Três

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(Sem revisão, amores)

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Valentim Del Torre

Mariana estava com os braços estendidos para cima da cabeça, sua postura ereta e perfeita alucinava as meninas que assistiam, o queixo e o nariz mantinham-se empinados enquanto seu corpo se movia harmonicamente. Seus passos eram simétricos e profissionais no ritmo lento da melodia. Ela fez uma demonstração rápida e então começou a ensinar a postura para as minhas pequenas pacientes que, prestavam atenção muito empolgadas. 

  — Isso, muito bem! Mantenha o rosto assim— Mariana apoiou o queixo de uma delas com o indicador — Agora um, dois, três...— foi contando à medida que abaixava flexionando as pernas e levantava na ponta de suas sapatilhas.

Sua gargalhada tornava-se uma música muito mais apreciável para os meus ouvidos. Ignorei a melódica canção que as meninas dançavam e foquei no som que vinha da sua garganta. Ela se divertia genuinamente com aquilo, e não era diferente para as suas mais novas alunas. 

As crianças estavam debilitadas e Mariana entendia isso, mas não deixava transparecer dó ou qualquer sentimento parecido. Elas seguiam as coordenadas dentro de seus limites, segurando no corrimão instalado ali especificamente para a oficina de dança, que após dois dias de insistência por parte da companhia eu acabei cedendo, ainda mais quando soube que a professora seria ela. 

Desde o episódio em que minha esposa apareceu inconvenientemente, eu não havia trocado uma palavra com Mariana. Tinha repensado em tudo e concluído que isso era o melhor a fazer. Afinal, era casado e totalmente contra traições. Em contrapartida, minha mente não obedecia e se envolvia em sonhos com a dançarina de balé, isso eu não podia controlar. 

Sua mãe assistia, e o  filho de uma puta do Álvaro também, ele a admirava com o queixo caído, por pouco não fiz o favor de levar um babador para o imbecil, mas optei por sair dali, tentando fugir do desconforto que a distância entre eu e ela me fazia sentir. 

O dia de trabalho não rendeu. Estava lá desde a madrugada de plantão, rasguei algumas receitas que prescrevi erroneamente por puro descuido. Refiz e quando terminei me dei conta de que não aguentaria mais uma hora sequer no hospital. Precisava descansar e por minha cabeça no eixo. Antes de ir embora peguei o número de Mariana no sistema do hospital, sem nada planejado.

Fui para meu apartamento após o almoço, agradeci mentalmente quando vi que Vivian não estava. Fui direto para o banho, coloquei um moletom e me aconcheguei na cama. Quem pensou que eu ia enfim descansar, se enganou. Na minha mente só vinha os cabelos loiros compridos, a boca rosa e carnuda, os olhos tão cintilantes capazes de cegar, o corpo desenhado milimetricamente e o mais importante, o jeito autêntico que só ela tinha. 

Acordei pouco antes do jantar. Ajudei Vivian a nos servir e sentei na ilha da cozinha ao lado dela. O barulho dos talheres me perturbava há anos, assim como o seu perfume e sua presença. O infeliz silêncio atormentava minha cabeça de uma forma agoniante. Suas perguntas descabidas e sem nexo me irritavam a ponto de eu perder a fome. 

Princípio Vital DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now