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Encarando a folha em minha mão, eu estava parada em frente ao quarto de número 100, no último andar do prédio gigantesco. Yugyeom me falou que os quartos inabitados geralmente ficavam abertos, então se eu empurrasse a maçaneta e ele se abrisse... isso significava que eu estava sozinha. Isso significava que eu ao menos poderia ter minha privacidade a noite. Mas... e se por acaso isso não ocorresse? E se quando eu tentasse abrir, fosse impedida por uma chave do outro lado? Pensar na possibilidade de passar vários dias da minha vida com alguém dividindo o mesmo espaço que eu soava torturante demais.

— Apenas abra a porta. Ficar parada não irá mudar nada — comentei, segurando a maçaneta.

Respirando, contei até três e girei. A porta se abriu instantemente, me fazendo sorrir, mas esse sorriso logo foi substituído por frustração, quando uma garota virou-se para mim, confusa. Ela estava segurando seu celular e parecia falar com alguém, pois sua atenção logo voltou-se para a janela outra vez quando ela atendeu o telefone e disse, ao sentar-se na cama:

— Para de mentir! Droga, eu vi o vídeo! Eu sei que foi você, seu filho da puta desgraçado!

— Wow — comentei, adentrando o quarto, mas ela não me notou. Ou melhor, me ignorou.

Seus olhos encaravam a escrivaninha ao lado da sua cama, onde alguns livros bagunçados e um pequeno porta retrato marrom  encontravam-se parados. Olhei o retrato. Nele, a garota sorria enquanto levantava seus braços para cima e esperava ser abraçada por um cara forte e um pouco musculoso. Babaca, pensei, voltando a encará-la. Provavelmente estivesse falando com ele nesse exato momento.

— Por acaso você quer me fazer de otária, Mason? — perguntou para o cara do celular, soltando uma risada esquisita. — Vai se ferrar, seu idiota. Eu estava no quarto naquela noite!

Embora eu não estivesse interessada na situação, era impossível não escutar, pois, além de eu estar agora dividindo meu quarto com ela, sua voz soava alta demais e nem mesmo um fone de ouvido seria capaz de me fazer cessar os gritos e murmúrios de dentro da minha mente. Por conta disso, fui em direção a minha cama e deitei uma das das malas lá, abrindo-a. Queria tomar um longo banho, pois me sentia extremamente cansada. Cansada dessa vida. Cansada das pessoas. Cansadas dos gritos, que estavam cada vez mais altos e realmente irritantes. Talvez, no banheiro do quarto, eu conseguisse um tempo sozinha. Um tempo para mim mesma e meus pensamentos.

Abri a bala, retirando de dentro um camisetão preto, uma calça jeans escura cintura alta, minhas roupas íntimas e uma toalha. Caminhei silenciosamente até o banheiro após pegar tudo o que precisava e me tranquei lá, olhando-me no espelho, que apesar de grande, estava manchado e com uns arranhões estranhos.

— Por que você é tão normal? — perguntei a mim mesma. Meus olhos castanhos escuros  completamente neutros, assim como toda a minha vida. — Por que não consegue sentir nada?

Sem resposta.

Ignorei a discussão que continuou por mais vinte minutos, antes de sair do banheiro já completamente vestida. Olhei ao redor. A garros de antes não estava mais no quarto, porém um post-it amarelo grudado na porta me chamou bastante atenção. Caminhei até lá enquanto secava longo cabelo preto.

"Desculpe pelo que aconteceu. Seja bem vinda. Preciso ir para aula então não teremos tempo de conversar agora, Samyra, mas quem sabe depois? Ah, antes que se surpreenda, mexi na sua carteira antes de sair e peguei algum dinheiro emprestado. É por isso que sei seu nome. Juro que devolvo depois.
Prazer, Layla."

— Uma colega de quarto ladra? — soltei uma risada incrédula e encarei minha cama, onde minha carteira encontrava-se completamente aberta e de qualquer jeito.

Tinha jogado-a em cima da mala quando fui tomar banho, então não a culpava por ter feito algo assim. Eu que tinha sido idiota por bobear. Eu que tinha sido idiota por deixar algo consideravelmente valioso como dinheiro à deriva de qualquer pessoa assim.

Uma hora foi o tempo que levei para arrumar todas as minhas coisas na metade do guarda roupa que por direito, era meu. Confesso que foi cansativo. Retirar as roupas e arrumá-las não era uma coisa que eu fazia com frequência quando estava em casa, mas agora eu meio que estava tentando mudar. Parecer estável.

Sai do quarto com o mapa que Yugyeom me entregou antes de ir para sua aula e meu celular. Queria conhecer melhor os arredores da universidade sozinha. Até porque, como eu estava percebendo, com passar do tempo, ficar sozinha iria ser o que eu menos iria conseguir fazer. Fui em quase todos os lugares. Sala de estudos, jogos, esportes, biblioteca, refeitório, mas o que realmente estava me chamando atenção em relação àquele lugar eram duas coisas: primeiro, a floresta. Segundo, a sala do meu novo psicólogo, que estava trancada. Que tipo de psicólogo não trabalhava em plena segunda feira? Digo, e se alguém precisasse falar com ele?

— Não vai durar três meses — disse, em frente à porta.

Nunca duravam. Nem mesmo quando eu tentava soar legal. Nem mesmo quando eu tentava me abrir. Nem mesmo quando eu apenas ficava quieta. Então eu sempre me perguntava, todas as vezes que era troca ou substituída: sou mesmo problemática? Qual o problema de querer morrer? Não é como se eu estivesse destruindo a vida deles, eu só quero acabar com a minha.

— O que não vai durar três meses? — uma voz perguntou ao meu lado,  surpreendendo-me.

Sem demonstrar muita coisa ou olhar em direção a voz masculina, eu disse:

— Esse psicólogo. Não vai durar nem três meses se continuar faltando seu trabalho assim. E se por acaso quiserem falar com ele? E se por acaso for um assunto urgente?

— Bem... digamos que ele não está faltando o trabalho. Na verdade, ele está trabalhando.

— Trabalhando na arte de se esconder?

— Trabalhando na arte da psicologia. Eu sou professor também. Dou aula nesta universidade e no tempo livre, consulto alguns pacientes. Quem é você?

Instantaneamente, pensei em mentir. Em não dizer meu verdadeiro nome e inventar alguma desculpa idiota e sem sentido algum para sair dali. Entretanto, que diferença iria fazer? Amanhã de manhã eu iria precisar passar aqui novamente para ele me conhecer mesmo. Para ele conhecer a Samyra Lovye.

— Sua nova paciente — falei, finalmente encarando-o.

Olhos intensos e um tanto vividos me observavam com atenção. Ele parecia um pouco jovem demais para ser psicólogo. Na verdade, um pouco jovem demais para ser qualquer coisa além de um estudante. Todavia, não parecia mentir. E eu sabia disso pois era uma ótima mentirosa.

Meu novo psicólogo ergueu uma sobrancelha antes de dizer:

— Nova paciente? Não tenho nenhuma... Oh,  então você é a Samyra? Samyra Lovye?

— Prazer. E você é?

— Jackson Wang. Doutor Jackson Wang — disse, erguendo uma de suas mão para um comprimento, porém apenas cruzei meus braços. — Sua primeira consulta é amanhã.

— Eu sei.

— Então por que está aqui hoje?

— Apenas de passagem.

— Entendo. Você quer comer alguma coisa? Conversar um pouco? Estou no meu horário de almoço.

— Não, obrigada. Na verdade, já estou de saída.

— Tem certeza? — insistiu.

— Sabe, se quer apenas flertar comigo, precisa fazer melhor.

— Eu não...

— Nos vemos amanhã, doutor. — disse, fazendo um sinal de escoteira e começando a andar com um pequeno sorriso nos lábios.

Três meses. Não iria durar nem três meses.

— Não se atrase! — ele gritou quando já estava prestes a dobrar o corredor.

— Pode deixar!

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pessoal, me desculpem qualquer errinho. só vou revisar quando concluir a fanfic, então um pouquinho de paciência. ❤️

The last goodbye ❄️ Jackson WangWhere stories live. Discover now