Mistério Dos Sombrios Vol 1

Capítulo 60

Neve caia intensamente enquanto o vento batia com violência contra seus rostos, no entanto Balthazar e o restante dos demônios maiores que o acompanhavam não pareciam sentir ou se incomodar com aquilo enquanto usavam seu poder para derrubar a barreira ao redor da enorme casa escondida por feitiços poderosos que mantinham Lúcifer e seus aliados protegidos de qualquer coisa vinda de fora. Reunido com Lilith e um conjunto de quase dez demônios maiores, juntamente com Azazel e Asmodeus, o demônio usava seu poder contra a barreira invisível a poucos centímetros de seu rosto. Sentiu quando quase vinte minutos depois a barreira antes não visível aos seus olhos começava a ganhar um tom levemente avermelhado, se tornando quente sob suas mãos frias, fazendo o esforço deixá-lo levemente enfraquecido, mas não parou, impondo seu poder com ainda mais força e determinação. Aquele era apenas um passo de tantos que precisava fazer para derrotar Lúcifer, mas tinha fé em si e em todos que o ajudavam. Um plano havia sido traçado e se tudo desse certo e saísse como planejado estaria comemorando sua vitória naquela mesma noite. Porém muitas coisas podiam dar errado, o poder da espada podia muito bem matá-lo no processo e Emily poderia já estar morta quando enfim conseguisse ultrapassar a barreira. Tantas coisas negativas poderiam vir a acontecer naquele dia, coisas que talvez nem mesmo ele poderia prever ou remediar, por isso seu plano tinha que dar certo, contava com a ajuda de Azazel para isso.

Tinha alguma coisa errada com Emily, ele podia sentir isso com uma certeza que fazia seu peito doer. E então ele ouviu, um grito estridente vindo de algum lugar de dentro da barreira. O poder que mantinha a barreira em pé e impedia qualquer um de entrar e de ver qualquer coisa de dentro dela parecia não ter efeito quanto ao som. O grito continuou por mais alguns segundos e parou bruscamente, seguido de um silêncio mortal e aterrador.
Havia sido um grito feminino que rapidamente reconheceu.

_Emily... _ murmurou Balthazar baixinho para si mesmo. Ele podia sentir sua presença, como se por alguns instantes a garota houvesse estado ao seu lado. Também sentia que havia algo errado, como se algo tivesse acontecido com ela.
Ela deveria estar perto, talvez em alguma parte fora da casa. Medo o encheu e ele sentiu cada átomo de seu corpo estremecer em um arrepio de medo, não do irmão, mas sim do que ele possivelmente fizera com Emily. O grito ouvido havia sido de dor, não havia dúvidas quanto a isso, mas o silêncio que se seguiu a ele foi ainda mais agonizante. Era como se ele houvesse feito algo para impedi-la de gritar, algo que provavelmente a havia machucado.

_ Continuem! _ordenou o demônio friamente, se forçando a continuar impondo seus poderes contra a barreira de poder agora visível, sabendo que só depois que ela estivesse destruída teriam uma chance de realmente acabar com Lúcifer e salvar Emily.

***

Emily caiu no chão gelado coberto de neve com tanta força que sentiu uma dor intensa nas costas quando seu corpo se chocou contra o chão, mas uma vez. Mas não gritou uma segunda vez como havia feito minutos antes quando tentara de maneira inútil passar pela barreira e gritara de dor ao sentir uma espécie de eletricidade percorrer seu corpo, apesar da dor ser ainda pior. Não havia conseguido nada, no entanto, além de graves machucados ao se chocar contra a barreira e ser jogada para trás de uma só vez.

Encarou a barreira agora com tom estranhamente avermelhado parecendo ficar cada vez mais escura de forma infeliz e engoliu em seco amedrontada ao ver os sapatos pretos de seu captor próximo ao seu rosto, tentando manter a expressão indiferente, quando na verdade tudo que queria era correr dali.

_Só vai conseguir se machucar com isso, desista de uma vez anjinho, nada passa por essa barreira, pelo menos por hora.  _alertou Lúcifer com a expressão extremamente azeda, com uma carranca nada boa, como se estivesse a ponto de partir para cima dela. _E mesmo se Balthazar passar por ela, o que eu sinceramente até vou gostar, de nada adiantará, a não ser que ele esteja disposto a renunciar a você.

_E quem disse a você que ele não estará disposto a isso? _questionou ela baixinho, sentindo sangue escorrer de seu nariz.

_Eu o conheço, sei que não estará, senão não teria feito tudo isso por sua causa. _reiterou ele colocando a mão no rosto ao mesmo tempo que ela, como se sentisse o mesmo, apesar de não na mesma intensidade.

_Também sente o mesmo que eu... não é uma via de mão única o que você fez. _constatou Emily tentando se levantar, mas não obtendo êxito, se deixando cair outra vez no chão frio, tremendo sem parar.

_Mas sou mil vezes mais forte que você, o que me machuca pode matá-la, já o que acontece com você só provoca em mim um pequeno arranhão. Mesmo se alguém te matasse, eu ainda estaria vivo, respirando, bem..., mas o contrário seria fatal para você de diferentes maneiras. _explicou o demônio. _Não tente pensar que se machucando vai me afetar, porque não vai. _ressaltou.

_Eu jamais pensaria... _ começou a dizer a garota, gemendo de dor quando sem aviso sentiu uma pressão violenta na mão esquerda, só percebendo segundos depois que o demônio havia pisado em seus dedos com tanta força que não pôde conter as lágrimas, ainda caída no chão coberto de neve. _... nunca poderia pensar que o diabo na verdade... que não passasse de um covarde. Por qual motivo você usaria uma garota humana para não ter que enfrentar outro demônio?

_Acha que não vou enfrentá-lo? É claro que irei, não estou disposto a deixá-lo impune por sua traição. E dessa vez não serei misericordioso, farei o que deveria ter feito há mil e quinhentos anos atrás quando o expulsei. Se prepare para vê-lo morrer. _assegurou Lúcifer lhe lançando um sorriso doentio, aumentando ainda mais a pressão de um de seus pés na mão de Emily. _Levante-se! Ele sente você, está ainda mais desesperado para entrar aqui, e isso é exatamente o que quero. 

Emily não se mexeu, não conseguiria se levantar nem se quisesse, cada parte do seu corpo doía e era como se milhões de agulhas invisíveis perfurassem seu corpo ao mesmo tempo, sem falar no frio excruciante de gelar os ossos que fazia ali fora, com o vento gelado atingindo seu rosto com agressividade.

_Essa era sua intenção ao me trazer aqui? _perguntou ela respirando aliviada quando ele enfim se afastou alguns passos, livrando sua mão que agora tinha um tom avermelhado e inchado onde o sapato dele estivera praticamente esmagando sua mão.

Sem paciência o demônio ignorou sua pergunta e a segurou por um dos braços, começando a puxá-la, a arrastando pela neve sem misericórdia. Emily não pôde e evitar os gritos, além do enorme frio que fazia e a ardência cada vez que a neve entrava em contato com sua pele e era extremamente dolorosa, havia os machucados que cobriam seu corpo pelas tentativas inúteis de passar pela barreira.

_ Não! _gritou ela histericamente, se debatendo de maneira desesperada na tentativa de se soltar.

_Sua intenção e fazê-lo te ouvir? Se for saiba que conseguiu o que queria, ele ouviu, sabe que você está aqui fora. _disseo demônio a forçando a se levantar, segurando seu rosto com agressividade entre as mãos, a obrigando a encará-lo. _E se quer tanto gritar, vou te dar motivos. Mas não aqui fora. Vamos!

Então voltou a puxá-la de maneira brusca em direção aos pequenos degraus que levavam a porta de entrada da casa.

_Ele virá me salvar, eu sei que vem, e não importa o que aconteça, você vai morrer hoje Lúcifer. _ murmurou a garota reunindo o pouco de coragem que ainda tinha para enfrentá-lo.

_Ah, a coragem dos jovens tolos que acham que tudo pode ser resolvido com um simples brandir de espadas. Eu já vi isso querida, milhares de vezes, houve muitas situações como está antes, sei lidar com infortúnios como se fossem uma especialidade minha. _rebateu ele de maneira arrogante.

_ Não dessa vez, dessa vez é diferente, você nunca enfrentou alguém tão forte antes, e muito menos tantos demônios dispostos a te tirar do trono. Você não é invencível e por isso está com tanto medo. _afirmou Emily confiante.

_Sabe qual meu maior medo Emily? Não perder o poder como você acha, nem morrer, depois de tantos anos de vida deixar esse mundo não me preocupa, mas sim isso. _declarou o demônio apontando para o coração dela.

_Amor? _questionou ela baixinho confusa. Então o grande e poderoso rei do inferno temia um sentimento humano tão comum?

_ Não, me refiro a todo tipo de sentimento humano. Eles me aterrorizam, porque são perigosamente imprevisíveis e fazem quem os sentem serem controlados. Veja Balthazar, um perigoso príncipe do inferno capaz de coisas perversas e horrendas, que já matou milhões de almas sem nunca se arrepender, e agora está de quatro por uma garota humana tão jovem quanto a folha da árvore mais jovem do inferno.
_ Não deveria. Sentir faz parte de quem somos, não há como evitar. _disse Emily.
_Talvez seja comum entre os humanos, mas não para demônios. Sentir não existe, e mesmo nos mais raros casos nunca termina bem.

_ Você amava Lilith? _perguntou a garota tropeçando nos próprios pés quando ele a empurrou em direção a porta aberta da mansão, sendo amparada por ele que a manteve contra seu peito, a apertando de maneira quase sufocante.

_Eu não amo ninguém, Emily, você já deveria ter percebido isso. _respondeu ele rindo secamente, a guiando para dentro da construção antiga da enorme casa de decoração vitoriana que estava sendo seu lar nos últimos dias.

_Então o que sente por Balthazar? Uma obsessão? Porque se existe algo claro nisso tudo é que o único motivo pelo qual você me queria é por causa dele. Você odeia a ideia de vê-lo feliz sem sua presença. Vê-lo comigo te enoja, mas não por eu ser humana, mas sim porque gosta dele. _argumentou Emily sentindo-o aumentar o aperto em sua cintura parecendo irritado. _Imagine a sua decepção ao saber que logo ele havia se apaixonado, por alguém comum, sem nada de especial, alguém que não era você. Ele sempre foi sua base para tudo, mas então passou a não ser e você teve que tomar uma decisão depois da rebelião no passado. O poderoso Lúcifer não poderia admitir que seu maior aliado se voltasse contra você sem haver consequências, por isso o expulsou. Mas então o tempo passou e percebeu que fora um erro e que precisava trazê-lo de volta para o seu lado, que você não poderia reinar sozinho. No entanto Balthazar não era o mesmo, ele havia mudado, se apaixonado... e não importava as armas que você usasse para tentar trazê-lo de volta para você, ele estava determinado a não ceder. E então você fez de tudo para tirar a felicidade dele, mas o que isso te custou além de perder tudo? Ele já venceu, você não vê? A única coisa que resta é derrotar você e parte dos demônios despreparados, e mesmo se ele não conseguir matá-lo vai ter alguém que o faça, entenda que não existe um jeito em que você se dê bem nessa.

_Eu deveria ter matado você a muito tempo, mas acho que darei esse prazer ao meu irmão. Posso morrer hoje como você carinhosamente disse, mas você sabe que a levarei comigo. _murmurou Lúcifer friamente.

_Acha que tenho medo de morrer? Saiba que não tenho, se precisar morrer para que você também morra, eu o farei sorrindo. _retrucou ela em desafio, apesar de algo dentro dela saber que aquilo não era verdade.