessa poria em risco a gravidez em curso. - O homem respondeu com gravidade. - Já basta o sofrimento dos últimos dias. É estritamente aconselhado que não unam isso ao cansaço de uma viagem extenuante.

Pedro suspirou.

- Tem razão, senhor. - Deu-se por vencido.

- Gosto de você, Pedro. Sempre foi um homem centrado. - Astronildo revelou. - Admiro seu esforço para que todos fiquem bem e este é o motivo que me faz atender sempre que você me chama, faça chuva ou sol, dia ou noite.

O médico bebeu um pouco do uísque do copo e continuou a falar enquanto tinha a total atenção de Adália e Pedro.

- Gostava da senhorita Sorte também. Uma moça muito inteligente. Sinceramente não acho que vocês tenham muito de seus pais, com o passar dos anos e a ausência deles, vocês acabaram desenvolvendo genuínas personalidades. - O médico fez uma pausa e olhou para o teto enquanto passava a mão em na própria barba. - Fiz gosto de assisti-los crescer. A despedida de hoje não foi fácil. Só pensava em minha própria menina e em como estaria devastado se ela morresse. Sei que não está simples, Pedro. Nunca é. Entretanto a vida segue.

Pedro sentiu um nó na garganta e começou a chorar. Adália choraria se as lágrimas não tivessem secado. Em vez do desabafo do choro, sentia uma pressão desconfortável.

Devagar a mulher andou até o marido. Sentou-se ao lado dele e o abraçou pelos ombros. Uma cozinheira apareceu para avisar que o jantar estava servido. Aquele era trabalho de Matilde, mas a pobre estava no quarto, deitada, sem vontade de fazer outra coisa que não fosse chorar.

Os três que estavam na sala se puseram de pé. Mesmo que os anfitriões não tivessem fome, precisavam ser gentis com as visitas.

Já era noite quando Francisco Almeida chegou à vila em seu cavalo enlameado. Parou direto na casa do médico, apeou do animal, andou pela rua coberta de lama e gritou do portão. Precisou fazer estardalhaço até que a esposa do médico aparecesse na janela. O marquês perguntou onde o homem estava e ela explicou que ele fora para a fazenda Olivares.

Francisco agradeceu pela informação, em seguida montou no cavalo e partiu para o lugar ao qual o filho se dirigia.

Em uma bodega próxima, o senhor Weirtz, que tomava uma cachaça com os companheiros de copo, ouviu o marquês. Quase que imediatamente o homem também montou em seu cavalo e partiu no escuro da noite.

Na fazenda dos marqueses, Ofélia fizera uma pausa nas orações para tomar banho e jantar junto com Mirtes, que ela tratou de colocar para dormir. A pequena adormeceu logo por estar cansada de brincar e Ofélia voltou para as orações. Ajoelhada ao lado da cama, de costas para a porta de entrada do quarto ela segurava seu terço.

Sorte e o Marquês (Donas do Império - Livro 1) [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now