27. BecBec

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Era sábado de manhã e eu esperava Freen me buscar em casa para passar o dia com ela e Li no tal clube. Eu me sentia ansiosa, porém animada. Eu ainda sentia medo de me reaproximar tanto assim dela, sabendo das suas intenções. Não me sentia pronta para reembarcar em uma relação tão intensa. Ainda tinha o fato de que eu ainda não havia conseguido terminar com Aran.

No dia que havíamos marcado, ele teve que remarcar, e no nosso outro encontro, no dia anterior mesmo, eu achei que sairíamos sozinhos, mas acabei em um encontro duplo com um casal de amigos dele, o que levou todo meu plano água a baixo. Eu não queria prolongar aquilo, mas ele merecia mais que uma ligação ou palavras rápidas na frente da minha casa.

Suspirei, sentindo o peso disso pesar um pouco sobre meus ombros. Antes que eu pudesse me afundar nesses sentimentos, no entanto, ouvi a batida leve na porta da minha casa. Um sorriso espontâneo abriu em meu rosto quando encontrei Freen, com Li no colo, enquanto a menina tinha sua mão direita em punhos, claramente sendo a que bateu na minha porta.

"Oh, olá!" falei me sentindo animada como há muito tempo eu não me sentia. "Muito bom revê-la, Li. Como você está?"

A menina parececendo tímida, levou suas mãos para agarrar a blusa de Freen em nervosismo, mas sorriu um pouco, mesmo com sua cabeça levemente abaixada.

"Bom revê-la também," ela respondeu em sua voz pequena que me fez sorrir grande. Ela era uma pequena cópia de Freen e ela era perfeita.

"Bom dia, Becbec," Freen falou, chamando minha atenção para ela. A mesma tinha um sorriso tão grande quanto o meu no rosto e um brilho inconfundível nos seus olhos.

"Becbec?" Li falou do seu lugar no colo de Freen, chamando as nossas atenções. Ela tinha um olhar curioso em seu rosto.

"Sim, é como a mamãe chama a Becky desde que a gente se conhece. É um apelido," Freen explica em sua voz doce e maternal. Eu tentei não me derreter com a interação das duas. Ainda teria um dia inteiro pela frente para isso.

"E eu posso chamar ela assim?" a pergunta de Li me pegou de surpresa, mas me fez sorrir ainda mais. Eu esperei Freen responder, mas a mesma só olhou rapidamente pra mim e voltou a encarar sua filha.

"Por que você não pergunta a ela?" Freen disse, ajustando seu corpo para Li ficar em uma melhor posição para falar comigo. Os olhos levemente puxados, os pequenos "travesseiros" debaixo do olhos e as bochechas lembravam tanto Freen, mas era o seu sorriso, com os dentinhos frontais protuberantes, que selavam a semelhança entre mãe e filha.

"Posso lhe chamar de BecBec?" Li perguntou em um tom de voz tímido, porém esperançoso, que me fez derreter um pouquinho mais.

"Claro, Li. Mas eu posso lhe contar um segredo?" perguntei, me aproximando dela e falando baixo, como se realmente ninguém pudesse escutar o que eu diria a seguir.

"Sim, eu sou muito boa com segredos," ela me prometeu com seus olhos arregalados enquanto concordava com a cabeça.

"Só as pessoas mais especiais podem me chamar assim," concluí quase em sussurro e a menina continuou concordando, como se fosse guardar meu segredo a sete chaves.

Me afastei e meus olhos passaram pelo rosto de Freen, que ainda sorria, mas algo diferente passava pelas suas expressões. Me senti confusa e não gostando daquela sensação, logo, sem pensar, levei minha mão ate o seu rosto em preocupação.

"Está tudo bem?" assim que meus dedos tocaram sua bochecha, Freen fechou seus olhos, em um gesto automático. Era claro os meus efeitos sobre ela. Pensei em tirar minha mão, mas seus olhos abriram e fixaram nos meus.

"Está tudo ótimo," ela falou com propriedade, angulando levemente seu rosto na direção da minha mão. A sua felicidade misturada com o brilho de honestidade e inocência, que eu havia visto refletido nos olhinhos de Li a pouco, fizeram meu coração aquecer. Retribuí seu sorriso e antes de tirar minha mão dali, permiti que meu dedão traçasse levemente a maçã do seu rosto.

"Vamos?" perguntei assim que tirei minha mão e dei um passo para trás.

"Vamos, mamãe!" Li disse, se agitando no colo de Freen.

"Vamos," Freen respondeu. "Você está com tudo aí, Becky?" ela me perguntou.

"Sim, tudo aqui," falei indicando minha bolsa em minhas mãos.

"Então vamos ao clube!" ela disse animada, fazendo cosquinhas de leve na barriga de Li que soltou uma gargalhada alta e alegre.

Freen caminhou com Li a minha frente, as duas conversaram e riram durante todo o pequeno percurso da minha porta até o carro de Freen. A cena, mais uma vez, encheu meu corpo de sensações. Diferentemente da outra vez que passamos o dia juntos, quando eu não sabia onde eu me encaixava naquela situação, dessa vez eu só conseguia lembrar das palavras de Freen, onde ela me disse que me queria em sua vida, de todas as formas, inteira.

Não vou mentir e dizer que isso ainda não me apavorava, mas era impossível calar a Becky que sempre sonhou com essa exata imagem. Freen, com uma mini cópia, num dia lindo, fazendo as coisas que amávamos fazer juntas, sorrindo e sendo felizes.

Realmente importava como chegamos ali? Eu sabia que sim. Mas isso tinha que ser decisivo? Eu seria capaz de ser corajosa como a Mon, como havia falado para Freen, e encarar aquilo de frente? Vencer meu pior inimigo? Meus medos, receios e feridas?

Freen terminou de acomodar Li em sua cadeira no banco de trás e fechou a porta. No lugar de se dirigir para o banco do motorista, ela deu passos pequenos até a porta do carona e a abriu, se virando para mim, com um sorriso convidativo no rosto.

Se apenas isso não fosse o suficiente para eu esquecer todos os meus questionamentos anteriores, mesmo que por alguns momentos, o que ela falou quando eu entrei no carro, antes de ela fechar a porta, com certeza era.

"Agora não falta mais nada," seus olhos reafirmavam qual o real sentido de suas palavras.

E talvez para mim não faltasse mais nada também.

Notas da autora:

Bom dia, bebês. Bom feriado a todos e boa leitura.

Espero que gostem e até o próximo!

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