Capítulo 9

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É provável que eu acordasse sozinho na cama, não fosse um pequeno detalhe: a insônia.

A maldita desta vez se provou uma aliada ao permitir que eu assistisse o lento e confuso despertar de Mikasa assim como a expressão de arrependimento por ter acordado ao meu lado, o que só fortaleceu a resolução de terminar o insólito caso.

Quase ri de sua timidez quando percebeu estar nua e descoberta; voltei minha atenção para o livro que lia desde a madrugada, a fim de evitar o desconforto descabido.

Começou a recolher as roupas com pressa, um contraste irritante com a vagarosidade e minúcia com a qual permitiu que eu a despisse no dia anterior.

— Você não precisa correr.

Me fitou assustada, aos poucos deixando a lascívia assumir, talvez uma postura defensiva a fim de evitar qualquer conversa realmente íntima.

— Não teve o suficiente ontem?

Talvez nunca fosse o suficiente, e o problema era justamente esse: Mikasa já tinha me dado tudo que poderia e eu ainda precisava de mais, muito mais. Queria que permanecesse em meus braços quando acordasse.

— Toma um banho antes, um café se quiser.

— Sabe que nosso acordo é só sexo...

— Acordo? Nunca fizemos um acordo. Você vem quando está com vontade e eu recebo porque quero você. Não significa que precise fugir como se fosse algo errado.

Seu alívio foi óbvio quando defini a situação de forma racional.

— Vou tomar banho então.

— Ok.

A água caindo estabeleceu um ritmo constante, uma distração em meio aos pensamentos melancólicos.

Decidi que seria mais fácil romper se eliminasse qualquer lembrança do que aconteceu entre nós; arrumei a cama, joguei fora os lenços de seda e todo objeto que remetesse à noite anterior. Ela tinha levado as roupas para o banheiro, deixando claro que desejava ocultar qualquer nudez de mim fora das nossas cenas.

Quando saiu vestida e arrumada me encontrou na poltrona, ainda oculto pela leitura – esse vinha sendo meu disfarce por quase toda a vida adulta, afinal. Trajava outras roupas, já não era a personagem, a única faceta de Mikasa que me permitia conhecer. Quando a fitei vi uma completa estranha por mais que tivéssemos conversado sobre tantas coisas íntimas nas últimas semanas.

Abreviei o momento embaraçoso para ambos levantando e ela me seguiu até a porta sem questionar, parando na soleira e então, finalmente relaxando um pouco para fazer a pergunta que eu já esperava.

— Qual o livro da próxima semana?

Então, fiz uma das coisas mais difíceis das quais me lembro.

— Não tenho indicação, Mikasa.

Os bonitos orbes negros vacilaram um segundo antes de recuperarem o foco.

— Impossível que não conheça mais.

— Não foi o que eu disse.

Pela tez lívida percebi que a compreensão bateu.

— Quer parar com o que temos?

— Temos algo?

— Levi...

Interrompi qualquer que fosse a justificativa dela.

— Pra mim isso é pouco.

Seu semblante passou da incredulidade para a aceitação.

— Entendo.

O livreiroWhere stories live. Discover now