Ele pareceu não entender bem o que eu queria dizer, mas me olhou com profundo interesse para que eu continuasse. Eu sorri e servi um pouco de macarrão para ele e em seguida para mim mesma. Também enchi novamente nossas taças que estavam pela metade. Ele sorriu, parecendo surpreso.
— O que eu quero dizer é que não há nada em mim que não tenha sido me dado. Não há nada de bom em mim que seja meu. — Eu dei uma garfada no macarrão e depois de engolir falei: — Nós amamos porque Ele nos amou. Desse mesmo modo, nós somos pacientes pois Ele foi paciente conosco. Inclusive, Ele foi extremamente paciente comigo.
Isso pareceu deixá-lo ainda mais interessado, então eu continuei.
— Eu nasci em um lar cristão, mas eu nem sempre fui uma cristã de verdade. Sinto que no começo da caminhada eu apenas tinha aceitado o rótulo por ser a tradição, por nunca ter tido o trabalho de entender o que aquilo significava, essas coisas. Então, em um momento decisivo da minha vida, eu precisei ser confrontada sobre essa verdade.
— Que momento foi esse? — Ele questionou enquanto levava uma porção de macarrão a boca. — Nossa, isso aqui tá muito bom.
— Bom, isso durou alguns anos, mas começou no segundo ano da faculdade de medicina. Você sabe que lá não é um lugar muito receptivo aos ensinos de Deus e tal, então tiveram momentos onde eu quis muito negar minha fé para ser mais aceita, para não ser vista como burra, ou como uma profissional com menos credibilidade científica.
— Quis?
— Na verdade, eu neguei algumas vezes. Queria me sentir inclusa e isso era o que importava. Depois disso eu tive várias fases de questionar o que eu conhecia de fato sobre Deus. Descobri que eu só o conhecia de ouvir falar e então Ele foi bondoso em se revelar para mim. Mas confesso que foi uma jornada de montanha-russa. Ainda é, às vezes. Só que aquela virada precisava acontecer.
— No Iraque foi o ponto crítico dessa jornada?
— Pode ter certeza disso. — Dei um gole no vinho. — No Iraque eu cheguei ao extremo de negar a existência de Deus, isso mesmo tendo sido preparada por missionários amorosos e comprometidos, mesmo depois de ter iniciado meu relacionamento pessoal com Ele. Era tanta dor que eu não conseguia enxergá-Lo.
— E como enfim o enxergou?
— Eu parei de olhar para mim.
Falei sorrindo e ele pareceu entender que eu não me estenderia mais naquele assunto por hora. Tinha lançado a semente necessária até aquele momento e se tentasse convencê-lo com as minhas palavras, estaria voltando a tomar a frente das situações e Papai já tinha me ensinado de uma forma nada agradável que isso nunca dava certo. Então mudei rapidamente de assunto.
— Então, Jackson Avery, porque escondeu aquele talento musical esse tempo todo? — Ele gargalhou e quase se engasgou com um pouco de vinho.
— Você é ridícula. — Falou rindo enquanto eu caía na risada junto com ele.
— Sério, você tem paixão pela música!
— Só me falta o talento. — Ele disse voltando a gargalhar. — Mas olha, a minha cantoria me rendeu um convite para jantar...
Eu parei de rir na hora e devo ter ficado vermelha, pois minhas bochechas queimaram um pouco.
— Não precisa ficar com vergonha, estou brincando com você. — Ele tentou me deixar mais à vontade, mas eu já tava morrendo de vergonha.
— Eu não tô. — Menti. — Tu quer chocolate de sobremesa? — Perguntei sem esperar ele responder e levantei. Ele riu.
— Não tá e mudou de assunto tão rapidinho assim? Imagina se tivesse, hein? — Ele veio atrás de mim, trazendo a garrafa de vinho e as taças. Eu tinha trazido os pratos e a travessa do macarrão.
— Quem disse que eu tô mudando de assunto, Avery?
— Avery? — Ele riu. — Olha ela toda nervosinha.
Coloquei os pratos na pia e olhei para ele com cara de séria. Ele ainda tinha o semblante divertido. Fixou o olhar em mim e bebeu o resto do vinho que tinha em sua taça sem desviar aqueles olhos verdes por um só segundo. Senti meu corpo tremer um pouco e a respiração ficou um pouco mais acelerada. Os mesmos efeitos da oxitocina novamente. Mantenha a compostura, Camille. Quem já se viu?
Estava com os braços para trás apoiados na pia.
— Não vai terminar o seu vinho? — Ele questionou estendendo a taça de cristal para mim. Eu alcancei o objeto e também virei o restinho do líquido que tinha ali. Ele continuou a me encarar.
— Que que foi? — Perguntei tentando não rir.
— Tô esperando meu chocolate, ué!
Já tinha esquecido completamente disso. Então fui até a geladeira e abri a porta procurando pelo potinho onde tinha guardado alguns pedaços da barra de chocolate ao leite. Balancei o recipiente quando achei e levei até a bancada, sentando-me em uma das cadeiras altas. Ele me acompanhou e puxou uma cadeira para ele também.
— Eu acho que chocolate ao leite junto com aquele molho branco e esse vinho não vai cair bem, hein? — Ele comentou e eu mordi o primeiro pedaço da barra.
— Quem se importa? — Falei dando de ombros.
— Certamente você não. — Disse rindo e comeu em seguida. — Eu também não.
Comemos o restinho da porção em silêncio, mas Jackson não tirava os olhos dos meus. Na verdade, às vezes ele revezava entre meus olhos e meus lábios. Eu sentia um frio na barriga e ficava pensando em um jeito de não demonstrar que estava nervosa com aquela situação. Quão boba eu iria parecer para ele se demonstrasse isso?
— Tá afim de ver um filme? — Não esperei a resposta dele e já me virei como da outra vez, só que Jackson me segurou pela mão, me fazendo olhar para ele.
— O que foi? — Perguntei sentindo o coração sair pela boca.
Ele se levantou ainda segurando minha mão e me virou para si. Eu olhei no fundo daqueles olhos verdes e sabia que não podia mais resistir. Jackson me olhava de volta e então me puxou delicadamente para um beijo, colocando as duas mãos em meu rosto. Fechei os olhos imediatamente e deixei que aquela sensação maravilhosa invadisse o meu corpo. Há quanto tempo eu queria isso, meu Deus? Me sentia nas nuvens agora que estava acontecendo.
Coloquei os braços em seu pescoço e aprofundei o beijo, ele então passou os seus braços em minha cintura e me trouxe mais para perto. Naquela proximidade em que estávamos eu podia sentir seu coração batendo tão rápido quanto o meu. O beijo era maravilhoso, melhor do que eu poderia imaginar nas vezes que me peguei acordada pensando a respeito disso. Jackson também estava extremamente cheiroso e eu só queria largar da boca dele se fosse pra ir cheirar o seu pescoço.
Nos soltamos devagar, dando selinhos enquanto sorríamos.
— Finalmente. — Ele disse com um sorriso torto no rosto. — Achei que isso nunca fosse acontecer.
— Isso o quê? — Me fiz de boba enquanto acariciava seu braço.
— A gente. — Ele falou baixinho com uma voz doce, beijando o topo da minha cabeça.
— Ah é? E a gente tá acontecendo? — Perguntei me aninhando a ele e colocando a cabeça repousada em seu ombro. Ouvi ele sorrir e depois suspirar fundo.
— Sim. A gente tá acontecendo.
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A nova chefe do Trauma
FanfictionDevido aos conturbados acontecimentos dos últimos meses, Owen Hunt precisou ser afastado do cargo de chefe do Trauma. Em seu lugar, chega a doutora Camille O'live, uma jovem médica cristã que mexe com a vida do cirurgião plástico Jackson Avery. Dura...