Capítulo 12

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Bianca

Fico em casa os dois dias seguintes após Vitor descobrir tudo. Ignoro as ligações insistentes de Mel e Larissa.

Sei que vou ter que encarar a mágoa das duas por não ter contado nada, mas ainda não estou pronta. Contar tudo a Vitor foi muito forte. A culpa que sinto e que tento evitar a três anos está me consumindo agora.

Arrumo uma mochila, fecho a casa pego minha jaqueta e as chaves da moto.

Parto de moto sem um destino específico. Sinto que vou sufocar nessa casa. Piloto devagar.

Pego uma saída da cidade. No caminho decido ir até uma praia que sempre vamos entre amigos.

Demoro umas três horas pra chegar. Deixo a moto e a mochila em uma  garagem paga e vou caminhando até a praia.

Caminho pela areia e em algum ponto eu sento. Observo as ondas quebrarem. Sinto como se uma tristeza fizesse o mesmo movimento  dentro de mim.

Ela se acumula, se forma forte, depois arrebenta com força dentro de mim, se espalha e some. Para mais tarde começar o processo de novo.

Observo as poucas pessoas que estão por aqui entre elas um menino. Ele corre e brinca feliz perto do que imagino sejam seus pais. Miguel teria mais ou menos a idade dele agora.

Afasto os pensamentos.

A tarde passa devagar, uma brisa mais forte começa. O cheiro da maresia me faz sorrir.

Vejo um surfista solitário na água. Uma sensação estranha me toma. De longe parece que o conheço. Observo ele pegar onda após onda.

Quando ele sai da água e vem em minha direção, meu queixo cai.

- Parece que temos gostos parecidos.

- Vitor.

Ele sorri. De forma simples. Tudo para o Vitor parece simples. Me pergunto se ele já digeriu tudo que descobriu.

- Onde estão os outros?

- Na casa deles suponho.

Ele arqueia uma sombrancelha e como se fosse possível fica mais charmoso.

- Você veio sozinha?

Desvio meu olhar para o mar. O que ele pensa que vim perseguindo ele?

- Sim.

Ele estende a prancha na areia. E começa a tirar a roupa de neoprene que usa pra surfar. Não me impeço de admirar.

Vitor tem o corpo sarado. Sei que ele e Tyler treinam bastante na academia. Mas a genética deu uma boa ajuda aí.

Alto, forte, com dois olhos impossíveis, braços fortes e tatuados, pernas saradas e um cabelo que dá vontade de puxar,  É muita injustiça.

Quando ele termina de tirar a roupa e fica só com a bermuda, reparo em uma tatuagem que parece recente e que eu sei que não estava ali até pouco tempo.

Bem no alto do peito dele. Duas asas se estendem uma para cada lado do peito, e me emociono ao ver que no centro das asas está uma estrela com o nome de Miguel.

Fico encarando a tatuagem. Ele se aproxima e senta ao meu lado na areia.

Vitor me observa.

Preciso tocar, e sem pedir permissão, levo a mão a pele dele. Contorno o nome dele com o dedo.

Vitor ainda observa.

É linda. Uma homenagem linda. Algo eterno. Engulo um soluço. Olho para os olhos azuis em busca de uma resposta.

- Por que você fez isso?

- Ele era meu filho. Eu precisei marcar isso. Quero carrêga-lo comigo.

- Eu gostaria de esquecer...

- Esquecer o filho que teve? Ele diz incrédulo.

- Claro que não, mas a dor envolvida, pensar nele e que não o tenho aqui dói. Por isso tento evitar ao máximo pensar nisso.

Ele fecha os olhos e deita na areia.

- Bom que bom que agora eu sei. Assim ele tem alguém que faz questão de lembra-lo todos os dias.

Me sinto repreendida. Como se estivesse fazendo algo errado.

- Você não entende Vitor...

- Eu entendo. Você foge da dor. Eu prefiro aceitá-la. Ele se foi, preciso aceitar isso. Eu não pude nem tocá-lo, nem vê-lo, mas ele faz parte de mim agora.

- Não posso fazer isso. Me sinto vazia. Sinto que algo foi tirado de mim. Evito pensar nele, quando o faço tudo parece perder o sentido.

- Todos temos um propósito Bianca. Nosso filho cumpriu o dele. Não podemos pedir mais do que isso.

Escutá-lo chamar Miguel de nosso filho me evoca muitas lembranças, como sonhei com isso quando estava grávida. Ter Vitor ao nosso lado.

- Qual propósito? Ele não teve chance...eu não lhe dei chance...

- Não se culpe. Você enfrentou tudo sozinha e fez o melhor que pode. Tive mais culpa por ter afastado você daquela forma. Minha intenção era afastar você, para evitar que você se machucasse, acabei fazendo exatamente isso.

- Você não está com raiva de mim? Por ter escondido tudo isso?

Ele suspira longamente antes de responder.

- Não. Estive logo que eu soube. Depois fiquei apenas magoado. Saí da sua casa aquele dia e vim direto pra cá. Eu errei, você também. O propósito de Miguel foi nos ensinar. Não posso ter raiva da mãe dele.

Fico sem palavras. Sempre admirei esse lado pacífico e de bem com a vida de Vitor. Mas sempre creditei isso ao fato de ele não enfrentar grandes problemas, então era fácil ele ser relaxado e otimista.

Vê-lo assim tranquilo depois de saber tudo que aconteceu, é como levar um tapa de luva.

Tenho lutado todo esse tempo para não me afogar, para não me consumir com o peso de tudo. E Vitor parece absolutamente em paz com tudo. Fico encarando o rosto com os olhos fechados.

Parece que tenho feito muitas coisas erradas mesmo.








VITOR - Livro 2 Série - Broken Ice-  CONCLUÍDOOnde as histórias ganham vida. Descobre agora