Capítulo 2

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— Onde diabos você estava? Já estamos sem lenha — reclamou, mexendo furiosamente na panela grande.

Uns fios loiros escaparam de sua trança transversal. Sua boca pintada de vermelho escarlate estava levemente puxada para baixo.

Seus olhos castanhos claros se desviaram do caldo de porco com cebolas queimado e ela me analisou. Toda vez parecia que ela via algo nostálgico em meu rosto e ficava com raiva e com uma veia pulsando na sua testa, já marcada de tanto franzi-la.

Entrei deixando as botas na soleira da porta.

— Feche logo essa maldita porta, está frio — grunhido, Joseph Swan falou sentado no velho sofá. Com os pés com meias desiguais furadas apoiados na mesinha de vidro bebericando uma garrafa de cerveja. Os cabelos brancos eram visíveis se você prestasse muita atenção, já que os fios loiros encobriam bem sua idade.

Lembro dos dias dos quais algumas mulheres da minha aldeia invejavam Eleonora pelo homem belo que ela tinha, agora tinham pena de ambos.

A casa cheirava a álcool graças a ele, que torrava todo o dinheiro ganho trabalhando como um faz-tudo. Sua barriga redonda era o resultado de anos de cerveja barata.

A fechei rapidamente reparando que suas roupas estavam sujas de cinzas de lareira.

— E a lenha? — questionou, Eleonora.

— Onde está Mathias? — perguntei sem esconder meu desagrado.

— Meu lindo filho está descansando do trabalho pesado que arrumou. Diferente de você, ele ajuda essa família — disse voltando a mexer na panela.

Nossa casa era uma das mais velhas pelo fato de que nenhum dos três se importavam o suficiente para arruma-la. Eu tentei deixar o ambiente mais aconchegante, gastando minhas economias de trabalhos escondidos de pintora que fazia pela aldeia.

Tentei consertar a madeira das escadas, tentei pintar as paredes, mas nada bastava. Nada agradava, depois de um tempo acabei percebendo que eu não agradava.

Apertei o punho.

Como se pintar uma casa e depois trepar com a dona fosse algo muito complicado para ele. Talvez o último, para Mathias, fosse.

— Vocês são barulhentas — resmungou, Joseph. — Quero apreciar o silêncio.

— Sinto muito, querido — falou Eleonora de modo afável e se virou para mim. — O que ainda faz aqui? — questionou levantando a sobrancelha loira perfeita.

— Às vezes me faço essa pergunta — falei baixo demais para ela ouvir e coloquei as botas saindo novamente.

Quando estou lá fora consegui ouvir as queixas de Joseph e sabia que era melhor demorar a pegar a lenha, afinal quando eles começavam a brigar a culpa era sempre descontada em mim.

Caminhando até os fundos da casa vejo algumas madeiras jogadas e as lembranças nostálgicas de dias nos quais eu fingia que éramos uma família feliz me invadem. Naquela época eu chama Joseph de pai e ele ensinava a mim e a Mathias a usar espadas improvisadas de madeira, ele não tinha começado seu vício, ainda era um homem decente, quase um guerreiro ao nos ensinar a manejar a espada.

Não lembrava quando começou a chegar em casa carregado pelos amigos meio sóbrios das tabernas, mas desde então nunca mais sorria para ninguém, não voltou a brincar comigo e com Mathias. Só vivia para se entregar ao álcool, entretanto ultimamente ele vinha chegando em casa tarde, mas não cheirando a álcool e sim a perfume.

Com quem meus pais se relacionavam não era da minha conta e sim em quem eles descontavam a raiva.

Peguei o machado ao lado das espadas e fui em direção as árvores, nossa casa fazia limite com os arredores da floresta que depois de mais de cinco horas andando você chegava a uma outra aldeia, muito maior e com mais vida que a minha.

Princesa de VidroWhere stories live. Discover now