𝗕𝗲𝗺-𝗩𝗶𝗻𝗱𝗮

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𝐒𝐞𝐠𝐮𝐧𝐝𝐚-𝐟𝐞𝐢𝐫𝐚, 𝟎𝟏 𝐝𝐞 𝐌𝐚𝐢𝐨 𝐝𝐞 𝟏𝟗𝟖𝟗

O que eu mais gosto em pessoas é que cada uma tem seu mistério, nunca sabemos o que há atrás de um olhar e, das situações que cada um passa. Hoje, irei contar a história de Charlotte Bowers.

Todos nós temos nossas aventuras e desafios, e, com Charlotte não era diferente. Dessa vez a sua aventura era em Derry, uma cidade interiorana nos Estados Unidos. Ela não sabia o que esperar de lá.

Charlotte Elisabeth Bowers era britânica, nascida em Londres. Era filha de Genevive Jackson, uma bem-sucedida empresária de moda. Seus últimos três anos com a mãe não haviam sido nada bons. As duas ainda lidavam com a perda de Aurora, mãe de Genevive e avó da menina.

Para toda a Inglaterra, a americana era um ícone da moda, uma socialite, mas para a própria filha,  não passava de uma bêbada e péssima mãe. A dor invadia o peito de Charlotte todas as noites, antes de dormir. Todos os dias via a mãe se afundando mais e mais, e, de pouco a pouco, se sentia mais mal-amada.

A única imagem que vinha à sua mente, era da avó . Lembrava-se do gosto da sua comida única, do seu cheiro e dos cafunés . Uma senhora muito elegante. Com sorrisos brancos e sempre com jóias em torno de seu pescoço. Para alguns Aurora era como o nascer do sol, mas, para outros era apenas uma chata protestante. Na verdade, Charlotte cresceu no protestantismo, por conta de sua avó, mas, depois que ela se foi, dúvidas brotaram quanto a existência de Deus. Não entendia o porquê de pessoas não serem eternas.

O verão estava perto, e a menina sabia que não iria a lugar nenhum por conta do trabalho da mãe. Olhou da janela de seu luxuoso quarto e viu um pai com uma criança, então pensou a si mesma : "Por que não ?". Saiu correndo na mesma hora para o quarto de Genevive, que estava sentada na cama com uma taça de champagne.

- Mãe , posso te fazer uma pergunta ? - A menina perguntou com uma voz fina, tentando se mostrar bondosa.

- Fala, Charlotte, estou ocupada - a mulher disse olhando fixamente para a parede que estava à sua frente.

- O que você achar de eu passar as minhas férias na casa do meu pai ? Sei que não vamos sair daqui mesmo !

- Você está louca ? Seu pai é o humano mais deplorável que eu já conheci na minha vida. A resposta é não, com certeza não - a fina mulher com longos cabelos loiros e um lindo nariz empinado gritou para a filha.

- Sabe mãe, eu tenho o total direito de saber minhas origens e conhecer o homem no qual deu meu sobrenome. Ele é uma parte minha, minha parte americana - a menina retrucou, deixando a mãe sem palavras.

- Tudo bem. Eu deixo, amanhã compro a sua passagem e peço pra minha secretária ligar para ele, mas, se não gostar de lá não venha de dizer que não avisei - a mulher disse, expulsando a filha do quarto.

𝐒𝐚𝐛𝐚𝐝𝐨, 𝟎𝟑 𝐝𝐞 𝐉𝐮𝐧𝐡𝐨 𝐝𝐞 𝟏𝟗𝟖𝟗

O sol invadia a pequena e retangular janela do assento de Charlotte, a menina acordava, com um ar de esperança. Ela não fazia ideia de como seu pai estaria nos dias de hoje, já que a única pista que tinha era uma foto amassada do casamento do próprio. E, na verdade nem sabia muito sobre ele. Só sabia que ele era um "monstro" e que trabalhava como policial na cidadezinha.

O avião pousou, e a britânica se dirigiu ao desembarque procurando alguém parecido com o da foto. Viu um homem com um aspecto um pouco cansado, com os traços do rosto mal-desenhados. Estava com uma placa com o nome da menina, que foi em direção a ele.

- Charlotte ? É você ! - O homem gritou sorrindo e abraçando a menina tão forte que nem conseguia respirar.

- Eu sonhei a vida toda com esse momento - a menina sorriu, tentando recuperar o fôlego e prendendo a respiração por conta do mal odor do pai.

Inesperadamente teve um pressentimento ruim de como seria o verão, mas, logo esqueceu, já que seu coração geralmente era um local muito frágil e falso ao mesmo tempo.

Pai e filha entraram no carro, vermelho e um pouco acabado. A menina tinha milhares de perguntas para fazer ao homem, mas a timidez não deixava, então apenas olhava para o chão. O sol estava nascendo, e, o homem abriu as janelas, fazendo com que o vento invadisse o carro.

Charlotte, ao menos uma vez na vida, se sentiu livre ! Livre como um pássaro que ficou engaiolado por anos e voava pela primeira vez. Os seus negros cabelos ondulados voavam, voavam como se não houvesse um amanhã. A menina sorriu, mas o sorriso era diferente, um sorriso sincero, e mais brilhante do que os que ela dava no dia-a-dia. Pelo jeito, havia encontrado a felicidade que procurava desde que sua avó morreu.

Já Bunch (sim, esse era seu nome) sentia que agora sairia do fundo do poço, no qual estava há anos. Sua vida não seria a mesma pacata de sempre, e, quem sabe, mudasse para melhor ? Ainda era tempo de mudar.

O tempo havia feito dele um caipira grosseiro. Somos o que o tempo nos faz ser, e não o que nascemos sendo e, o esperado havia acontecido com o pai.

A Extraordinária História de Charlotte Bowers (PRIMEIRA VERSÃO)Where stories live. Discover now