Capítulo XVII

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- E então, Desertor? Vai aceitar seu destino ou prefere morrer? – perguntou Beli com um rancor jamais maior em sua voz. Ariel já compreendia naquele momento exatamente o que teria que fazer, mas é claro, faria com estilo.

- Até parece que você e esses patetas conseguiriam me matar, Beli. Mas vou ajudá-los a manter suas reputações. Quero saber o que o bocó que se intitula meu pai tem a dizer para mim – disse Ariel se prontificando para seguir os demônios ali presentes de volta para o inferno mas não sem antes realizar um ínfimo milagre para que uma breve despedida escrita em um papel aparecesse em frente à porta de vidro do jardim.

Assim que todos sumiram dali, levaram-se uns bons minutos até que Aziraphale e Crowley começassem a procurar Ariel. Sem seus poderes, sem serem celestiais, sem ser nada além de humanos eles não poderiam mais identificar energias positivas ou negativas. Estariam somente com suas medíocres intuições humanas.

Quando por fim perceberam que Ariel não estava mais na casa, um certo desespero logo se instalou em ambos os pais que logo correram para o jardim. Tão desesperados que nem notaram a pequena cartinha envolvida cuidadosamente em um envelope fechado por um adesivo de tubarão.

- Crowley... – Aziraphale choramingou olhando para todos os cantos do jardim – Ariel se foi. Ariel se foi e eu não fiz nada... – disse o anjo começando a perder o fôlego, logo levando a mão ao coração. Esse que doía como nunca.

- Ei, ei, anjo – O demônio se aproximou e fez o anjo olhá-lo – Não foi culpa sua. Não foi nossa culpa. Você entende que Ariel tem poderes incríveis? – Aziraphale o encarava regulando sua respiração. Crowley percebendo isso, continuou o confortando – Se lembra de quando Gabriel apareceu aqui e Ariel mudou completamente só para te defender? Você estava doente, se lembra?

- Sim...Eu me recordo... – o loiro começou a olhar novamente pelo jardim, até bater os olhos em algo perto da porta – Querido, olhe! – disse logo indo pegar o envelope. Ao notar o adesivo de tubarão já sabia que era de Ariel, já que tubarões eram seus animais favoritos. Se apressou a abrir o envelope com Crowley ao seu lado com uma feição interessada e preocupada.

" Oi, pais. Preciso ser breve.

Me perdoem pela preocupação que estou fazendo vocês sentirem. Já aviso que estou bem. Fui ao inferno com uma escolta de demônios muito bem intencionados. Eu sei o que estou fazendo.

Pai Azi, eu consigo me proteger. Já tenho noções de o quão forte sou e de como meus poderes são...bem...poderosos.

Pai Crow, prometo que vou ser o demônio mais arrogante e maldoso que o inferno já viu mas não tanto ao ponto de deixá-los orgulhosos.

Se cuidem. Lembrem que agora são humanos, mesmo que temporariamente.

Eu amo vocês!

                                        Ass: Ariel "

Ao terminarem de ler, reações distintas foram expressadas. Aziraphale somente abraçou a cartinha contra seu peito, a fim de matar pelo menos um pouco da saudade e sanar, mesmo que fosse pouco, aquela preocupação que permanecia em si.

Já Crowley começou a andar pelo quintal com seus nervos à flor da pele. Em sua mente, xingava e amaldiçoava todos os demônios que conseguia lembrar do nome, mas aquele que Crowley mais xingava e amaldiçoava era o próprio Lúcifer. O ruivo pensava no estrago que faria se ainda pudesse ir pro inferno. Pensava como poderia ajudar Ariel se ainda fosse um demônio naquele momento, e por um instante se arrependeu de ter se tornado um humano. Mas logo se recordou que foi para o melhor de todos os envolvidos e que logo logo, quando toda a poeira abaixasse, iria voltar ao inferno por uma última vez e matar cada um lá.

Aziraphale se aproximou de Crowley e o abraçou forte, sendo retribuído quase que imediatamente. Ambos com apenas um sentimento presente em seus corpos. A esperança de um dia poderem ver sua criança novamente.

: No Inferno :

Ariel andava pelos corredores pouco iluminados com seis demônios na sua cola. Notava que os outros demônios abriam espaço para que passasse. Notou também que haviam muitas placas por lá. Acabou lendo uma delas que dizia "Para um serviço mais eficiente, apenas arranque sua própria garganta com um grampeador.", essa que fez Ariel soltar uma leve risadinha, incomodando Beli.

- Está achando a situação divertida? – perguntou.

- Sinceramente? Sim. – disse olhando para Beli com um sorriso desdenhoso em seu rosto.

- Vamos ver se continuará assim por muito tempo... – ela disse logo se adiantando na frente de Ariel para bater em uma porta preta de madeira esculpida, diferente de todas as outras ali que eram de ferro acinzentado. Logo após bater na porta, Beli se virou e saiu de lá, acompanhada dos outros demônios.

- ENTRE – um grito pôde ser ouvido de dentro da sala. Ariel já tinha certeza de onde estaria entrando. E Ariel já havia pensado em tudo. Seu plano envolvia engabelar Lúcifer perfeitamente, correr de volta para a terra, encontrar seus pais e fugir pra outro universo.

Ariel entrou na sala com calma. Desespero não se é recomendado em momentos como esse. O demônio conseguia visualizar seu progenitor em sua mesa (e como odiava aquela mesa). Conseguia também perceber que aquele escritório não havia mudado em nada (e como odiava aquele escritório).

- Ah, criança! Você veio! Venha mais perto, quero ver bem como tu cresceste – disse Lúcifer se levantando da cadeira e dando a volta na mesa. Ariel pôde notar que aquela alegria era, de fato, genuína...? – Como cresceu! Venha, vou te mostrar tudo que será seu como sucessor e depois vou lhe mostrar tudo o que terá que fazer para conquistar tudo, e quando você recusar, irei lhe mostrar todas as consequências que o ato de recusar irá lhe render – disparou, lançando uma vez ou outra um sorriso convencido para Ariel.

- Para de tagarelar! O que você quer de mim? – reclamou impaciente.

- Criança, apenas ouça. Tudo isso aqui pode ser seu, tudo mesmo-

- Eu sei, mas eu não quero tudo isso, nem um pouco disso, eu não quero nada disso! Eu nunca quis. Sério, só passa tudo isso pra outra pessoa e esquece que eu existo. Pronto! – desabafou.

- EU NÃO QUERO PASSAR PARA OUTRA PESSOA, CRIANÇA INSOLENTE! – gritou Lúcifer assustando Ariel, que consegui esconder com sucesso. Lúcifer suspirou pesado e se sentou em sua cadeira – Agora entendi tudo que Hastur sempre dizia sobre você. Pra te fazer calar a boca, só tem um jeito – soltou, como se não fosse nada, sem olhar para Ariel.

Ali Ariel sentiu seu corpo pesar como nunca. Se esqueceu de qualquer plano que pudesse ter bolado no caminho para aquela maldita sala. Seu progenitor, aquele que mesmo quer nunca tivesse lhe dado o mínimo de afeto, ainda mantinha um mísero lugar no coração de Ariel. Mas ele sabia de tudo! E nunca fez questão de impedir. Muito pelo contrário, ele incentivava para que aquilo ocorresse. Ódio era tudo que Ariel sentia naquele momento. E em sua mente, só se passavam maneiras e mais mil maneiras de matar aquele demônio em sua frente.

- Olha, parece que na verdade tem sim outra maneira de te fazer calar a boca, criança – disse Lúcifer rindo.

- Ariel.

- O que disse?

- Ariel. Meu nome – disse ouvindo Lúcifer gargalhar logo após.

- Você não tem um nome, criança. Eu nunca te dei um nome – soltou desdenhoso.

- Eu tenho um nome. Minha família me deu um nome – disse com raiva se aproximando lentamente da mesa escura, encarando Lúcifer de uma maneira que nenhum outro ser teve coragem antes – Essa mesma família me deu amor, carinho, afeto...Coisas que você nunca me proporcionou – parou em frente à mesa e apontou para o mais velho.

- Escuta aqui. Dá pra você calar a porra dessa boca? Sério, sua voz me irrita demais. Ou eu vou ter que te fazer sentar aqui no meu colo e te mostrar que eu posso fazer o que eu quiser com você? – falou enquanto afastava a cadeira onde estava para longe da mesa e dava batidas nas pernas.

Ariel sentia nojo agora, além de claro, todo o ódio que já estava sentindo. Queria arrancar a cabeça daquele demônio à sua frente, passar uma corrente pelas orelhas e usar de colar. Mas tinha uma ideia melhor. Ariel tinha uma ideia bem melhor.

100 Bad DaysWhere stories live. Discover now