Capítulo 7

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VII

Finalmente o grande dia chegara. Em menos de três anos, o templo de Melkor em Meneltarma ficara pronto. Mairon mal podia acreditar. Olhava com gosto para o prédio, pensando o que Melkor acharia caso pudesse vê-lo.

"E ele vai vê-lo. Em breve, muito em breve!", disse de si para si.

No dia da consagração do templo, Mairon ordenou que Nimloth fosse derrubada e usada como oferenda para a primeira leva de sacrifícios no altar. Muitos foram contra, mas não se pronunciaram pois agora a influência do maia sobre Ar Pharazôn era tão grande, que qualquer um que fosse contra os desígnios dele era o mesmo que ir contra a vontade do próprio rei. Mairon era esperto. Sempre no papel de subalterno, de servidor, na verdade era ele quem mandava. Já era um pouco assim com Melkor no passado, pois embora o amasse em demasia, o influenciava a tal ponto que muitas das decisões em Angband não eram tomadas pelo vala, mas pelo maia - embora o último sempre fizesse parecer que era Melkor quem as tomava. Se não fosse assim, a impulsividade, e no final a loucura das silmarils, teria levado a Angband a falência muito antes da Guerra da Ira.

Chamou a Moriel no palantír. Não queria que o filho perdesse a cerimônia de abertura do templo.

- Meu filho, vou posicionar o palantír em frente à grande sala onde está o altar. É lá que ocorrerá a abertura dos ofícios. Não mostre seu rosto no palantír, eles não precisam saber nem que você existe, nem que você está assistindo tudo à distância. Não lhes compete. Enfim, coloque uma imagem de um muro de pedra, qualquer coisa que não chame a atenção desses edain idiotas.

- Está muito bem ataviado desta vez, meu pai.

E estava mesmo. Envergava uma túnica longa, negra, com borlas douradas que lembravam as brasas de Orodruin, as quais combinavam com a cor de seus cabelos e olhos. Os dedos ostentavam agora quatro anéis - o que Melkor lhe dera na primeira era; o anel-mestre; um anel de conselheiro que Ar Pharazôn lhe dera; e o mais novo deles, o anel que indicava-lhe a posição de sumo sacerdote do templo. Os cabelos estavam ataviados em azeviche, prata e diamantes.

- Obrigado. Faço isso para impressionar aos edain, tolos que são de se deixarem levar apenas pelas aparências das coisas; mas também porque o seu pai merece. Afinal... assim como no passado, quero estar bonito pra ele. Mesmo que ele não possa me ver...

Mairon baixou a cabeça e teve de se segurar para não chorar. Era assim que ele falava a Thuringwethil quando se arrumava para Melkor em Tol in Gaurhoth, nos já remotos dias da primeira era. Ele se arrumava a Melkor, mesmo que o amante não o visse àquele dia, sendo que ambos à época habitavam fortalezas diferentes. Agora, ele não estava há alguns metros de distância, mas numa outra dimensão. O maia suspirou e continuou falando.

- Moriel, por favor, direcione as suas boas energias a Melkor também. Eu espero, do fundo do meu coração, que ele escute as preces que serão feitas aqui hoje. Faça-as também.

- Eu as farei, meu pai.

Sendo assim, ambos os ainur se despediram e Mairon enfim posicionou o palantír em frente ao altar, ninguém ainda sabendo para que servia aquela bola - se era objeto meramente decorativo, se era objeto de divinação ou o que mais. Mas ninguém ousava perguntar, temerosos da feitiçaria de Mairon que estavam.

Mairon esperou o templo encher de gente para começar a cerimônia. Havia separado os melhores incensos, as melhores velas, os melhores tecidos para guarnecer ao altar - mas a maior oferenda seria Nimloth, a descendente de Telperion. Tinha ódio daquela árvore, a que lhe lembrava os dias fastidiosos em Valinor. Ela seria sua primeira oferenda a Melkor.

Primeiramente passou pela sala com um turíbulo, incensando toda a sala do altar com uma fumaça densa, acre e entorpecente. Ninguém sabia do que era feito aquele incenso, só ele. Mas aquilo ajudou a dar ao local um clima sobrenatural. Depois acendeu, uma a uma, sem pressa, centenas de velas em frente ao altar. Então todos viram, Moriel incluso, uma enorme pintura de Melkor no fundo da sala, logo atrás do altar - não o Melkor manco, com as mãos queimadas e o hroa decadente que o mundo conhecera no final da primeira era, mas sim a imagem de Melkor em seu fána glorioso do início dos tempos, o Arata poderoso pelo qual Mairon se apaixonara logo no início de sua existência.

O filho da escuridãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora