Acordamos bem cedo na manhã seguinte. O casamento estava marcado para o meio-dia, e a festa duraria o fim de semana todo.
Mal tinha amanhecido e eu já estava de pé, com uma moça ajustando meu espartilho nas costas. Rainha Ana estava sentada na poltrona perto da escrivaninha, usando um elegante vestido vermelho de seda. A ponta de seus dedos finos deslisavam despreocupadamente pela mesinha, onde estavam as cartas que eu ainda não havia enviado á Olívia.-A senhorita acha que está bom? - perguntou Cíntia, quando acabou. -Ou deseja apertar mais?
-Está ótimo, obrigada. - Sorri para ela. Eu tentava demonstrar o tempo todo que não estava tentando me aproveitar da situação, mas ainda não sabia se estava obtendo sucesso.
Enquanto eu colocava o vestido, Rainha Ana virou a cabeça para mim:
-Tu estás escrevendo para alguém? - ela perguntou, curiosa.
-Sim. Para uma amiga. Porém ainda não obtive resposta. A senhora sabe me dizer quando as cartas são enviadas?
-O mensageiro viaja ás sextas-feiras. Acho que ontem já saíram algumas cartas. Qual o nome da tua amiga? Eu a conheço?
Não soube se diria a verdade ou inventaria uma história. Não sabia se ela investigaria e descobriria que eu estava trabalhando no palácio de Beatriz. Ela poderia ficar muito confusa. Optei por selecionar as informações.
-Olívia Fonseca. -Sua expressão se iluminou.
-Os Fonseca? Eu os conheço. Grande família, bem antiga. Ela é filha de Abigail? Foi a mais recente notícia de casamento que acompanhei deles.
Assenti com a cabeça.
-Oh, aquela mulher é desagradável. - ela balbuciou algo que não consegui ouvir. - Coitado do marido dela. Viveu no inferno. Deve ter morrido de desgosto.
Aquilo era verdade, era de conhecimento geral o desgosto daquele casamento.
Fiquei feliz que a Rainha não me perguntou mais nada e ficou de pé, fazendo questão de escovar meu cabelo.Tomamos café no salão, com quase todos os convidados. Arthur sentou-se ao meu lado, vestindo um casaco sobretudo vermelho. Seus cabelos estavam impecavelmente escovados para trás, e usava uma coroa reluzente. Ele cumprimentou a mãe, se virou para mim com aquele olhar de tirar o fôlego e sorriu:
-Está linda. - ele disse.
Abri a boca para responder, mas voltei a fechá-la. Lembrei que ele era comprometido, e sabia disso. Então apenas acenei com a cabeça, com um agradecimento abafado. Ele notou minha reação.
-Está brava comigo? - ele perguntou, preocupado.
-Desculpe-me senhor, mas não acho adequado que ande comigo sendo comprometido. Sua noiva pode ficar chateada comigo. Não quero problemas.
-Que noiva? - ele riu. -Acreditou na história do jantar de ontem?
-Sua mãe confirmou mais tarde. Disse até que o senhor já a viu.
-Mamãe inventa histórias. Tanto que ela até conta aos outros sobre você no internato, como se fosse minha irmã. Ninguém me apresentou noiva alguma. - olhei para ele e de repente vi seu olhar cintilar, como se algo tivesse sido compreendido só agora. - Está enciumada?
-Não! - exclamei, um pouco alto demais. -Claro que não.
Mas ele parecia muito satisfeito consigo mesmo.
-Ah... - tentei pensar em algo para sair daquele assunto. - Onde está o rei?
-Ele vai ficar no quarto até chegar a hora do casamento, assim como a Sra. Beatriz. -ele respondeu, mas seus olhos me analisavam com curiosidade.
Me virei para frente e logo depois algumas pessoas passaram atrás de mim e cumprimentaram Arthur. Um rapaz apertou a mão de Arthur e cumprimentou a rainha com uma mesura profunda.
-A senhora fica mais radiante a cada dia! - ele se curvou e beijou a mão dela.
A rainha riu de seu galanteio:
-Leonardo, guarde os elogios para as mocinhas que estarão no casamento hoje. Já pensou em se casar? Já está na idade.
-Papai já me mostrou algumas moças, majestade. Ameaçou cortar minha mesada se eu não casar logo, mas não achei ninguém com...
Ele me fitou, abismado:
-Quem és tu, donzela? - ele beijou minha mão. Ouvi Arthur se mexer ao meu lado e eles trocaram olhares, como se conversassem em silencio. - Então essa é a ladra de corações?
-Eu? - olhei para os dois. - Como assim?
Sr. Leonardo sentou-se ao lado de Arthur, que o fuzilava com o olhar.
-Arthur me escreveu falando de ti. - ele sussurrou.
-Cale a boca! - Arthur o cutucou, incomodado.
-A senhorita deve ser um anjo, pois ele nunca escreve. - o rapaz riu.
-Ele está inventando. Ele é um mentiroso. - Arthur disse, envergonhado, evitando me olhar.
-Ele disse que tu és tão bela quando o nascer do sol. - Sr. Leonardo se divertia com o que dizia.
-Quer morrer? - Arthur perguntou ao amigo, de um jeito tão engraçado, que me fez cair na gargalhada.
Eles me olharam com surpresa, e Arthur sorriu encantado.
-Vamos, meus amores. - A rainha ficou de pé, alheia ao assunto, nos chamando para subir até o quarto do rei. -Vamos ver como está o irmão de vocês. Esse casamento é um fardo demasiado pesado para meu querido.
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Além dos Muros do Palácio
RomanceAnastácia nunca pensou que sairia do reino onde havia nascido e crescido. Tinha em mente que viveria para sempre isolada do mundo, desde a queda social de seu pai. Quando sua instável Rainha tem seu casamento finalmente marcado com o Rei Afonso e s...