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Harry partiu no dia seguinte logo após o café da manhã, deixando instruções cautelosas para Gretchen, que ficaria em casa com Poppy. Seu carro o levava ao restaurante, situado a dez milhas de distância, no centro da pequena Cidade.

Desceu o vidro da janela e aspirou profundamente o aroma campestre. O ar cheirava a terra, frescor e grama. Como sentira falta de tais fragrâncias. Os pés de milho já chegavam à altura de seu ombro e lhe acenavam ao sabor da brisa do início de agosto. Quase podia sentir a tensão da cidade grande, tão acumulada em seus poros durante cinco anos, dissipar-se a cada colina por que passava.

Amava Nova York, com sua rotina frenética e perene movimento. Houve vezes, entretanto, bem na calada da noite, em que o sono se recusou a chegar. Ocasiões em que a saudade de casa assolou-o e ele ansiou por ouvir o barulho ritmado da cadeira de balanço de Poppy, sentir o cheiro do feno sendo cortado e embalado, ver o tom particular de azul existente apenas no céu de Nebraska.

E se Harry mergulhasse profundamente em sua alma teria de admitir, embora com dor, que sentira saudade de Louis.

Houve época em que eram capazes de terminar a sentença um do outro, tão ligados estavam.

Dois adolescentes desajustados, sempre à procura de algo, parecendo estar um passo adiante ou além de outras pessoas, mas em perfeita sintonia enquanto casal.

Ele rompera tal harmonia ao partir. Louis destruíra qualquer laço ao deixá-lo ir com tamanha facilidade.

Apertou com força o volante, lutando com a estranha combinação de arrependimento e ressentimento.

Com alívio, virou e entrou no estacionamento do restaurante Della's. Delia fora a avó de Harry, falecida quando ele ainda era bebê. Poppy não mudara o nome do restaurante, a despeito da ausência da mulher de quem o neto nem mesmo conseguia se recordar.

Encontrou uma vaga no estacionamento quase lotado. Em vez de sair do carro instantaneamente, ficou sentado por uns poucos momentos a observar o local que era mais um lar para ele do que a casa de fazenda de dois andares.

A construção havia sofrido com o tempo. A pintura precisava ser renovada, mas mesmo assim, o restaurante mantinha um certo charme.

Toldos listrados protegiam as duas janelas frontais do sol da manhã e imensas floreiras a cada lado da porta ofereciam o colorido de petúnias e de outras flores de variados tamanhos e tons.

Poppy era o dono do restaurante, mas jamais trabalhou em período integral. Quando Harry era bem jovem, costumava passar muitas horas ali após o retorno da escola. Preferia a caótica atmosfera do restaurante à solidão da fazenda.

Fora o dinheiro das gorjetas do trabalho como garçom, após o retorno da escola, que lhe permitira deixar Holmes Chapel cinco anos atrás. Parecia-lhe irônico que mais uma vez dependesse do restaurante para completar o sonho de retornar a Nova York.

Desceu do carro e entrou. Um sino tocou quando ele abriu a porta e imediatamente Harry foi acolhido pelo aroma de comida e o barulho inerente ao salão lotado.

Betty Jean Prather, a gerente grandalhona e de cabelos grisalhos, viu-o entrar e caminhou em sua direção, os amplos braços abertos para cumprimentá-lo.

— Por acaso é nossa estrela vindo para casa para uma visita?

Abraçou calorosamente Harry, seu avental emanando o cheiro familiar de temperos, perfume de rosas e chiclete de menta.

O abraço foi retribuído com afeição. Betty Jean fora a única influência feminina em sua vida. Fora ela quem lhe contara os fatos da vida.

— Deixe-me dar uma olhada em você.

Um novo amanhã l.sWhere stories live. Discover now