Capítulo 26: Lorena

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Quando a gente acha que a vida não pode ficar mais estranha, eis que o mundo te surpreende colocando testes perversos e nada gentis no meio do caminho.

Era exatamente assim que me sentia sentada naquela cadeira vendo os aparelhos respirarem pelo meu irmão. A vida de Diego estava intimamente ligada a um troço quadrado cheio de fios que apitava, me mostrando que ele ainda respirava. Se por acaso o apito demorasse um pouco mais, eu já levantava para verificar se o peito dele descia e subia.

Sei que o médico disse que ele iria sair dessa e ficar bem, mas Diego era a única coisa saudável que ainda me restava de família, então não podia contar com mais ninguém para me dizer isso, muito menos um médico. Médicos erram. Passam uma vida errando. O problema é que eles não podem errar em relação a Diego, e talvez por isso eu não tenha saído muito desse hospital, mesmo que minha intenção seja achar os covardes que fizeram isso com ele. Simplesmente não consigo sair daqui.

Prometi a Klaus que esperaria a polícia, e foi nesse lance de vinte e quatro horas sentada ao lado de Diego, que eu me apertei à ideia de que ele precisava de mim aqui, e não sendo uma vingadora.

Todos os dias o delegado Hunter vinha ao hospital para me dizer como andavam as investigações. Ainda nada dos caras, para variar, mas tinham umas pistas interessantes, as quais o delegado, por uma força obscura, esquecia quando estava próximo a mim. Ele não queria necessariamente me proteger, mas tentava proteger o filho, e eu não poderia culpá-lo por isso.

Minha turma de música também veio visitar. Trouxeram uma cesta enorme de lanche, que eu não toquei, e vários balões para enfeitar o quarto de Diego. Não gostava de ver ninguém quando eu estava tão quebrada, mas vê-los foi bem reconfortante para mim. Dominic sabia distrair e Adônis era o rei das piadas fora de hora. Samuel ficava em um canto isolado, lendo um livro e olhando para mim de um jeito preocupado. Era o olhar de Samuel que me fazia lembrar que eu só tinha dezesseis anos e que não precisava ser resistente o tempo inteiro. Então era a pessoa que eu menos encarava.

Klaus estava sempre por aqui. No primeiro dia ficou comigo direto, negando acompanhar o pai ou Adônis para casa. Ficávamos em silêncio na sala de espera olhando as pessoas que passavam apressadas e aflitas. Eu deitava na perna dele e dormia alguns minutos, mas tinha pesadelos terríveis e acordava no grito. Ele sempre estava lá para mim. Isso me confortava e me enchia de aflição também. Não queria precisar de Klaus para me sentir segura e, desesperadamente, eu precisava. Então, depois que o prazo de vinte e quatro horas que eu tinha dado a ele se encerrou, simplesmente olhei para o relógio da sala de espera e Klaus entendeu. Deu um beijo de leve na minha cabeça, apertou meus dedos e me olhou como se quisesse arrancar toda a dor de dentro de mim. Se ele soubesse que minha dor não caberia nem dentro do homem mais alto do mundo, ele não tentaria.

Klaus foi embora naquele dia, e desde então só vinha aqui pela manhã antes de ir para a escola. Trazia café para mim e para Marcos, depois ia embora. Eu tinha certeza de que ele estava procurando os caras por conta própria, e estava me sentindo mal por não estar ajudando-o, mas Diego precisava de mim aqui. Queria estar ao seu lado quando ele acordasse, e tenho certeza de que Klaus entendia. Uma das qualidades que mais amava nele era não precisar explicar as coisas para que ele me compreendesse.

O aparelho voltou a apitar e eu me espreguicei na cadeira. Estava com uma roupa de Rany, já que eu ainda não tinha ido em casa ainda, por medo do pastor. O delegado me disse que foi falar com meus pais, mas eles não quiseram saber de Diego. Então apenas comunicou que eu estava fazendo companhia a ele no hospital, e pelo o que Richard havia me dito, o pastor simplesmente desdenhou o fato.

Eu sabia que meu pai não viria me puxar pelos cabelos enquanto estivesse aqui, mas eu era inteligente o suficiente para saber que se pisasse em casa o pastor não me deixaria mais sair. Então eu tomava banho no hospital e vestia as roupas que Rany me trazia. Nesse momento eu estava com um vestido preto e a minha bota de cano curto. A jaqueta de Diego cobria meus ombros, me enchendo de paz com o cheiro dele.

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