capítulo-46

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Minha cabeça latejava, acordei em meu quarto, não era capaz de mover um músculo sequer, alguém passava um pano molhado em minha cabeça:

- Então você acordou- fala uma voz que não consigo identificar, pois meus ouvidos estão dormentes- finalmente.

Sinto alguém me abraçando, isso me trás calma, mas não consigo retribuir, minha boca está seca, e os lábios rachados, me impedindo de falar, ele levanta meu queixo e põe um copo de água, que bebo rapidamente:

- O que aconteceu?- pergunto com dificuldade, a voz rouca.

- Você não se lembra?

Então ele coloca o rosto acima do meu e posso reconhece-lo, meu irmão, seu rosto triste me trás a memória vívida, o fogo, os soldados de cinzas... sinto algo quente escorrendo por meu rosto, lágrimas, ele as limpa com as costas da não:

- Eles morreram?

Ele assente:

- Will?

- Ele está se recuperando bem, conseguiu sair antes que o fogo se alastrasse, mas você, foi encontrado no meio das chamas... como sobreviveu?

- Por que eu...- não posso, não posso contar a ele o que fiz- foi culpa minha.

Ele passa as mãos pelo meu cabelo:

- Não foi.

- Foi sim, eu criei o fogo, não sei como, mas fui eu.

De olhos arregalados ele se levanta:

- É você então?

- O que?- falo sem entender.

Mas minha mente fica enevoada, e caio novamente na escuridão.

Volto a abrir os olhos, mas dessa vez já consigo me mexer, tem alguém no quarto, me sento na cama com dificuldade, e me surpreendo, é uma garota, de cabelos brancos, longos e soltos, e um vestido prateado até os joelhos, com os ombros a mostra, quando ela se vira para mim, reconheço rapidamente seus olhos:

- Você estava lá- falo ainda com a voz falhando- quem é você?

Ela vem andando, até a cama e se senta, coloca as mãos em meu peito me fazendo deitar novamente:

- Você precisa descansar.

- Mas...

- Silêncio.

Fico quieto:

- Você saberá muito em breve- fala- mas agora descanse, você tem um longo dia amanhã.

Então põe a mão em minha cabeça e adormeço.

Acordo de novo, dessa vez, me sinto ativo, posso me mexer, levanto da cama, minhas pernas doem, mas não muito, ando me apoiando nos móveis até o banheiro e tomo um banho, meu corpo não tem queimaduras, apenas cortes grandes nas costas, que incrivelmente já cicatrizaram, imagens voltam a assombrar minha mente, ponho uma calça e blusa preta, e um casaco, para esconder alguns nos braços, caminho pelo palácio, não encontro ninguém, preciso de ar, saio para o jardim, sento no banco de pedra e minha cabeça pende para trás, relaxo, mas não totalmente, flashes do acontecido voltam, se repetindo como um filme perturbador, então sinto um baque enorme no rosto e caio no chão, levando a mão a bochecha, sangue escorre pela minha boca, ergo os olhos, são guardas, um deles está balançando o punho, Nervan:

- Foi sua culpa não é?- fala se aproximando com raiva.

Limpo o rosto e tento levantar, mas outro deles me dá um chute nas costas:

- Não!- completa ele me puxando pela gola da camisa e me pondo de pé- deixe ele comigo.

Ele segura a faca na altura do meu abdômen, e faz um longo corte, continuo de boca fechada o encarando, mas sinto uma dor lacinante no peito, dou-lhe um soco na barriga e ele me solta a apertando:

- Não foi culpa minha- falo segurando o corte.

- Você...- ele fala voltando para cima- me enoja.

Sinto o sangue ferver, dou-lhe outro soco, brigamos, socos e chutes, mas a raiva que estou sentindo me dá combustível, ele está cansado, faço um em seu braço, mas não quero parar, não depois do quê ele disse, seguro a gola de sua camisa com seu rosto próximo do meu, ele está acabado, mas está sorrindo:

- Assasino.

Então observo seu rosto e vejo o que estou fazendo, o solto, olhando minhas mãos:

- Não sou um assassino.

Não espero para ver o que vai acontecer, saio, volto para o quarto de onde não deveria ter saído, mas quando abro a porta, vejo novamente a garota sentada em minha cama, ela arregala os olhos para o enorme corte em meu peito, que agora fora dá adrenalina queima, ela se levanta e me ajuda a caminhar de volta para a cama:

- O que aconteceu?- ela pergunta.

- Eu não te conheço- respondo- qual é seu nome?, quem é você?

Ela me dá um sorriso tímido e começa a limpar o corte, com um pano molhado que surgiu do nada, tirando água de uma bacia igualmente estranha:

- Meu nome é Fushia- começa- eu sou uma fada, mas não exatamente... bom tenho poderes, e te tirei daquele lugar horrível, mas infelizmente não pude salvar seus outros Amigos.

Assinto triste:

- Obrigado.

Ela acaba de limpar o corte, e começa a costura-lo, quase não sinto nada, fico observando seus olhos azuis com os cílios longos, ela levanta a cabeça e me pega olhando, coro, ela fica me encarando, então arrasta uma mecha do cabelo para trás, e aproxima seu rosto do meu, e me beija, fico estático sem saber o que fazer, então seguro sua cintura e a puxo para perto, fico dormente, não estou feliz, estou entorpecido, toda tristeza, toda a raiva some, e é disso que eu preciso agora.
Ficamos nos encontrando por dias, e seus beijos me ajudam a suportar a dor, mas sempre que ela vai embora ela volta, ainda mais forte, e a cada dia me sinto menos...vivo.
É noite, hoje marcamos de nos ver no jardim, a espero deitado na grama, ela aparece das árvores, dessa vez com um vestido branco cintilante, ela parece séria, se aproxima e se deita ao meu lado apoiando sua cabeça em meu ombro, a abraço:

- Cheguei.

- Que bom.

- Precisamos conversar.

- O que aconteceu?- pergunto me virando apoiado no chão.

Ela me beija de novo, mas dessa vez, tenho uma visão, uma lembrança:

Não é uma lembrança minha, não está embaçada, está vívida como se estivesse acontecendo agora, mas me vejo nela, desacordado, caído em frente a árvore, com chamas saindo de minhas mãos, sou outra pessoa, a quê está controlando os monstros de cinzas das sombras, sem quê ninguém me veja...

Abro os olhos, sinto o sangue ferver:

- FOI VOCÊ!- acuso me afastando bruscamente.

- Eu...-ela começa se aproximando.

- Se afaste de mim- falo com o peito doendo, caio de joelhos arfando.

- Tão jovem- ela fala- com a vida destruída.

- O que?

- Seu coração está doendo não é?- fala colocando a mão em meu peito- vai ficar assim, sempre que você sentir uma emoção muito forte, amor, raiva, tristeza, a menos que você me deixe...

- Não- falo decidido- não quero nada de você.

- Então é melhor não gostar de ninguém além de mim, ou esse pobre coração, não vai suportar a adrenalina.

Ela some, tudo ao redor começa a esmorecer:

"Jason eu preciso de você, você tem que acordar, por favor, ACORDA!"

1- Crônicas Elementares - Água E FogoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora