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— Então você é a senhorita Samyra — disse, o diretor, encarando-me. Ele estava sentado em uma poltrona atrás da enorme mesa de madeira e sorria um pouco, mas sem mostrar os dentes. — Seus pais me falaram muitas coisas boas sobre você. No começo, achei que era tudo para me impressionar e deixá-la adentrar faculdade, apesar de estar dois meses atrasada, mas quando vi suas notas no ensino médio... confesso que me surpreendi.

— Fui a melhor da sala durante anos — disse, sem me deixar abalar. Dois dias antes de confirmar que mamãe havia me deixado ir para faculdade, tinha descoberto por meu pai que o diretor, seu amigo, havia me dado um desconto de cinquenta por cento, por conta das minhas ótimas notas.

— O que me deixa mais intrigado é exatamente isso. Você é uma garota inteligente, então por que passou três anos desperdiçando seu tempo por aí? Por que não entrou logo em uma universidade?

Porque eu estava sendo vigiada, quis responder. Porque estavam tentando descobrir se eu era um problema para a sociedade eu somente a mim mesma. Porque não confiavam em mim.

— Acho que sua pergunta, por si só, já possui uma resposta. Eu estava perdendo tempo — falei. — Mas agora estou pronta para recuperá-lo.

— Ótimo — ele sorriu. — É realmente ótimo escutar algo assim de uma garota tão jovem como você. Se todos os alunos fossem assim... bem, seja bem vinda, Samyra. Espero que goste do local.

— Eu digo o mesmo — sorri de volta, despedindo-me do diretor.

Diferente do que eu achava que iria ser, quando aquele garoto calmo e meio tímido falou comigo e me informou que o diretor estava me chamando, a conversa foi até tranquila. Tranquila até demais.

Me levantando da cadeira, caminhei até a porta e peguei minhas malas, que me esperavam ansiosamente. Estava prestes a sair da sala, quando notei que havia deixado algo  passar despercebido. Compreensível. Ele estava sendo compreensível demais.

— Diretor? — perguntei, voltando a encará-lo.

— Pois não?

— O senhor já sabe, não sabe?

O diretor me lançou um olhar compreensível. Aquilo por si só confirmou o que eu tanto temia: ele sabia. Ele iria me vigiar. Todos iriam me vigiar. E, novamente, eu não poderia ir fundo no meu plano. Não poderia ter minha última tentativa concluída. Isso me desesperou. Todavia, apenas me mantive calma, até que ele disse:

— Não irei contar a ninguém. Ah, não se esqueça, suas consultas são às terças e sextas. Ou seja, amanhã você precisará encontrar seu novo psicólogo.

Internamente, desejei morrer naquele mesmo momento. No entanto, apenas acenei e sorri.

— Tudo bem. Obrigada por isso.

— Por nada.

Uma criatura alta estava parada ao lado da porta do diretor quando saí da sala, completamente desnorteada. Ele sabia. Céus, que droga, ele realmente sabia!

— Samyra? — a voz perguntou.

Olhando para o lado, o garoto de antes ainda segurava sua agenda de forma protetora.

— Sabe, agora que notei, qual é o seu nome mesmo? Você não me disse naquela hora.

— Ah, desculpe pela falta de educação, acho que eu estava um pouco nervoso. Meu nome é Kim Yugyeom.

— Legal. Bem, Yugyeom, por que você tá parado aí sozinho?

— Eu estava esperando você.

— Oh, sério? — cruzei meus braços. — Por que?

— O diretor pediu que eu mostrasse os arredores da universidade.

— Um tour particular?

— Digamos que sim — Yugyeom sorriu. De certa forma, sua atitude tímida deixando-o um pouco fofo. — Mas primeiro acho melhor mostrar onde fica o dormitório feminino. Andar com essas coisas de lá para cá deve ser cansativo — ele apontou para minhas malas.

— Você nem tem ideia do quanto.

— Na verdade, tenho sim. Eu já fui um calouro também.

— Falando nisso... o que você cursa?

— Física.

Fiz uma pequena careta involuntária.

— Credo.

Não parecendo estar muito surpreso com minha reação, ele perguntou:

— E você? O que irá cursar?

— Artes plásticas.

— Então você é de humanas.

— Totalmente humanas.

— Agora sim, meio  sua careta engraçada faz mais sentido — disse, Yugyeom, com uma pequena gargalhada.

Nós começamos a caminhar para fora da universidade e novamente, analisei ao redor. De fato, até que poderia ser suportável. Até que poderia ser legal. Eu só precisaria ser mais esperta em relação ao meu diretor e novo psicólogo. Eu só deveria demonstrar que estava bem. Ou melhor, neutra.

— Aquele é nosso alojamento? — perguntei. Do lado esquerdo da universidade, um pouco mais afastado e perto de uma enorme floresta, dois prédios consideravelmente grandes encontravam-se um ao lado do outro.

— Sim — respondeu, Yugyeom. — Direito feminino, esquerdo masculino. O toque de recolher são às onze horas e se você chegar um minuto a mais, não conseguirá entrar pois as portas estarão, muito possivelmente, trancadas.

— Isso é um pouco amedrontador — falei, fingindo estar sentindo calafrios.

— Apenas um pequeno incentivo para os estudantes voltarem para casa cedo — ele deu de ombros.

"Casa", murmurei, mentalmente. Nós estávamos em qualquer lugar do mundo nesse momento, menos em casa.

— O que acontece se você não chegar no horário?

— Normalmente, eles anotam esse acontecimento e conversam com você. Perguntam o motivo. Pedem para isso não se repetir mais, visto que, se vocês possuem um dormitório, não tem necessidade de passar á noite dormindo em qualquer outro lugar.

— Isso não soa muito chato não?

— Na verdade, até que faz sentido. Digo, se você queria estar por aí, por que escolheu vir para um dormitório? Poderia simplesmente alugar um apartamento ou coisa do tipo. Além disso, nos, estudantes que moramos no alojamentos, meio que somos responsabilidade  da universidade. Se qualquer coisa acontecer conosco, eles que precisam se responsabilizar.

— Oh...

— Agora tudo faz sentindo?

— Sim. Agora tudo está claro — respondi, acenando.

— Bem, aqui está o mapa do lugar — Yugyeom retirou de sua agenda preta um pequeno mapa com mais algumas informações adicionais e sorriu. — Na outra folha, atrás, tem o número do seu quarto. Não sei se você terá uma colega de quarto ou não, mas boa sorte.

— Pensei que você fosse me mostrar ao redor.

— Eu vou. Mas agora... — ele encarou o relógio em seu pulso direito. — Agora eu tenho aula. Se não chegar na sala em cinco minutos irei me atrasar. Podemos nos falar às 15:00h? Eu posso te pagar um lanche.

Revirando meus olhos, disse:

— Tudo bem. Até às 15:00h.

— Até! — falou, dando meio volta e começando a correr de um modo ágil, mas meio engraçado.

Sorrindo, não conseguir deixar de pensar que talvez, ele disse uma boa companhia. Que talvez, ele disse realmente legal. Ou talvez ele apenas se comportasse do mesmo modo com todas as pessoas.

— Que seja — disse, caminhando em direção ao prédio. Meu maior objetivo agora era encontrar meu quarto e ter a dádiva de não possuir uma colega de quarto.

The last goodbye ❄️ Jackson WangOnde histórias criam vida. Descubra agora