Capítulo 7

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Esperei que Mikasa viesse buscar o livro da semana, mas sempre que conversámos dizia estar ocupada demais e evitava qualquer conversa íntima. Na terceira semana simplesmente aceitei que tinha desencanado da nossa história, se é que poderia chamar assim, ou podia ter conhecido alguém.

Claro que tentei entrar no assunto.

De forma contrariada, admiti que ela foi a melhor coisa que me aconteceu e corri atrás, recebendo como resposta apenas o risquinho azul indicando a leitura da mensagem e decidi deixar a garota em paz, temendo virar o cara chato e pegajoso que não tolera um pé na bunda.

Talvez fosse o melhor desfecho: sabia que nossas expectativas desalinhadas causariam sofrimento e se fosse mesmo esperto, aproveitaria a oportunidade de dar o fora.

O fato de ser sensato e razoável não melhorou meu humor e fiquei insuportável por dias, a ponto de agradecer por morar sozinho, caso contrário já teria sido assassinado em um crime passional.

Pensei até mesmo em tentar puxar assunto com alguém, talvez chamar para sair num bom e velho encontro tradicional. Só que esse plano tinha um entrave gravíssimo: ninguém me interessa, principalmente quando lembro de Mikasa e suas respostas intrigantes, seu mistério, seu beijo.

Achei que o tempo forçaria uma desintoxicação, só que as lembranças constantes jogaram na cara que estava longe de esquecer. Comecei a rabiscar em uma folha algumas palavras soltas, canalizando na tinta toda a frustração com a situação.

Desenhei displicente o colar que tinha comprado especialmente para a cena que imaginei: uma peça fina de fios de prata trançados, de onde pendia um pingente com a simples letra "M", e me senti um completo idiota ao despender tanto tempo, dinheiro e atenção com o símbolo de que ela seria minha, pelo menos enquanto durasse nossa encenação.

Dobrei a folha frustrado quando ouvi a aproximação de um cliente.

— Andei ocupada nos últimos dias, não pude vir antes.

Gelei ao ouvir a voz e prestei atenção na capa do livro que depositou sobre o balcão, disfarçando a ansiedade. Engoli seco antes de arrumar coragem para erguer a cabeça e encontrá-la, preparado para manter a expressão neutra.

E então, toda minha pretensão de resistir foi abaixo quando vi o que trajava: um corpete que destacava os seios, cobertos por uma fina renda; a saia leve e fluída me obrigava a questionar o quanto foi fiel ao figurino: estaria nua embaixo da roupa?

No pescoço, uma gargantilha descia e terminava oculto pela renda que cobria os ombros e parte do colo, e se minha memória estivesse correta, possuía um aro onde poderiam ser prendidas correntes que a deixariam presa e indefesa a qualquer que fosse a vontade de seu amante.

Mikasa interpretava, sem prévio aviso, a personagem O., e apenas a ideia de que poderia se entregar para mim tão sem reservas destruiu qualquer possiblidade de resistência: já a encarava envolvido, cativo.

Controlei minha respiração e assumi a postura serena costumeira, raciocinando tão rápido quanto podia acerca da situação apresentada.

— Vejo que já leu minha indicação.

— Na semana passada.

— E o que achou?

— Um material farto para um terapeuta.

A alfinetada me arrancou um sorriso, algo difícil e que ela conseguia sem esforço.

De fato, a história da moça que se converte em escrava sexual de seu amante a ponto de permitir que ele a entregasse a outro, tinha tantos poréns que nem sabia por onde começar; contudo, julguei óbvio que jamais cobraria qualquer literalidade dessa fantasia, ou de qualquer outra.

O livreiroWhere stories live. Discover now