A Descoberta

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Na manhã seguinte à coroação, Cassis se retira de seus aposentos antes do despertar de Sara, a fim de vasculhar a sala particular destinada ao rei, que agora pertencia a ele. É claro que o vampiro poderia tê-la procurado durante a noite, já que possuía horas vagas neste período, contudo, achou que seria bastante incômodo caminhar sozinho na escuridão do castelo e alarmar os pobres soldados humanos, que montavam guarda todas as madrugadas e que ainda desconheciam o fato de vampiros simplesmente não dormirem.

O não-vivo caminha pacientemente até a sala de conferências, adentrando o cômodo e analisando com atenção toda a sua extensão, observando a grande mesa de mogno e as cadeiras feitas da mesma madeira, mas forradas de veludo carmesim. Nas paredes estavam distribuídas tapeçarias finíssimas, enquanto as estantes carregavam dezenas de presentes belíssimos e de valores inestimáveis, entregues por outros reis e até por imperadores, aos antigos governantes de Alestia.

No fundo do cômodo, do lado direito, uma grande e pesada cortina se estendia do teto ao chão, e Cassis sabia que a porta que procurava estava ali, mesmo sem nunca tê-la visto. Ele se aproxima, afastando a cortina e encontrando a pequena porta de madeira que o levaria a sala particular do rei, logo utilizando a mão livre para puxar a corrente em seu pescoço, que se escondia por baixo das roupas, para revelar a única chave capaz de abrir àquela fechadura.

Cassis destranca a entrada e atravessa o batente, intrigado com a curiosa sala que se revelava diante dos seus olhos. Ali também havia uma linda mesa de mogno e uma cadeira com forro de veludo, mas, diferente da sala anterior, aquela não possuía janelas, suas estantes guardavam somente livros, cadernetas e diários, e havia uma leve camada de poeira assentada sobre todo o ambiente, como se ninguém adentrasse aquele lugar há algum tempo.

― A limpeza é realizada a cada dois meses, sob a autorização real e a tutela dos soldados, sendo que, somente empregados que não saibam ler podem adentrar a sala, permanecendo nela até que o serviço esteja completado – relembra em pensamento, repetindo as palavras que o chanceler lhe dissera na noite anterior, quando lhe entregou a chave da sala privativa.

As paredes estavam livres de decoração, enquanto o teto carregava uma belíssima pintura de Ofir, o primeiro rei, lutando contra um leão. Ao fundo, logo atrás do único assento da sala havia uma grande caixa de mogno sustentada por altas pernas feitas de ouro, que parecia estranhamente limpa quando comparada com as demais coisas.

O rei se aproxima, abrindo-a lentamente e arregalando levemente os olhos ao se deparar com uma armadura real, perfeitamente polida, sobre um estofado de pele e com um envelope endereçado a ele.

"A Vossa Majestade, o Rei", dizia o envelope, numa caligrafia refinada. O vampiro abre o pedaço de papel, revelando mais da caligrafia que reconhecia como sendo de seu chanceler, que ficara incumbido de proteger a chave da sala privativa até que o novo rei fosse coroado:


Vossa digníssima Majestade,

Faço saber, a grandíssima coroa, que estive presente à sala privativa – na companhia de três cavaleiros do Rei, para que me servissem de testemunha de que nada foi tocado, lido ou vasculhado –, com o intuito de depositar na urna de guerra, a recém-forjada armadura de Vossa Majestade, conforme solicitado e instruído por Sir Thorkus, o ancião, e o Arquiduque Leopold de Alestia.

Diante disso, peço absolvição por fazer uso da chave que a mim foi confiada, sem prévia autorização de Vossa Majestade, com a justificativa aqui resenhada, estando certo de que os cavaleiros de Vossa Majestade poderão testemunhar a meu favor quanto à intacta confidencialidade dos documentos reais.

Honrado em permanecer, Senhor, o mais humilde e obediente servo de Vossa Majestade.

Chanceler, Jonas de Alestia.

Cassis (Série Alestia I)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora