Capítulo 10 - Carne Seca. Parte II

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Aquela sensação de dormência na língua, garganta seca e que tudo era muito maior que ele

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Aquela sensação de dormência na língua, garganta seca e que tudo era muito maior que ele. Sobressaltado, Tonto despertou de maneira que ficou difícil recuperar o fôlego que seus pulmões tanto imploravam. Mas, finalmente estava desperto. Ao final, não sabia quantas horas passou adormecido, poderia ter sido uma eternidade, pois seu corpo estava vívido, ou apenas alguns minutos.

Quando sentiu o calor do sol arder em sua pele, foi como se pequenos beliscões estivessem o alertando de que o perigo estava em seu encalço. Ele levantou, amarrou a bolsa junto a cintura e procurou uma direção para a qual deveria seguir.

Goque!

As palavras ditas por ele estavam fixas em sua memória e Tonto sabia que não deveria custar em atravessar a floresta. Então correu. Em certo momento, desviando das raízes das árvores ou de pedras pontiagudas, ele teve a sensação de estar indo em direção aos Bobo-cuias, pois a cantiga estava se tornando algo tangível, uma coisa que poderia ser tocada e que crescia em seu estômago.

Sua garganta estava ardendo, seus pulmões doíam, mas ele não queria parar, e não queria olhar para trás por puro medo de por um azar maior, ver aquelas máscaras e todos os seus pesadelos. E impulsionado por esse medo, Tonto corria com mais rapidez, até que parou. Algumas marcas no chão lhe chamaram a atenção: rastro de um trenó, que havia sido arrastado por um longo caminho e que alongava floresta adentro. Sem saber para qual direção ele ia ou vinha, Tonto voltou a correr partindo na direção contrária, se distanciando daquela sensação de pavor. Seu Sinibio começava a brilhar forte a cada passo largo que deixava para trás, mas ele não podia dar atenção a isso.

Correu muito mais, suas bochechas estavam ruborizadas e seu suor molhava sua camisa.

Enquanto seus pés mal tocavam o chão, ele podia ver em sua mente, toda a razão pela qual estava correndo: via a face bela e serena de Margarida, os olhos sábios de Rencor e recordou a sensação que sentia quando ele colocava sua mão sobre sua cabeça. Via também o campo de girassóis, os problemas em seu vale; os anciões e toda aquela rebelião em sua casa. Via os Bobo-cuias esticando suas mãos para agarrá-lo e foi nesse momento que ele fechou os olhos enquanto corria, e sentiu algo realmente tocar-lhe nas costas. Apavorado, Tonto perdeu o equilíbrio ao pisar em algumas pedras escorregadias e caiu. Ao olhar para trás, notou que não passava de um galho de uma árvore, não havia vestígio de Bobo-cuias por ali.

Ele levantou, com as pernas a tremerem tanto que sentiu muita dificuldade em ficar de pé. Seu joelho estava ralado e uma pequena linha de sangue começava a escorrer dali, e também havia sangue em suas duas mãos que estavam com escoriações leves nas palmas.

— Ótimo! Imagine se eles estivessem mesmo atrás de mim! — ele bravejou irritado, olhando com certo nojo para o próprio sangue.
A essa altura, ele já deveria ter certa habilidade em correr, pois era o que mais havia feito nos últimos dias e talvez faria por mais tempo. O problema não era exatamente esse, aquelas pedras eram realmente escorregadias e cheias de lodo e musgo. Quando finalmente se recuperou da queda, sentindo dores no traseiro, ele caminhou na direção em que corria, percebendo que as pedras ficavam cada vez mais úmidas. E logo atrás de um monte de arbustos, ele encontrou um pequeno fragmento do céu em forma de lago.

O Inventor de EstaçõesOnde histórias criam vida. Descubra agora