Capítulo 28 - Lágrimas dos deuses

457 57 10
                                    


Olimpo

Assim que deixou a sala de reuniões já ciente da atitude necessária a ser tomada, Zeus ganhou os corredores do Olimpo caminhando sem pressa. Afinal, quanto mais rápido andasse, mais próximo estaria de levá-la embora.

Ele a afastaria dos perigos e com isso a afastaria de si. Não pensou que se sentiria tão sufocado quando a hora chegasse, e mesmo quando pôs um fim ao seu casamento de incontáveis séculos não se sentira assim. Realmente, sufocado descrevia bem a sensação. E conforme pensava em deixar Iryna e voltar sozinho para o grandioso Olimpo, maior e mais vazio o lugar parecia.

O deus dos deuses olhou as paredes brancas, o conhecido chão de mármore impecável e sem arranhões. Ele amava o luxo, seu gosto era refinado, suas bebidas e roupas caras refletiam isso. Apropriado para um deus. Alguém acima de reis, e ele mesmo um deus acima dos deuses. Mas, de repente, pegando-se ali a pensar na falta que uma simples humana faria, sentiu-se pobre em meio a tanta riqueza. Talvez velho como o próprio tempo, obsoleto como um relógio de sol num mundo de celulares e computadores. Zeus riu de si mesmo a realidade lhe dando as boas vindas. Talvez Chronos também estivesse sentado rindo da imbecilidade de seu filho mais velho. Ele se importava com a humana de uma forma que jamais se importara com qualquer mulher antes.

Não era novidade que teve um sem fim de mulheres, humanas e não humanas ao longo de sua existência. Hera jamais se importou com aquilo que ameaçava seu trono. Mas, com Iryna o sentimento era precioso a ponto dele se abster de tocá-la, por não querer causar danos seu frágil coração humano.

Mais cedo ou mais tarde ele sabia que teria que devolvê-la ao mundo humano e que fazer amor com ela condenaria a ambos a uma falta torturante. E se ele não pudesse voltar? E se ela morresse esperando por ele? Sua cabeça se inundava de perguntas e incertezas tão humanas que sentia-se ridículo. Talvez, era aquilo que chamavam de amor. Aquele sentimento que seus irmão mais novos experimentaram com tamanha intensidade, mas que ele nunca fora capaz de compreender verdadeiramente. "Péssima hora para começar", condenou-se.

Por mais volteios e caminhos longos que tomasse inevitavelmente seus pés - metidos em lustrosos sapatos brancos - o levaram de volta a sua biblioteca pessoal. Lugar preferido de ambos. A mulher de porte frágil, porém elegante, estava de costas analisando uma das prateleiras e distraída cantarolava baixo enquanto procurava algo para ler.

Zeus apenas se demorou ali, recostado no batente das enormes portas de madeira maciça. Observando-a. Admirando-a. Ouvindo-a. Desejando-a para sua Rainha, para sua deusa. Mas ao mesmo tempo temendo condená-la às responsabilidades e dores que vinham com o título de esposa de deus dos deuses.

Não demorou para que ela se virasse seus instintos a alertaram de que estava sendo observada. Então, os olhos avelãs se cravaram nele. Ela sorriu mas ele não foi capaz de corresponder-lhe o sorriso, porque seu coração doía. O sorriso de Iryna se desfez. Ela caminhou até ele e o envolveu pela cintura, e sem dizer nada recostou-se em seu peito largo. Ambos sabiam que sua hora havia chegado e bem mais rápido do que previram. Os longos braços de Zeus a acolheram, puxaram o corpo feminino trêmulo e ele apertou contra si.

-Iryna, eu... - Zeus ensaiou uma desculpa, um porquê, ou um acalento. Nem mesmo ele sabia o que estava tentando dizer.

- Não. - ela o silenciou. - Não fale, não me acorde. Você é meu melhor sonho.

Os céus começaram a despejar as lágrimas dos deuses. O aguaceiro lá fora deixavam as plantas mais verdes, os pastos fartos para o gado; trazia mais vida e cor as flores e frutas de Démeter. Mas aquela chuva era dor disfarçada de benção. A dor de dois corações que não queriam se deixar. A dor de um deus que descobrira como era amar de verdade.

Poseidon (Autora: Sra.Jeon)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora