Capítulo quatro

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        Eu estava confusa. De repente nada parecia mais fazer sentido. O que é que ele estava dizendo? As informações eram muitas, eu tentava assimilar tudo, mas confesso que boa parte me escapava. Enquanto meu cérebro travava uma luta interna decidindo se acreditava nele ou não, eu senti minha cabeça girar.

− Coma umas torradas − ele disse naturalmente, interrompendo de maneira tranquila aquele turbilhão de notícias bombásticas. – Você é bem chegada a desmaios...

− Théo, eu... − Ele me olhou de cara feia e eu me senti constrangida, o que era patético – Gael, ou... Tanto faz. O fato é que eu não consigo acreditar no que você está me dizendo.

− Eu estou te dizendo a verdade, Mia. O seu detetive deveria ter lhe informado sobre isso. Tem certeza que ele não te avisou? Talvez você não se lembre...

          Eu mordisquei uma torrada, pois no fim das contas sabia que o desgraçado estava certo. Enquanto mexia no meu cabelo, um sinal claro de que eu estava nervosa, tentava me lembrar de algo, alguma lacuna por preencher. Foi então que uma lembrança recente invadiu a minha mente...

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“Quando voltava da cozinha com o meu chocolate quente em mãos, percebi que no chão, perto da porta, havia novas correspondências. Imaginando que precisaria reservar algumas horas do meu dia para responder os meus fãs, passei o olho rapidamente por elas. A penúltima me fez parar. Um novo envelope pardo que dizia: “Informações confidenciais para Mia Prescott – URGENTE!”. Respirei fundo e quando estava prestes a abrir o envelope, a campainha tocou. Um grito sufocado de susto escapou da minha garganta. Respirei aliviada ao enxergar pelo olho mágico apenas a pequena e sagaz Rose.”

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          Eu havia saído para almoçar com Rose e me esquecido completamente daquele maldito envelope. Se Gael, ou Théo, enfim, estivesse falando a verdade, então essas informações deveriam estar nesse envelope.

− Eu preciso voltar para a Capital − anunciei de pronto, querendo esclarecer essa história de uma vez por todas.

− O próximo trem só sai amanhã de manhã − ele disse tranquilamente, como se a minha vida não dependesse disso.

− Eu não estou aqui a passeio – informei. – Estou no meio do processo criativo do meu novo livro, tenho milhões de coisas para fazer e preciso saber se você está falando a verdade ou não − terminei, trincando os dentes.

− Eu estou falando a verdade, já te disse. E se a prova da qual você precisa está na Capital, iremos até lá amanhã mesmo − ele sorriu e eu quase voei em cima dele. Apenas aquela mesa nos separava.

− Nada disso, nós não iremos a lugar nenhum. Eu irei a Capital sozinha − informei, dando o assunto por encerrado.

− Mia... - Ele disse meu nome com uma espécie de adoração. Meus pelos se eriçaram e eu tentei ignorar isso. – Eu só te contei uma parte da história. Théo e eu somos irmãos gêmeos. Foi ele quem destruiu a sua vida, e não eu. Mas você ainda precisa entender as motivações dele, entender como a cabeça dele funciona. Eu sou o único que pode te ajudar nisso.

− Eu não confio em você − disse sem rodeios, encarando-o nos olhos com certo esforço.

− Não precisa. Aos poucos você vai saber como tudo aconteceu, nos mínimos detalhes... As peças começarão a se encaixar e você perceberá que eu estou do seu lado.

          Quando voltamos para a casa da Dona Adelaída, ela e Mathias nos esperavam com perguntas. Inventamos uma mentira absurda sobre eu ter nome composto e Théo/Gael lhes contou uma história bastante convincente sobre o nosso passado. Eu quase acreditei em suas palavras. Tendo esclarecido o pequeno inconveniente, Dona Adelaída – a imagem perfeita do que esperamos de uma avó – nos ofereceu uma noite em sua humilde casa e ainda foi para a cozinha nos preparar um jantar delicioso, com direito a um bolo quentinho de cenoura como sobremesa.

Ponte de cristal (degustação)Where stories live. Discover now