— Pai? — Ofélia perguntou com os olhos cheios de lágrimas.
— Deseja viajar, Ofélia? — O homem inquiriu com um sorriso de escárnio.
— Pai, eu não podia manter o... — A moça não conseguiu terminar a frase, pois o pai acertou-lhe um tapa na face.
— Você só me trouxe desgosto, Ofélia. — Disse calmamente enquanto a arrastava pelos cabelos.
Ofélia chorava assustada, não sabia o que fazer. Tinha o cano de uma arma apontado para si.— Pai, por favor. — Implorou para que ele parasse, mas ele não parou.
Pelo contrário, o homem acertou um soco na lateral da cabeça da moça. A pele da têmpora abriu tamanha a força do golpe.
Ofélia ficou desnorteada, zonza por um tempo.
— Não me chame de pai. — Sussurrou enquanto a arrastava pelo piso do corredor. — Eu disse que daria cabo de si, Ofélia. Sou um homem de palavra. Dessa vez não perdoarei o fato de você ser mulher, burra por natureza. Não. Você provocou todo esse sofrimento, a culpa é sua.
Ofélia, meio consciente, sentiu a dor quando o pai a arrastou escada abaixo, sem gentileza.
— Sou um homem da razão, Ofélia. Tenho humanidade em mim. — Weirtz continuou seu discurso tresloucado. — Sou dotado de um coração que se apieda, mas é claro que, apenas quando as pessoas merecem. Veja, você provocou sua própria dor. Sim. Tão humana frágil e errada.
Caridade? Bondade? Forças maiores que você? Isso não existe, Ofélia. Se o marido não a quis, foi porque você é inútil.
— Eu... — Ofélia tentou se defender, mas a boca estava mole e a língua grossa.
— Shh! — Weirtz repreendeu. — Olha a roupa que vestes. Quem a desejará nessas condições? Com camisolão de homem. Antes de casar era uma vagabunda. Praticamente se oferecia com toda sua suculência juvenil. Então se casa e vira uma maldita beata.
Weirtz arrastou a moça por mais um lance de escadas. Ela sentiu alguns ossos se partirem. O couro cabeludo doía mais e mais conforme recuperava a consciência. Tentou se mexer, mas descobriu que o corpo não obedecia mais.
A chuva ainda caía pesada lá fora, e o barulho era intenso demais. Ninguém naquela enorme casa ouviria o pai falar naquele tom moderado.
— Onde está minha mãe? — Ofélia balbuciou com o maxilar trêmulo.
— No lugar para onde você irá também, Ofélia. O inferno. — Respondeu enquanto jogava o corpo da moça no chão da sala.
Ofélia começou a chorar. Apoiou as mãos no chão e os joelhos também, em uma tentativa de se levantar. Entretanto, o torpe Weirtz chutou-lhe a barriga derrubando-a no chão. A moça tossiu sem ar. Na branca camisola, a marca da bota enlameada estava gravada com nitidez. Ela sentia uma dor aguda, como se os órgãos se desfizessem dentro da pele.
— Reaja, Ofélia! — Weirtz se alterou. — Você não se defende porque não quer.
Ela queria, mas não podia. Não tinha forças.
— Olhe para mim. — Weirtz agarrou os cabelos da moça e ela chorou ainda mais de dor. Sem piedade, fez com que olhasse para os olhos injetados de ódio. — Ninguém terá piedade de você, Ofélia. Basta eu fazer um discurso coerente, escolher as palavras certas e mexer com o coração deles. É assim que os inocentes se tornam culpados e vice-versa, através das palavras. Uma pena que eu não tenha um público aqui, eles me aplaudiriam.
Com força, Weirtz lançou a filha contra o chão outra vez. Um chumaço de cabelos louros foi arrancado no processo e ficou preso nos dedos do homem.
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Sorte e o Marquês (Donas do Império - Livro 1) [CONCLUÍDO]
Historical Fiction[Romance] No interior do Império do Brasil, à altura do início do Século XIX, nasceram nobres crianças que ganharam nomes peculiares. Ele sempre teve muita sorte e ela incessantemente perseguida pelo azar. O que acontecerá quando o caminho de ambos...