Capítulo 3: Michel

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Enquanto varria a casa, Michel ponderava se estava fazendo o certo em participar dos esquemas do irmão. Era tudo o que jurara a si mesmo nunca fazer: entrar para a vida de crimes que Daniel fazia parte. Estava em dúvida se entrou nessa porque viu uma oportunidade de ganhar dinheiro e sumir da vida do irmão de uma vez por todas, ou se era a necessidade de entrar em contato com alguém que fosse gay e levava uma vida normal.

Esconder para o mundo que sente desejo por homens nunca foi motivo de vergonha para Michel, o que ele tinha era medo pelo ambiente inóspito em que vivia, se seu irmão soubesse que ele era gay, ele tava ferrado. O relacionamento com Daniel era algo complicado e que Michel sempre quis se ver livre. Agora que era maior de idade, talvez, seria mais fácil finalmente não ter o encosto do irmão no mesmo quarto.

Os irmãos viviam em uma pequena casa, com uma sala, uma cozinha, um banheiro e um quarto. Michel dividia o quarto com o irmão nas noites em que Daniel não estava com uma mulher. Quando o irmão tinha companhia, Michel era obrigado a dormir na sala tentando não ouvir os sons altos vindos do quarto. Enquanto os pais dos irmãos eram vivos, Michel dividia o quarto com eles e Daniel dormia sozinho na sala.

Com exceção de Wesley, as duas únicas pessoas que Michel já amou na vida foram seus pais: Sebastião e Joana. Era tão bom dormir em uma cama de solteiro com pouco espaço no quarto, mas sabendo que seus pais dormiam ali, a poucos metros e distância. O garoto se sentia muito seguro, porém, infelizmente, duas tragédias arrancaram seus pais de sua vida.

Quando Michel tinha 13 anos e Daniel 20, Sebastião saiu para trabalhar como todos as noites, ele era porteiro em um prédio no centro da cidade. O turno dele era das vinte duas horas horas até as seis da manhã. Em um determinado dia de feriado, Sebastião finalizou seu turno e seguiu para o ponto de ônibus, como sempre fazia. Naquela manhã, as ruas estavam movimentadas, os jovens tinham aproveitado a noite de véspera de feriado e ido à baladas, bares e festinhas particulares. Muitas dessas pessoas saíam desses lugares bêbadas, dirigindo imprudentemente pelas ruas. Um desses jovens imprudentes estava muito acima da velocidade permitida com muito álcool no sangue, perdeu o controle do veículo e entrou com tudo no ponto de ônibus de Sebastião. Ele e mais duas pessoas morreram na hora. Michel, Daniel e Joana foram destroçados permanentemente após o acidente. Michel nunca colocou uma gota de álcool na boca por isso.

A família ficou de luto por muito tempo. Daniel mudou muito após a morte do pai. Sem Sebastião para colocar medo no filho, ele passou a revender carga roubada, juntamente com alguns “amigos” feitos na rua. Ele se tornou um jovem extremamente violento, passou a usar drogas e tomou um rumo sem volta na vida.

A felicidade da vida de Joana restou no filho mais novo e ajuizado. Sem o marido e com um filho mais velho indo pelo caminho que ele sempre temera. Joana entrou em um período de depressão forte. Porém ela nunca soube que teve depressão, para ela, era apenas tristeza e saudade do marido. O conforto de Joana era ver o filho mais novo estudar de manhã e ter um emprego digno em um restaurante no shopping, no qual ela sempre sonhou em ir um dia e comer da comida feita por ele, porém nunca teve coragem de entrar naquele shopping por não ter o que vestir. Michel tinha 16 anos recém completos, saía de casa para a escola às seis da manhã e voltava quase à meia noite. Mas o coração dessa senhora se enchia de alegria quando ele chegava, assaltava a geladeira faminto e comia a comida que ela deixara para ele, tomava um banho, dava um beijo no rosto dela e começava a roncar em menos de cinco minutos deitado na cama ao lado. Michel também sentia a mesma segurança que a mãe sentia, quando eles dividiam o quarto. A mãe era a única coisa boa na vida do garoto e vice e versa.

Enquanto isso, Daniel ganhava dinheiro com o que fazia, porém Joana foi firme em jamais aceitar um centavo do dinheiro sujo que ele trazia para casa. O rapaz comprou geladeira nova, TV, sofá, mas Joana não deixava nada disso entrar na casa dela. Por isso, Michel precisou ralar muito para ajudar nas contas, no supermercado, nos remédios. O emprego dele era uma merda, pagava um pouco mais de um salário mínimo e tinha um vale alimentação que acabava antes da metade do mês. Mas foi a única coisa que ele tinha achado para fazer. Michel se sentia roubado, sentia que não podia viver como os outros jovens da sua idade, porque ele trabalhava todos os finais de semana, grande parte do dinheiro ia para ajudar a mãe em casa e, também, por gostar de homens e não encontrar caras iguais a ele em seu dia a dia.

'Os Provocadores' (Thriller Gay)Where stories live. Discover now