Ferida não Cicatrizada

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Os raios do Sol adentram a janela, clareando o quarto real e despertando Sara para mais um belo dia em Alestia. Uma semana já havia se passado desde sua conferência com Cassis e da noite em que o vampiro simplesmente invadira seus sonhos, tempo suficiente para que engavetasse no fundo de sua mente a raiva que sentia por sua espécie e se acostumasse com sua presença, tolerando-o com mais facilidade do que nos seus primeiros dias de casada.

Vários rumores interessantes surgiram em Alestia desde a visita à Cidadela e Sara sentia-se feliz por serem todos positivos, mesmo que nenhum fosse realmente verdade. Naquela manhã, em especial, a princesa estava radiante, planejando um delicioso banquete para àquela noite a fim de mostrar ao rei o quanto estava se tornando sociável com o vampiro.

― Ele já acordou – pensa ela ao espreguiçar-se e ver a poltrona vazia –, como consegue despertar sempre tão cedo?

Sara se levanta às pressas, banhando-se como fazia todas as manhãs, esperando as criadas para vestir-se e arrumar os cabelos, podendo enfim seguir para o salão de banquetes onde o rei sempre a aguardava.

Qual não foi sua surpresa ao constatar que não havia ninguém à mesa do desjejum, apesar dela ainda estar posta. Seus lábios se abrem em perplexidade ao perceber que ninguém a havia esperado para a refeição. Ela não costumava acordar tarde, talvez seus cuidados femininos com o cabelo e o estado das roupas levasse certo tempo, mas nada que lhe rendesse uma demora tão grande a ponto de ser deixada para trás, como se sua companhia fosse dispensável.

Insatisfeita e já sentindo sua alegria brilhante se esvair, a princesa ergue o queixo e caminha a passos duros atrás de um sinal da realeza, ignorando a presença dos soldados e criados, parando somente ao chegar ao pátio do castelo, onde Cassis praticava suas técnicas de batalha com seu criador.

― Onde está o rei? – pergunta com voz alta e firme, interrompendo o treinamento dos vampiros sem ao menos prestar-lhes alguma reverência ou cumprimento.

― Sim, eu lhe dou licença, milady – comenta Cassis com certa impaciência, irritado o suficiente por não estar indo bem no treino, para lidar com os surtos mal-educados da mulher –, você não está atrapalhando.

― Que bom – responde com ironia, não se deixando abater pelas farpas que, apesar de menos frequentes, ainda existiam entre eles –, agora responda minha pergunta, sim?

― Sua majestade, o rei, decidiu visitar o médico da Cidadela, pois não se sentia bem. Não almejou convocá-lo ao castelo para não alarmá-la, então decidiu ir até ele, satisfeita?

― Muitíssimo! Desculpe-me por atrapalhá-lo, Sir Thorkus – pede a menina com educação, apanhando a saia do vestido e curvando o tronco em reverência –, prometo que este tipo de intromissão não voltará a acontecer, sei que seu aprendiz precisa de muito treino e educação. Vou deixá-los a sós, com licença.

O ancião coloca o punho fechado sobre o coração inerte, curvando-se e correspondendo a reverência que lhe fora feita. Retornando sua atenção para Cassis assim que a humana cruzou o batente da porta principal do palácio, encarando-o com semblante duro e reprobatório.

― O que fiz de errado dessa vez? – questiona Cassis, como uma criança que acredita nunca fazer nada de inconveniente.

― Ancillae arrogante! – repreende.

― Arrogante, eu? – retruca, abalado por ter sido rebaixado a "ancillae" pelo mesmo homem que o colocara como "príncipe". – Foi Sara quem nos interrompeu, desatando a falar sem pedir licença ou sequer cumprimentá-lo, parecia uma gralha descontrolada!

― Não interessa! – rosna evidentemente descontente. – Tu é que és o meu filho e não foi esta a doutrina que lhe dei, nem tampouco esta foi a ordem de seu clã. Agora que enfim começaram a se dar bem, resolve repeli-la?

Cassis (Série Alestia I)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora