Capítulo 39

79 3 0
                                    

Emily ainda não podia acreditar no que havia acontecido quando acordou na manhã do dia seguinte. As mãos de Balthazar sobre ela... o modo com o qual ele a havia beijado... tudo foi tão intenso que quase podia sentir sua pele arder onde ele a havia tocado.

Com surpresa ela pôde ver que ele estava bem ao seu lado parecendo dormir e ficou imaginando que horas ele havia retornado do galpão abandonado. Ficou o encarando por alguns minutos e quando ela menos esperava os olhos do demônio se abriram e a encararam intensamente. A garota corou por ter sido pega no flagra e desviou os olhos rapidamente perguntando a primeira coisa que lhe veio à mente.

_Por que seus olhos não são amarelados como os de Azazel, Asmodeus e Leviatã? _perguntou ela lembrando dos príncipes do inferno que já havia visto e que tinham esse diferencial do demônio a sua frente.

_Meu título como um dos sete príncipes do inferno foi tirado de mim por Lúcifer quando fui expulso do inferno, essa é uma característica que não já não tenho. _explicou ele acariciando os cabelos castanhos bagunçados dela enquanto seus olhos castanhos intensos não paravam de encará-la. _Sou um desgarrado. Não filho do inferno apesar da minha natureza.

Emily analisou as palavras ditas por ele e teve que segurar a língua para não perguntar o que aconteceria depois que toda a luta com Lúcifer acabasse e eles ainda estivessem vivos. Eles ainda ficariam juntos ou ele a deixaria em paz? Mas se conteve, não queria pensar naquilo agora, muito menos quando tudo parecia tão bem.

_Hoje é segunda-feira, você acha seguro eu ir para a escola com tudo o que está acontecendo?

_O que você acha? Você quer ir? _questionou Balthazar de volta se sentando na cama ao seu lado, o que permitiu a Emily ter uma bela visão de seu abdômen descoberto, que apesar das cicatrizes era definido.

_Quero, eu gostaria que parte da minha vida ainda fosse normal. _acenou ela lhe lançando um sorriso tímido quando ele se levantou da cama e se pôs em pé, virando o rosto sonolento, com os cabelos que haviam começado a crescer bagunçados em sua direção. O que fez as lembranças da noite anterior a atingirem de uma só vez a fazendo quase ficar tonta e sua respiração mudar, se tornando mais rápida.

Não soube dizer se ele notou, mas um sorriso malicioso brotou em seu rosto e ele se inclinou em sua direção, deixando um beijo carinhoso em sua boca, sem aprofundá-lo ou ousando fazer qualquer gesto que indicasse que iria adiante no que quase haviam feito na noite anterior, mas apenas sendo fofo. O que era estranho quando ela se lembrava de quem ele era. Um demônio maior perigoso que havia a torturado psicologicamente e fisicamente, fazendo da sua vida um inferno nas semanas anteriores. Balançando a cabeça ela fez aqueles pensamentos sumirem. Não adiantava agora ficar se lamentando sobre quem ele era, o importante era quem ele estava sendo agora e ela podia dizer que era alguém totalmente diferente de antes e era só o que importava. Ele não mataria nenhum inocente, ela cuidaria de garantir isso pessoalmente.

_Então você irá, talvez eu até tenha tempo para ir com você hoje. Mas antes talvez você queira ir para casa, deve estar com saudades do seu pai e acho que hoje ele não trabalha. _informou o demônio gentilmente, o que a fez quase se sentir culpada. Não via o pai desde a noite do baile e com tudo o que havia acontecido havia se esquecido completamente dele.

_Qual desculpa darei a ele? _perguntou Emily temerosa.

_Diga que dormiu aqui ontem porque Nora estava doente, eu te levarei para casa, se apronte.

_O quê? Você vai me levar para casa? _quis saber ela o encarando surpresa. _E que... não sei se seria uma boa ideia meu pai me ver com você.

_Não quer me apresentar seu pai Emily? _perguntou o demônio sorrindo amplamente divertido, colocando a mão no peito fingindo estar magoado.

_Não é isso. _negou Emily rapidamente. _E que você não o conhece, ele é muito protetor e se achar que temos algo ficaria achando que meu tempo na sua casa tem você como motivo. Ele não ficaria nada feliz, acredite.

_Não se preocupe com isso. Nenhum mortal resiste ao charme de um demônio por menor que sejam seus poderes. _assegurou Balthazar confiante. _Faz parte da nossa natureza, como você acha que nós os seduzimos para convencê-los a nós ceder suas almas?

Emily engoliu em seco sentindo um amargo na boca com as palavras deles. A menção do demônio a sua alimentação a perturbou. Imaginar Balthazar tirando a alma de alguém a fazia se sentir horrível, era como se ela fosse como ele, já que aparentemente gostava dele, apesar de saber que ele só era tão poderoso por causa das almas e que consumia e do sofrimento que causava. Balthazar talvez tenha notado sua expressão séria e ela sentiu a parte do colchão afundar quando ele voltou a sentar-se na cama, agora bem a sua frente.

_Eu avisei a você antes que não deveríamos ficar juntos, porque nada que você fizesse ou fizer irão mudar quem eu sou. Você já sabia disso ontem a noite e desde quinta-feira venho alertando isso a você, não deveria ser nenhuma novidade o fato de que almas e sofrimento são e serão para sempre minha fonte de energia. Assim como os humanos precisam de água e de comida para sobreviverem, os demônios precisam de almas e dor para manterem sua existência. Principalmente agora que preciso estar forte o suficiente para acabar com meu irmão. _ lembrou Balthazar a olhando nos olhos com uma expressão séria.

_Eu sei. _sussurrou ela com a voz fraca. _É só que ainda não posso dizer que isso não me incomoda. Afinal a cada alma que você tira é uma vida humana, e eu sou humana, para você acabar comigo seria tão fácil quanto respirar. E as pessoas inocentes, elas são mortas...

_Se isso ameniza seu martírio, eu costumo tomar almas ruins, criminosos em sua maioria, pelo menos nos últimos cem anos tem sido assim. Pessoas que nem sequer deveriam existir. Callie foi uma exceção, a matei porque ela lembrava você. _disse ele fechando a expressão, e a tornando obscura. _Nunca crianças. _deixou claro.

Por causa de Sophie, pensou Emily pesarosa.

_Como é tirar a alma de alguém? O que você sente?

_Ela não necessariamente morre, mas doe um pouco, apesar de tudo ser rápido. _contou o demônio não parecendo gostar de ter que falar do assunto. _Quando tiro a alma de alguém ela se torna energia para mim, poder. Não só para me manter vivo, mas me tornando poderoso. O fato de meus poderes serem quase como os de Lúcifer tem uma explicação, a morte de milhões de pessoas em troca. As tragédias como grandes tsunamis, inundações, tragédias com aviões ou guerras... muitas foram causadas por mim ou por vários dos meus irmãos para nosso próprio benefício, nosso poder e glória não passa de resultados de nossa incrível maldade. Quando entro em contato com as almas humanas sinto toda sua vida, suas perdas, as coisas ruins feitas pela pessoa, seus piores medos... é angustiante e para mim foi por um bom tempo algo gratificante.

_Mas não é algo gratificante agora é? _questionou Emily.

_Não, não é. _disse ele.

_Você se arrepende? Das pessoas que você matou para se tornar tão poderoso?   _perguntou ela. _Você as vê?

_Não digo que me arrependo, não a mas nada que posso fazer por elas... mas ouço ainda todas as noites em meus sonhos as vozes de desespero... Eu tenho as lembranças de cada alma que tirei ainda viva em minha memória como um castigo divino pelas vidas humanas tiradas por mim. _admitiu Balthazar fechando os olhos por um momento parecendo angustiado.

Emily quis consolá-lo e por um momento quase se inclinou para abraçá-lo, mas aí lembrou que era justo ele se sentir assim. Afinal, ele havia tirado milhares de vidas, e inocentes ou não, aquilo era quase como algo imperdoável. Ela não podia continuar evitar o que sentia e não iria lutar novamente contra aquilo apesar de quem ele era e tudo o que ele havia feito, mas não podia simplesmente tratá-lo como uma pessoa normal, até porque ele não era. Ele havia matado pessoas no passado e deveria suportar todos os sentimentos ruins que o atormentavam sozinho, aquele era seu martírio e Emily não podia fazer nada.

Mistério Dos Sombrios Vol 1Onde histórias criam vida. Descubra agora