Capítulo 3

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— Você teve um pesadelo de novo, não é? — Tobirama perguntou, mantendo-se de costas para a sua visita. As mãos se moviam com destreza no preparo do jantar, e mesmo concentrado no que fazia, o assunto sobre a noite passada o fez dar atenção para a própria questão.

Aproveitando que não era visto, Izuna se permitiu encolher os ombros. Os olhos negros desviaram das costas do Senju para a pequena mesa onde apoiava os braços, e um fraco suspiro foi dado.

— Desculpe. Eu não dormirei aqui outra vez — disse o Uchiha em tom baixo. — Às vezes sou barulhento demais.

Aquela havia sido uma das noites intensas nos sonhos de Izuna. Os pesadelos eram seus companheiros todos os dias, porém, havia alguns que o agitavam mais do que outros, fazendo-o trazer seu desespero para fora em forma de gritos e movimentos bruscos. Não era a primeira vez que Tobirama o ouvia e via daquela forma, contudo, foi inédito o Senju tocar no assunto. A ideia de incomodá-lo também não era nova, e com a pergunta, se provou certa para Izuna, mas ela foi enfraquecida rapidamente quando o Senju se virou para olhá-lo e balançou a cabeça.

— Eu não me importo. — Ele se aproximou, mas os pés pararam no meio do caminho. Tobirama coçou a bochecha com o indicador e desviou o olhar por um breve momento. — É só que... não sei direito, mas parece que isso te abala. — Rapidamente se ocupou com algumas verduras que estavam ao seu alcance. — Se não quiser falar sobre isso, tudo bem.

Tobirama manteve o olhar na comida, disfarçando seu interesse no assunto. Desde a primeira noite estando sóbrio ao lado de Izuna, ele havia notado algo de errado. Com o tempo, a maneira com que o Uchiha acordava no meio da noite foi explicada sem precisar de palavras, e decidiu se manter quieto sobre o assunto. É problema dele, Tobirama sempre pensava exatamente como naquele momento, porém, não conseguiu se convencer totalmente quando a curiosidade passou a vir com uma certa preocupação, que o incomodava de uma forma estranha sempre que o via desesperado no meio da noite.

Houve um longo silêncio, e o Senju achou que o assunto havia sido encerrado, mas para Izuna, o comentário ainda estava bastante vivo. Ele hesitou, tentou abrir a boca para trazer outro assunto enquanto o observava terminar o arroz, porém, sua voz só saiu quando aceitou que precisava daquilo. Nem mesmo Madara sabia de seus pesadelos, e era estranho como se sentia naquele instante, mas em seu peito havia certeza de que Tobirama era a pessoa certa para ouvi-lo. Ele não vai ter pena de mim.

— Eu não consigo dormir direito. — Izuna enfim confessou, chamando a atenção dos olhos do Senju. As mãos tocaram sobre a mesa baixa e os dedos se massagearam com nervosismo. — Eu fecho os meus olhos, e estou lá novamente, no passado, coberto de sangue que não é meu. — Levantou o olhar para o Senju, que dessa vez deixou a refeição de lado para dar total atenção para o que ouvia. Havia uma fraca surpresa no rosto um pouco distante, e por isso o Uchiha se agitou com nervosismo. — Eu sei, é estúpido. Já faz mais de 9 anos que não temos mais batalhas como aquelas, mas... as lembranças ainda são fortes demais.

A comida foi completamente esquecida por Tobirama, que aumentou um pouco mais o estranho sentimento que balançava Izuna com seu súbito silêncio. Ele limpou as mãos devagar, e no mesmo ritmo, se aproximou da mesa e se sentou no lado oposto. Os braços tocaram os de Izuna quando também os apoiou sobre a madeira, e por um momento, o hesitou, mas não conseguiu controlar a vontade de ser sincero com o Uchiha.

— Você já visitou o meu jardim? — Ele perguntou. O olhar se prendeu nos dedos inquietos de Izuna, e internamente sentiu uma agitação nova.

— Só olhei daqui de dentro. — A resposta foi dada de forma confusa, e o mesmo pôde ser visto nos olhos escuros quando Tobirama enfim levantou a cabeça.

Jardim Sem FloresOnde histórias criam vida. Descubra agora