Mistério Dos Sombrios Vol 1

Capítulo 57

_Um espelho? _questionou Emily confusa.
A sua frente havia um espelho grande próximo a parede. Estavam em uma espécie de quarto enorme cheio de caixas que parecia abandonado, com teias de aranha e poeira por todos os lados. Mas por algum motivo o demônio a levara ali.
Por um momento nada aconteceu, e sequer seu reflexo aparecia no espelho, mas então a imagem refletida ficou escura e depois a figura de Balthazar apareceu e a encarou de maneira sombria.

_O que é isso? _perguntou ela se virando para encarar o demônio logo atrás dela.  Lúcifer que sequer piscava a encarou de maneira analisadora e depois sorriu largamente, como se risse de uma piada que só ela conhecesse.

_Esse espelho reflete seu medo mais profundo, aquilo que você mais teme. É uma criação dos demônios, nem mesmo seu medo mais íntimo pode ser escondido dele.

A figura sombria de Balthazar refletida no espelho se moveu e então desapareceu, dando lugar a cenas horrendas de mortes e pessoas gritando. Apavorada e com os sons de gritos e choros parecendo se intensificar, Emily usou as mãos para tampar os ouvidos e se virou de costas, tentando ficar o mais longe possível do espelho.

_Para! Faz isso parar! _gritou ela para o demônio atrás dela, mas mesmo depois de se afastar do espelho os sons não cessaram.

_Então seu maior medo é quem Balthazar era, as monstruosidades que ele fez e pensar que talvez ele não tenha mudado. _ouviu Lúcifer murmurar rindo de maneira quase que prazerosa. _Isso é interessante, ainda, mas que você afirmou assim que chegou aqui que meu irmão tinha mudado. Se ele mudou então porque tem medo dele? Seu maior medo não sou eu, mas sim ele.

_Isso não é verdade.  _ negou Emily balançando a cabeça.

_O espelho não mente. _afirmou ele cruzando os braços acima do peito e a encarando de maneira séria. _Eu gostaria de conhecer mais você Emily, de saber quem realmente você é. Você não é tão fácil de ser lida como meu irmão acha que é, para mim você é um mistério.

_Talvez você não seja um bom leitor. _retrucou ela o fazendo rir.

_ Você sempre tem uma resposta na ponta da língua para mim. É corajosa, no entanto também idiota. Você é medo Emily, mas também é força. _disse ele se aproximando dela e tocando de leve em suas bochechas. _Eu vejo tanto em você, já pensou em virar alguém como eu? Não é um processo fácil, mas pode ser arranjado se assim você quiser. _sugeriu o demônio a surpreendendo.

_Eu não quero ser como você, e sequer quero que você toque em mim de novo! _esbravejou ela se afastando bruscamente e caminhando em direção à porta, parando no meio do caminho sem conseguir dar nenhum passo.

_Eu não preciso da sua permissão na verdade, eu posso fazer o que eu quiser com você, nada vai me impedir, e você não pode lutar contra mim. _constatou Lúcifer a puxando de maneira nada gentil para que ficasse a sua frente. Emily tentou de toda forma se mover, mas era como se estivesse grudada no chão e nada conseguiu além de arrancar um sorriso sarcástico do demônio a sua frente.
_Quer me ver provar como posso controlar você Emily? _perguntou ele chegando tão perto que seus narizes por pouco não se tocaram, tudo que Emily sentiu foi vontade de virar o rosto enojada, mas não conseguia, de alguma forma mesmo sem dizer nada ele a estava controlando, usando seu poder contra ela a fazendo permanecer parada. _Me beije. _sussurrou.

E então sem que Emily pudesse controlar, se viu se aproximando ainda mais dele e o beijando. Quando seus lábios se tocaram sentiu frio, era como gelo líquido descendo por sua espinha, a fazendo sentir medo. Um arrepio subiu por sua espinha e ele nada tinha a haver com desejo, era uma sensação angustiante, era a morte.

Tudo ao seu redor desapareceu e se viu em outro lugar, um lugar escuro e gelado. Lúcifer não estava mais ali e ela percebeu que era uma visão, algo que o demônio queria que ela visse, assim como Balthazar fizera com ela certa vez.
Houve um barulho estridente vindo de algum lugar do cômodo escuro e apesar do medo Emily se viu se aproximando lentamente da origem do som, encontrando uma pessoa encolhida no canto próxima a parede, batendo na parede com uma força quase desumana tentando de alguma forma fazer um buraco, mas não conseguindo nada além de dedos machucados, a parede não parecia ter nenhum arranhão. Percebeu com horror quando se aproximou mais que a figura encolhida era uma mulher e apesar da escuridão viu que estava coberta de sangue escuro e com feridas horríveis por todo o rosto, braços e pernas. A mulher ergueu o olhar e encarou Emily com um olhar tão cheio de ódio e desprezo, que a garota se viu dando alguns passos para trás assustada. "Ela conseguia vê-la?" _pensou. Mas logo depois percebeu que aquele olhar não era dirigido a ela, e sim para a pessoa atrás dela. Se virando pôde ver Balthazar, que se aproximou silenciosamente de onde a figura da mulher estava sem ver Emily e se abaixando próximo a ela disse:

_Espero que você esteja se sentido em casa nas suas novas acomodações "amor", fiz essas paredes impenetráveis somente para você.

_Por que não me mata logo e acaba com isso? _retorquiu a mulher de maneira amarga. Emily soltou um ofego surpreso ao constatar que era Evelyn, que apesar da situação lamentável onde se encontrava ainda tinha fôlego e sede de vingança para ofendê-lo. _essa é a única coisa que te resta! Você tinha poder suficiente para impedir que os poderes de Lúcifer aumentassem, mas você não fez isso e hoje você não pode sequer pisar no inferno. Você não passa de um fraco, nunca vai ter coragem de matá-lo, vai viver sempre na sombra dele.

_Matar você agora me fará perder toda a diversão de vê-la implorar pela morte. Eu quero te ver sofrer, me alimentar do seu sofrimento, porque nem se você morresse mil vezes seria suficiente para fazê-la pagar pelo que você fez. Eu nunca vou perdoar você, se depender de mim você vai passar a eternidade pagando com sangue pelo que você me tirou. _murmurou ele com tanto ódio na voz que Emily recuou onde estava assustada.

_Fazer isso não vai trazê-la de volta. _lembrou ela.

_ Não, não vai, mas vai tornar minha vida um pouco mais prazerosa, isso para mim já é o suficiente.

O demônio fez um gesto com a mão e Emily pôde ver Evelyn colocar a mão no pescoço e respirar com dificuldade. Outro gesto com a mão e a meio-demônio soltou um grito horripilante de dor, com sangue saindo por seu nariz e ouvidos.

_ Não por favor, podemos ter outros filhos Balthazar, por favor... _implorou Evelyn quase chorando, o que fez Emily imaginar que seja lá o que Balthazar estivesse fazendo para que ela sentisse dor, estava funcionando muito bem. A expressão no rosto da meio-demônio era de dar pena, mas o demônio a sua frente não pareceu sentir o mesmo que Emily, ele se aproximou ainda mais da esposa ainda agachado e segurou seu braço com agressividade, logo em seguida pôde se ouvir o som de ossos se quebrando.

_ Você e eu não é algo que existe Evelyn. Se aliar a Asmodeus em uma rebelião contra meu irmão, eu até perdoaria você por isso, mas matar a minha filha, isso não é algo que eu possa perdoar. _Emily ouviu Balthazar dizer ignorando os gemidos de dor de Evelyn que pareciam cada vez mais altos. _Minha consideração por você todos esses anos morreu, vou tratar você como realmente merece.

Houve mais sons de ossos se partindo e Emily se virou de costas e tampou os ouvidos não querendo ouvir mais nada. E então a visão sumiu e ela estava de volta ao cômodo do espelho com Lúcifer.

Eles ainda estavam muito próximos, mas ela podia ver que ele havia se afastado alguns passos. Tinha no rosto uma expressão inexpressiva e a encarava quase que sem piscar.

_Isso não muda nada, Evelyn merecia, ela matou a filha dele, isso não muda nada para mim, isso não torna ele um monstro. _afirmou Emily para o demônio a sua frente. Se a tentativa dele ao fazê-la ver aquilo era fazê-la ver Balthazar como um monstro, não ia deixá-lo conseguir, não importava o que ele fizesse.

_Vamos ver mais uma, você talvez goste mais dessa. _disse ele ignorando suas palavras e segurando seu rosto com as duas mãos.

Tudo sumiu outra vez e Emily estava agora em um galpão, o mesmo que Balthazar havia usado para treinar os vampiros e onde havia matado aquela garota. Não demorou muito para ver onde ele estava, no centro do lugar próximo a algumas pessoas que estavam ajoelhadas no chão parecendo não poder se mexer.
Caminhou devagar até eles e viu com horror quando uma espécie de sombra escura saiu de uma das pessoas ajoelhadas e foi diretamente até o demônio, desaparecendo quando tocou em seu peito, ele se repetiu com as outras três pessoas, e então quando Emily chegou perto o bastante pode ver os olhos do demônio que estavam pretos, finalmente entendeu o que havia acontecido. Ele estava se alimentando, as sombras escuras eram na verdade almas, almas que ele havia tomado daquelas pessoas.

Apesar de tudo as quatro pessoas no chão ainda pareciam estar vivas, mas com olhares vazios e distantes, como se não sentissem nada. Balthazar havia dito que costumava matar os humanos dos quais se alimentava, em um ato de misericórdia já que viver sem alma era uma das piores coisas que podia acontecer a uma pessoa. Era como viver sem nunca poder ser feliz ou sentir qualquer sentimento bom. Porém o que viu o demônio da lembrança fazer não teve nada de misericordioso, nada de bondoso ou solidário. Era sim cruel e não pôde conter as lágrimas que desceram por seu rosto ao ouvir os gritos enquanto se virava para não ter que ver nada daquilo.
Era sofrimento, lembrava dele ter dito a ela no dia em que matara Callie no galpão. Aquilo também era seu alimento, era disso que ele gostava, era o que fazia antes dela, aquilo fazia parte de quem ele era, não importava o quanto ele tivesse mudado, ele sempre seria um demônio.

_Vê, Emily? É isso que quero mostrar a você, não existe diferença entre meu irmão e eu, somos o mesmo. E você também pode ser como nós, isso tornaria mais fácil ficar com ele, só eu posso fazer você poderosa, só eu posso fazê-la uma de nós. _tentou persuadi-la.

A lembrança havia desaparecido e ali estavam os dois de novo no cômodo do espelho. De alguma forma Emily não se sentia mais presa no mesmo lugar, mas também não havia vontade alguma de tentar fugir dali, não daria em nada e ela sabia disso. Ele a alcançaria antes que ela pudesse pensar.

_Se me tornasse como você eu usaria todo meu poder para destruí-lo. _afirmou ela com a voz tremendo. _Eu te odeio! E nada mudará isso.

_ Você não me deixa escolhas então, se a única forma de ter você do meu lado é controlando você, eu o farei. Farei você esquecer Balthazar e será como se nunca o tivesse conhecido, cada memória e lembrança que te ligue a ele irá sumir e você não lembrara de nada além do que eu quiser que você lembre.

_ Não... _sussurrou Emily dando passos para trás na tentava de se afastar, mas sendo puxada de volta por ele que segurou seu rosto entre as mãos e a fez encará-lo.

_Esqueça Emily, você vai esquecer, Balthazar e tudo mais relacionado ao meu irmão. _ murmurou o demônio com os olhos vermelhos ainda mais brilhantes focados nos de Emily.