3 semanas depois
Observo o meu reflexo diante do espelho enquanto término de organizar os últimos retoques do meu cabelo para mais um dia de trabalho, mordo o lábio inferior me permitindo sentir um sabor metálico em meu paladar e minha boca ser preenchida por uma quantidade exagerada de saliva. Pego num guardanapo e cuspo, já tem uma semana que estou desse jeito e sinceramente é bastante perturbador
Depois que termino seguro na minha bolsa e vou directo a cozinha comer alguma coisa. Elisa está ao pé do fogão ainda de pijama terminando de fritar o bacon com ovos mexidos. Ao sentir o cheiro do óleo misturado com os ovos sinto um certo desconforto na minha garganta, não sei porquê mas ultimamente o meu sentido olfactivo está mais apurado
– não vai trabalhar? — pergunto puxando uma cadeira e me sentando. Ela retira os fones de ouvido e me observa
– eu me demiti
– você o quê?
– ah o meu trabalho é um saco, o meu chefe não parava de puxar o meu pé — ela serve as suas frituras no prato e coloca na mina frente. Quanto mais próxima da comida mais desconforto sinto
– e como pensa em pagar as contas? — pego num pouco de limonada e tomo sentindo um pouco de alívio
– eu vou me virar — Elisa da de ombros e mexe no seu celular sentada na minha frente. Abano a cabeça positivamente e pego no garfo e assim que coloco um pouco de ovo mexido na boca, sinto meu estômago reagir e uma vontade súbita de vomitar que imediatamente é interrompido e eu me alívio
– o que foi isso? — Me pergunta olhando pra mim confusa
– eu acho que vou comer no trabalho
– você não pode sair assim, você sequer jantou ontem
– eu não tenho muita vontade de comer
– Ju o que tá acontecendo? — cruza os braços aparentemente preocupada. Faço que não sei com os ombros e me levanto da cadeira — você tá grávida? — ao me perguntar aquilo eu simplesmente paro o meu movimento e a encaro assustada
– não — é a única coisa que aparece na minha cabeça pra dizer mesmo não tendo certeza de nada. Quer dizer, eu tive sim um caso por acidente mas Malcom é tão cuidadoso com ele mesmo que tenho certeza que ele usou proteção
– você tem certeza? Eu olhei para o seu calendário menstrual, era pra você ter descido a 7 dias
– atrasos acontecem — dou de ombros caminhando até a sala e Elisa me segue
– não com você, você é a pessoa mais regular que conheço Julie. Você precisa fazer o teste
– dá pra você parar de falar? Eu não tô grávida okei? Deve ser alguma virose ou sei lá. Agora preciso ir — pego nas chaves do apartamento e saiu a deixando. No tráfego todo direção a empresa eu não conseguia parar de pensar nas palavras da Elisa, dizer que eu não cheguei a pensar sobre isso estaria mentindo mas...não existe nenhuma possibilidade de estar grávida, absolutamente nenhuma
Assim que chego no trabalho tento dar o meu máximo para me focar. Assim que tive alguns minutos de intervalo, vou directo para o gabinete da Yuna com o meu chocolate quente nas mãos, neste momento vejo o Malcom passar por nós como o de costume. Mas desta vez é diferente, porque assim que olho para ele, as palavras da Elisa me vem a mente de forma súbita e incontrolável. Pensar na existência de um mini Malcom dentro de mim é tão assustador tanto quanto um filme de terror da sexta feira treze
– está tudo bem? — Yuna me pergunta e eu pisco os olhos. De forma involuntária minha mão esquerda vai de encontro com a minha barriga como se eu quisesse confirmar alguma coisa
– tá, tá sim — respondo ainda aérea. No fim decido colocar a culpa de toda essa situação por cima da Elisa, tenho certeza que se ela não tivesse falado sobre isso eu não estaria desse jeito, tenho uma mania de escutar o que as pessoas dizem ao meu respeito muitas das vezes colocando as minhas opiniões de lado
– aí meu Deus, é o acionista maioritário — Yuna diz olhando por cima do meu ombro. Ao me virar vejo aquele homem que esbanja poder passar por nós e pegar o elevador provavelmente indo directo até a sala de reuniões
– eu acho que preciso voltar ao trabalho — pego no meu café e vou correndo até minha sala. Volto a me focar no meu trabalho e não demora muito até o celular tocar e a voz do meu chefe ecoar do outro lado da linha, ele fala para eu o encontrar na sala de reuniões para debater sobre um determinado assunto. Respiro fundo tentando me recompor, pego nos meus papéis e me dirijo até lá, onde observo somente os funcionários de maior cargo na sala, fazendo parte deles o Maloy, a Yuna e o Peter
Todos estão de pé enquanto o acionista fala. Logo que ele termina dá espaço para o Malcom falar, ele então toma o seu lugar ficando na frente de todos para que possamos o observar melhor
– Estamos prestes a vivenciar uma revolução tecnológica que transformará fundamentalmente o jeito que vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Em termos de escala, alcance e complexidade, essa transformação será diferente de tudo que presenciamos antes — mesmo de longe consigo sentir o aroma forte de seu perfume que se destaca no meio a todos outros, mas desta vez não é um cheiro que eu gostaria de sentir neste momento, porque volto a sentir o desconforto dentro de mim — Nas últimas duas décadas, o setor teve uma melhora de apenas 20% no índice de produtividade. Nós precisamos de mais
O resto da sala concorda com opiniões diferentes sobre uma certa melhoria. Porém eu me mantenho calada tentando me controlar
– Julie — ao pronunciar o meu nome eu quase me assusto — você não acha que a ineficiência na construção civil é um problema que traz inúmeras consequências? — Malcom me pergunta se aproximando cada vez mais de mim. Mordo o lábio inferior com o olhar desesperador
– uhmm — abano a cabeça em positividade
– que tipo de consequências seriam? — ao me fazer essa questão a sala fica em um total silêncio como se todos estivessem a espera de uma resposta minha — Julie? — ele insiste se aproximando cada vez mais. Por favor Malcom não se aproxima mais
– ba...baixa pro...— não consigo terminar, simplesmente escuto meu estômago fazer um barulho estranho e fico em silêncio tentando controlar. Malcom que agora está na minha frente estreita os olhos confuso, e no momento em que ele pousa sua mão no meu ombro eu vómito por cima dos seus sapatos. Todo mundo fica assustado e o olhar dele é indecifrável, ele está imóvel olhando para seus pés enquanto suas mãos estão no alto
Okei que eu odeio esse indivíduo, mas acho que dessa vez fui longe demais
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Consequência Do Nosso Ódio
HumorUma Noite Uma noite é suficiente pra mudar uma vida. Julie é uma mulher de seus 25 anos em busca de uma oportunidade de reconhecimento no seu trabalho, uma mulher que apesar de ser completamente desastrada, é focada nos seus princípios. Porém ela v...