VII

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Assim que enveredou pela segunda estrada percebeu o quão diferente era da anterior. O chão duro, irregular, cheio de pedras e entulho, o fez se lembrar com amargura que deixara seus sapatos para trás. Fazia um frio enregelante, ao mesmo tempo que o ar seco, e de algum modo rarefeito, dificultava o simples ato de respirar.

Era um caminho estreito. Dos dois lados havia uma espécie de cerca de espinhos, densa como mata fechada. Brotavam ameaçadoramente de plantas robustas, enegrecidas pela caligem noturna, que o pupilo não conhecia, e que lhe pareciam mortas. Em todo o caso, ele não parou para observá-las. Seu mestre fora muito enfático quanto a isso. “Não olhe sequer para os lados”, havia dito. E o pupilo foi fiel a essa ordem, particularmente quando teve a ingrata sensação de que sombras dançavam ao seu redor.

Arrepiou-se, braços e nuca. Continuou caminhando, olhando para frente, para o longe. Contudo, sua visão periférica captava os movimentos fugazes de vultos silenciosos, indo e vindo pela penumbra. Crescia a cada passo uma opressora carga de terror, que fechava sua garganta como uma gélida mão de ferro, sufocando-o mais que o ar rarefeito.

Um sussurro malicioso finalmente alcançou seus ouvidos. Está perdido, homenzinho? O susto o fez quase pular e ofegar, involuntariamente. Um segundo arrepio pelo corpo inteiro e suas pernas fraquejaram por um instante. Risadas debochadas se seguiram, encheram o ar de um conteúdo macabro. Nessa hora a razão, ou o que lhe restara dela, o abandonou por completo. O pupilo quis correr, mas as pedras e os espinhos feriram os seus pés e fizeram-no tropeçar. No chão, as risadas e os sussurros tenebrosos encheram mais os seus ouvidos, não conseguia entender as palavras, mas sentia a troça, a zombaria, o perigo.

Um mar de desespero e pavor o submergiram. “Então este é o inferno!”, ele soube com amargura.

Um ódio diabólico como uma tempestade preencheu o seu peito contra o seu Mestre. Por que não o matou? Devia tê-lo feito e abandonado seu corpo aos corvos em vez de confiar nele.

Apertou os ouvidos e gritou.

Em seu desespero conseguiu se levantar e então correu novamente, tomando o caminho de volta para a ponte. As mãos ainda nos ouvidos, ainda gritando. Lacerando o pés nas pedras e espinhos do chão. Seu rosto, braços e pernas também se ferindo, pois quanto mais avançava mais os espinhos de cada lado da estrada se fechavam sobre ele, muitos prendendo-se ao seu corpo como pequenas estacas. Crescia no homem a impressão de que a cerca de espinhos não o permitiria retroceder, mas cercas de espinhos não costumam ter vontade própria.

Algo, entretanto, o fez parar. Um som perturbador. Um grito de dor e lamento. Alguém estava chorando. Uma criança? Os gemidos pareciam brotar de dentro da sua cabeça, e era provável que fosse esse o caso, pois tinha os ouvidos tampados, não devia ouvir. Tentou ignorar. Provavelmente tratava-se de um truque do que quer que estivesse escondido em meio ao escuro. Avançou alguns passos e o choro ficou mais longe, mais tênue. Mas o tom de desespero naquela lamúria penosa não diminuía, e aquilo apertou o coração do pupilo.

Parecia um choro de criança. E se fosse uma criança teria de salvá-la. Era o certo a fazer, não era? O homem é escravo de sua consciência. Desde que tenha uma. Mas se fosse uma armadilha... não era capaz de imaginar o quão estaria perdido, e nesse caso, quem o salvaria? Além disso, pela direção do som ela devia estar entre os arbustos de espinhos. Voltou alguns passos, onde podia ouvir melhor o choro. “Neste mundo”, tentou convencer a si mesmo, “é cada um por si”. Quando ele havia precisado de ajuda ninguém viera lhe socorrer. Ninguém viera lhe perguntar como ele estava. Ninguém. Somente o desespero o acolhera e o envolvera em seu abraço duro. Os vultos ainda dançando por toda a parte, espalhando a frieza do medo. Suas pernas e mãos tremiam. A força que fazia para respirar era inumana. Sua decisão, apesar de tudo, estava tomada...

Fechou os olhos e mergulhou na mata de espinhos.

Caminhos de Céu e InfernoNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ