Capítulo 17 - O Largo Grinmauld, 12.

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O mês de julho se passou como o de junho, lento, abafado e entediante. Não imaginava a um tempo atrás, mas Demétrio fazia falta. Sem ele em casa, Hilde tratava Agnes com agressividade e não com falta de interesse ( que era ruim, mas não tão ruim quanto ter a atenção da mulher.) mesmo que a idéia fosse ridícula, Agnes pensou que talvez Demétrio a impedisse de tratá-la tão mal. A verdade é que Agnes queria acreditar nisso, mas não haviam fatos o suficiente que sustentassem essa idéia boba. Hora ou outra a menina teria que aceitar que não possuía família alguma com quem contar e que só poderia ter ela mesma como suporte. Mas mesmo que não achasse Demétrio um bom irmão, ficara horas se perguntando se ele sabia sobre a internação da vovó Agnes, ou se essa era mais uma mentira que os dois compartilhavam da mãe. Também se perguntava onde o garoto estaria agora e com isso, acabou sonhando novamente em estar fora dali. Imaginou se algum dia poderia sair de casa e morar na mansão Birdwhistle, onde a vó costumava morar. Ficara se imaginando passeando pelo jardim, enquanto o sol batia no seu rosto.

Dali a uma semana, poderia sair de casa para a mansão Black. E nada naquele momento era mais animador que isso, - por mais que estivesse nervosa com o lugar e com a família - mas não havia contado nada a Hilde, pois sabia que ela se intrometeria nisso com o pretexto asqueroso de interesse, mas ainda sim teria de inventar um lugar. Não podia somente fugir de casa e não dizer nada. Então decidiu despender tempo para pensar no assunto. Nem mesmo precisava se preocupar com uma desculpa elaborada, Hilde não se importava o suficiente para contestar, então decidiu que diria a mulher que estava passando as férias na casa de Pandora, sua amiga da escola. Só esperava que a mãe não decidisse se importar dessa vez e mandar uma carta para os Lovegood, isso estragaria o plano todo. Por isso, Agnes decidiu escrever uma carta para a amiga ela mesma, explicara toda a situação para a amiga, dera a coruja da família o pequeno envelope, que possuía alguns rabiscos ( já era um envelope usado). Feito isso, organizou todas as suas coisas com zelo, para que não se esquecesse uma peça sequer, desceu ao porão - lugar esse que a lembrava sobre os segredos de Hilde - recolheu seus ingredientes e seu caldeirão e guardara tudo.
Depois de toda a organização, nada mais tinha a ser feito a não ser esperar os longos dias passarem até finalmente sair da casa Birdwhistle. Durante esses dias, recebeu uma resposta de Pandora, que decidira apoia-la em sua pequena mentirinha. Além disso, fizera o possível para ficar completamente invisível ao olhar-de-àguia de Hilde pelo resto da semana, o que teria funcionado melhor caso a menina não fosse responsável pela arrumação da casa inteira, a qual Hilde sempre tinha do que reclamar. A verdade é que Agnes sempre teorizava que Hilde odiava aquela residência tanto quanto Osprey, mas que tinha um fundo de razão para ter ido para um lugar tão afastado da civilização bruxa. E agora, depois do que Agnes sabia, estava certa de que a madame Birdwhistle queria afastar a família de alguma coisa ou de alguém. Achou melhor escrever em um bloquinho algumas de suas mirabolantes idéias para apresentar a Régulo no fim de semana, ele possuía o dom de enxergar realidade, mesmo diante das maiores maluquices, apreciava isso no garoto. Seu pé firme no solo.
Naquela noite de quinta, Agnes estava jantando uma fatia de torta de carne amanhecida. Não estava muito saborosa, mas fora o que sobrara do jantar da quarta. Hilde estava no sofá azul marinho, que tinha as pernas de maneira bastante descascadas. Aquele sofá horrendo viera da antiga casa de Hilde, onde morava com sua mãe e suas irmãs - A já falecida tia Lorelay. Da qual Agnes tinha poucas lembranças, mas sabia que se mudara para os Estados Unidos muito jovem, e Louise que morava na Sibéria. - A vó de Agnes estava morta a alguns bons anos também, Ária Silverstep. Ainda tinham um enorme quadro horripilante da velha no corredor da escada. Ao contrário do que lembrava de Agnes Daisy, a vó paterna, Ária era uma mulher assustadora. Possuía o mesmo olhar soberbo de Hilde com uma pitada de crueldade da qual Agnes não gostava nada. Ária morrera muito tempo antes de Agnes a conhecer, mas sua foto já trazia com maestria o que poderia ser a personalidade da bruxa.
- Eu não sei porque tanto alvoroço por simples sangues sujos - Hilde folheava o profeta diário com um olhar afiado. Agnes engoliu em seco, só esperava que a mãe não percebesse sua presença ali. - Agnes, já é o segundo pedaço de torta, eu achei que tínhamos conversado sobre o seu peso hoje mais cedo.
A mulher mantinha seus olhos longe de Agnes, mas ainda parecia saber de tudo. A menina sentiu o bolo de carne voltar a garganta com aquela afirmação. Ela não achava que seu corpo era nada mal, mas agora que Hilde tocara no assunto, talvez devesse emagrecer um pouquinho. Estava notando um certo volume no abdômen, ou será que era impressão? Deixara a metade da torta no prato, largando os talheres em um estalo. Se preparou para subir, mas antes:
- Mãe? Eu não avisei antes mas...Vou passar o resto das férias na casa dos Lovegood. Tudo bem? - Engoliu em seco, mexendo em seus próprios dedos. A mulher lhe lançou um olhar de desprezo, dessa vez não era para Agnes, mas para o sobrenome.
- Aqueles esquisitos? - Franziu a testa. - Que seja. Desde que ninguém saiba que você está lá. Não sei o que seria da reputação dessa família se soubessem que estamos andando com aquele tipo de gente.
Agnes reprimiu a vontade de perguntar de que reputação ela se tratava, já que a reputação da família estava na sarjeta. Sentiu uma certa revirada no estômago ao pensar na mãe falando daquela maneira daquelas pessoas tão pacíficas que viu na plataforma, no ano passado. Mas não replicou, apenas balançou a cabeça positivamente. A mulher não quis saber mais nada, a que horas sairia, qual dia, ou até mesmo quando voltaria, o que já era comum. Sendo assim, Agnes subiu as escadas voltando para seu quarto seguro. Naquela noite, não se sentia muito disposta para estudar, apenas se debruçou na janela que dava vista para a ruazinha sem graça. Lembrou-se de um bom feitiço que sempre usava quando estava com tédio, um que podia sintonizar sua cabeça as rádios trouxas, com isso podia escutar música dentro da própria cabeça. As rádios trouxas eram bem melhores que as rádios bruxas, trouxas sabiam como fazer música. E tinha esse cara britânico que se chamava David Bowie, ele nascera em Londres como Agnes. E sabia como representar uma pessoa meio maluca e um pouco desajustada vindo de outro planeta, igual Agnes. Bowie era um cara e tanto. E naquela noite abafada, seguiu ouvindo "Life on Mars" encarando a janela em busca de alguma clareza.

Killer QueenWhere stories live. Discover now