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Eu não ligo se isso machuca,
Eu quero ter controle.
(Creep - Radiohead)
2016
Will

A Heaven era uma boa professora, no final das contas. Posso ser rancoroso, mas não minto sobre isso. Ela me ajudou a recuperar a nota com duas aulas, e pude dispensa-la. Juro que ouvi um suspiro de alívio sair da boca dela quando anunciei isso. Fiquei aliviado por não encontrar aquele tom de violeta mais... isso é, até o primeiro baile do ano letivo chegar.

Eu odiava esses bailes, mas o professor de sociologia sempre pedia um trabalho sobre algum comportamento de um terceiro nesses eventos, e pela matéria ser indispensável para a Pedagogia que eu queria fazer na faculdade, eu tinha que participar.

— Como estou? — perguntei pra Talita, que estourou um chiclete antes de responder:

— Estranho.

Isso significa bonito pra ela. Depois de ter o visual aprovado pelo meu pai e sofrer com as fotos infinitas da minha mãe sob a velha desculpa de "é o que os seus filhos e netos vão ver, sorria", consegui finalmente alcançar o carro sem ouvir outro "só mais uma, Will". De uma em uma, teríamos álbuns completos de fotos iguais.

Cheguei no ginásio lotado animado com as músicas, e sentei na mesa do time, só assistindo a diversão para saber o que colocar no trabalho.

— Vocês não vão dançar? — a Brittainy perguntou ao chegar e nos encontrar todos todos sentados.

— Com quem? Não temos par. — lamuriei.

Ficar sentado observando todos era normal pra mim em qualquer lugar que eu ia. Me enturmar não era a melhor opção, mas ainda bem que o Victor resolveu agradar a halfback, e tirar do rosto dela aquele olhar de cachorrinho triste que estava me tentando a dançar com ela. Surpreendendo a todos, o Zack levantou e foi até eles, roubando o par do kicker.

— Não dou seis meses para eles serem um casal. — o Tim falou.

— Seis? Eu dou três e olhe lá. — o Victor opinou, já na mesa.

Todos ficamos observando os dois como os fuxiqueiros que somos, e especulamos quanto tempo demoraria para eles serem namorados. Chegamos à média de quatro meses e fingimos que estávamos entediados quando o capitão voltou à mesa.

— Certo, qual foi a merda que vocês fizeram dessa vez para todos estarem calados? — ele perguntou desconfiado.

— Nada. Só estamos admirando a beleza que é a atmosfera humana, o movimento corpóreo ritmado às batidas suaves da música, e, claro, os sorrisos de felicidade. Você não ama a felicidade, capitão? — o Tim fingiu.

— Amo quando meus jogadores são honestos comigo, Timothy, e usar palavras diferentes não vai me ludibriar com a mentira.

Não demorou muito para a Brittainy descobrir que tinha sido vítima do que chamo de fraude da rainha, nada mais que um golpe das concorrentes de sempre à rainha do baile para ganharem sempre. Elas inscrevem garotas que acham que não vão vencer para a competição ter gente suficiente e assim elas levarem a coroa. Me uni ao time na votação a favor da nossa jogadora, me aventurando no frio de outubro fora do ginásio. Voltar pra dentro depois de ter exercido meu direito de jurado foi um abraço quentinho sem braços me apertando.

Isso é, até alguém agarrar minha mão firme.

— Will, me ajuda.

— Em quê, Heaven? Para onde estamos indo?

Para alguém tão pequena a garota tinha força, e me puxou até a pista de dança, rebolando no ritmo da música antes de responder:

— Você é o primeiro que achei e não diria não. Por favor, não diga não. Eu terminei com o meu namorado e ele não aceitou isso muito bem, então veio tirar satisfações pessoalmente. Ele veio da Califórnia pra cá só pra conversar comigo, é inacreditável a audácia dele. Alguém tem que ser meu escudo contra ele, e, me desculpa, foi você.

— Ele te machucou fisicamente? — ela negou — Psicologicamente? — novamente não — Por qual motivo você não pode conversar com ele, então?

Eu não queria ser advogado do Diabo, mas não seria a peça extra no relacionamento de alguém. Posso ser burro para literatura, mas quando se trata de ser a peça sem encaixe de um quebra-cabeças eu sei lidar muito bem.

— Porque ele quer me controlar. Sei que, se eu ouvi-lo agora, ele vai sair vitorioso me tendo de volta tão rápido. Ele não quer que eu conviva com os garotos do time. — explicou nervosa.

— Eu sou do time, se você esqueceu.

— Sim, você foi o motivo principal da discussão. Ai merda, ele está vindo, o que eu faço?

Abri a boca pra perguntar por que eles estavam discutindo sobre mim, mas ela foi mais rápida: se pendurou no meu pescoço e escondeu o rosto me beijando. Afastei-a quando consegui.

— Escuta aqui, eu não sou seu brinquedo. Você não pode escrever matérias tendenciosas sobre mim, e não pode me usar contra quem quer que seja sem que eu permita. Não quero que você encoste em mim mais. Finja que tenho sarna, peste bulbônica, ou outra coisa do tipo. — mas não brinque com meus sentimentos, quis completar.

Por mais que eu finja que não, me sinto atraído por ela e pela inteligência infindável que ela tem, apesar dos olhos terem o tom exato da minha maior dor. Mas é hora de deixar o masoquismo de lado e abandonar essa atração por quem só me machuca. Pela minha sanidade mental, eu preciso segurar essa garota longe, custe o que custar. Não importa se o beijo dela tem gosto de bala de menta ou hortelã. Importa muito menos se ela cheira como canela, e canela é meu condimento preferido. Caramba, nem mesmo a sensação do peito dela contra o meu importa.

Nada disso importa.

Deixei toda a confusão dela pra trás, largando-a com o imbecil da Califórnia. Não teria problema para escrever sobre o egoísmo humano para sociologia. Já tinha provas o suficiente dele de uma pessoa só, me restava saber o que mais ela faria para me prejudicar.

Ou, no caso, o quanto eu a machucaria para me proteger. Não queria me tornar o monstro da história, mas foi o que aconteceu, numa tentativa descompensada de fazer desse sabor de bala na minha boca apenas uma lembrança. Se é desviando dos adversários que ela joga, vou mostrar o que um cornerback faz para vencer.

Derrubamos quem aparece na frente.

Amor Falso - Série Endzone - Livro 3Where stories live. Discover now