As Fases da Lua (Degustação)

Flagrante - Cap 7

Keyla parou a moto na frente de casa. Não queria entrar, sabia que iria se aborrecer. Respirou fundo. Pegou um cigarro que deixava escondido no bagageiro, acendeu, e ficou ali, retardando o que estava por vir. Não queria ter de passar por tudo de novo, mas era inevitável. Terminou o fumo, respirou mais fundo, e antes que terminasse de soltar o ar, ouviu a porta abrir.

— ONDE VOCÊ ESTAVA????? QUER ME MATAR DE PREOCUPAÇÃO??? QUEM VOCÊ PENSA QUE É???

— Mãe por favor, de novo não...

— Não? Como assim de novo não? Você saiu daqui e me deixou falando sozinha. Tem 2 dias que não vem em casa, só sei que está tudo bem, porque liguei pra academia e soube que você foi lá. Onde está seu telefone?

— Desligado, pra evitar problemas.

— Onde você estava, menina? Eu me preocupo com...

— Ahhh se preocupa é??? – Keyla a interrompeu. — Se a senhora se preocupasse comigo realmente me ouviria, tentaria entender o que estou sentindo, tentaria me apoiar. Você se preocupa mesmo comigo??? então porque não impediu que eu fosse humilhada? Por que não ficou do meu lado?

— Como eu vou apoiar uma falta de respeito dessas? Conosco, com nossa família, com nossa vida? Você quer meu apoio? Se respeite!!!

— Você precisa me respeitar! Não é uma opção, mãe! Eu nasci assim! Não acordei e disse “que dia lindo para virar lésbica”!

— Não fale essas palavras!!!! Isso é um absurdo!!!

— É o que eu sou mãe!!! Lésbica, sapatão, caminhoneira, Fancha, essas coisas! Eu nasci assim!

Zélia acertou um tapa na cara da filha, que engoliu calada. Virou as costas e entrou em casa

— Volte aqui! Eu ainda não terminei! Onde você estava???? Estava com alguma vagabunda da sua laia não é? Fala comigo!!!!!

Keyla seguiu andando com ódio no olhar, mas calada, quando pôs a mão na porta, Zélia foi até ela, puxando-a com força.

— Não ouse entrar nessa casa! Fale comigo! – Tocou nos seus ombros para virá-la, quando percebeu marcas nas suas costas.

— O QUE É ISSO??? VOCÊ DORMIU COM UMA VAGABUNDA???

Começou a estapeá-la. Keyla tentava proteger o rosto, e sua mãe enlouquecida arrancou-lhe a blusa do corpo!

— VOCÊ ACHA ISSO BONITO?? DORMIR COM UMA... COM UMA MULHER!!!! QUE NOJO!!! COMO VOCÊ PODE??? E ESSAS MARCAS?

Ela gritava e batia em Keyla que não revidava, aceitava cada tapa, tentando apenas proteger o rosto.

— ABAIXE ESSAS MÃOS. NÃO LEVANTE AS MÃOS PRA MIM!

— Pelo amor de Deus, pare! Não estou levantando as mãos pra você!

— VÁ TOMAR UM BANHO!! TIRE ESSA IMUNDÍCIE DO SEU CORPO!!!!

Entrou em casa correndo, tampando os seios com as mãos, bateu a porta do banheiro, entrando debaixo do chuveiro, ficando ali alguns minutos, sem conseguir chorar e dando socos contra os azulejos do box.

Tentava entender a mãe. Era difícil pra ela. Mas a mãe sempre fora sua amiga, por que não ficou do seu lado?
Aceitou e ainda compactuou com as humilhações que seu avô a fez passar;
Logo ela que foi humilhada quando engravidou adolescente.

A Vergonha foi tanta na gestação, que mudaram de cidade, foram se isolar na região dos Lagos do Rio de Janeiro.

A Família de Keyla vem de uma Etnia cigana, uma grande família que era extremamente tradicional no passado. Sua mãe engravidou de uma pessoa de fora do clã e seu avô extremamente rígido e preconceituoso virou chacota perante aos colegas, até que resolveram se mudar.

Fincaram raízes na Região de praias do Rio de Janeiro, chamada de Região dos Lagos. O Que deixou o velho ainda mais amargo, com uma casa própria,  sem coragem de visitar amigos e parentes. Sim! Nos dias de hoje ainda existe gente assim! Essa era a família de keyla.

Se despediu daquela forma de Amanda porque já imaginava o que aconteceria, saberia que nos próximos dias a mãe pegaria no seu pé. Só que dessa vez a mãe reagiu de forma muito pior. Até então, ela só sabia que Keyla era Homossexual por que mexeu nas coisas da menina e viu conversas dela com amigas.

Hoje não... Hoje ela tinha provas, tinha marcas. Estava há dois dias fora de casa desde a última briga.

— SAIA DAÍ! VOCÊ JÁ ESTÁ AÍ DENTRO MUITO TEMPO! ANDA!!!!

— Mãe, por favor, deixa eu ficar um pouco em paz!

— Saia daí e venha me ajudar agora!

— Mas eu preciso ficar um pouco sozinha! Por favor.

— Estou esperando você na cozinha em quinze minutos!

Keyla fechou os olhos, queria chorar mas não tinha lágrimas. Se enrolou na toalha pra trocar de roupa e enfrentar mais uma vez a mãe.