Capítulo 15

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XV

Melkor se fechou com Mairon e Moriel numa sala, selando a porta com seus próprios poderes mágicos a fim de não serem importunados. Sentou-se numa cadeira de alto espaldar e Mairon ficou atrás dele, encostado¹. Moriel sentou-se numa outra cadeira e então o vala principiou a falar:

- Aqui estamos nós reunidos outra vez. Passamos um tempo em Númenor, porém agora o local se foi.

- Se me permite saber, meu pai - interrompeu Moriel - como a ilha veio a afundar?

- Ah... eu disse ao rei e a seus súditos que deveriam ir até Valinor em busca da imortalidade. Só que... os Poderes não deixaram barato. Acabaram por invocar a Eru, o qual afundou a ilha.

"Mais uma vez, os planos e ideias desarrazoadas de meu pai estragaram tudo", pensou Moriel, virando os olhos. "Afinal de contas, podiam ter colonizado a ilha e pedir tributos a eles, bem como continuar com os cultos lá, mas Melkor sempre tem de destruir tudo".

Mairon, no entanto, reparou naquele revirar de olhos e repreendeu o filho.

- Eu vi isso, mocinho!

- Hã?

- É, eu vi. Você fica aí virando os olhos quando seu pai fala das falhas dele! No fundo sempre achou que ele destrói tudo.

Moriel ia replicar, mas Melkor o interpelou:

- É verdade. O menino tem razão.

- Como?!

- Você sabe, Mairon, que é isso mesmo. Eu simplesmente destruo tudo! Eu estrago tudo. E agora? Ainda bem que tenho vocês pra me guiar, porque se não fosse por isso, estaria acabado há tempos.

Mairon não ousou replicar. Caso replicasse, mesmo se fosse para elogiar ao consorte, o contrariaria; e não era o que desejava fazer. De qualquer forma, Melkor estava a dar aval a um pensamento de Moriel. Ele, porém, não se vangloriou: apenas permaneceu observando a seus pais e desejando ouvir o que mais eles tinham a dizer.

Melkor continuou:

- Bem. Agora estamos novamente em Mordor, o domínio que vocês instituíram para mim. E agora? O que faremos?

- Ah, eu estou feliz em gerenciar os exércitos - disse Mairon - Controlá-los já me deixa bem. Também colonizar as terras vizinhas me deixa feliz. E você, Moriel?

- Também. Eu gosto de fazer isso, e para mim é suficiente.

Melkor ficou algum tempo em silêncio. Em seguida disse:

- Eu quero ficar junto com a minha família. Por muito tempo tive rancor e pensei em destruir, mas agora é diferente. Eu agia, na primeira era, como se fosse sozinho. Eu tinha vocês, mas não considerava isso. Acabou como acabou. Agora, tudo que quero é estar com vocês.

Os olhos de Mairon brilharam, como se se acendessem em fogo. Ele sorriu e se abraçou a Melkor, muito feliz. O vala continuou falando:

- Por isso mesmo é que eu queria ter outro filho.

Moriel ficou impassível, mas Mairon mudou de expressão imediatamente.

- Melkor, o que já conversamos sobre isso?

- Eu já sei, meu bem. Uma gravidez pra você seria muito difícil...

- Então por que insiste?

- Porque talvez não seja necessário para você engravidar.

- Hun? Como assim? Não vai me dizer que vai engravidar outra!

- Não, meu bem. Se você que é maia não suportaria bem, imagine as outras. Pois bem. Assim como fizemos os dragões na primeira era, poderíamos fazer um ser semelhante a nós em um corpo sem gravidez.

- E... como pretende fazer isso?

- Você sabe trabalhar nas forjas muito bem. Poderia forjar um corpo e depois nós sopraríamos o espírito nele por encantamentos.

- Ora...! Criar um corpo eu sei, mas criar espírito é que não! Como faremos nesse aspecto?

- Na distorção da música que criei houve vários espíritos que adormeceram logo em seguida e nunca tiveram um fana ou consciência propriamente dita. É só trazer um deles para um corpo através de feitiçaria e pronto!

Mairon o observou em apreensão. Será que aquilo daria mesmo certo?

- ...pode ser possível, mas será que eu conseguirei desempenhar bem a tarefa?

- Eu creio que sim.

O maia estava apreensivo. Não sabia se podia lidar bem com aquilo. Já havia corrompido a muitosseres e transformado eldar em orcs, mas fazer isso com um ser a quem chamaria de filho?

Melkor continuou:

- E você, Moriel, o que acha disso?

- Se ambos os meus pais estão de acordo sobre ter um segundo filho, eu creio que está bem.

- Não estou falando exatamente do que nós achamos, mas sim do que você acha.

- Eu não sei. Nunca me vi tendo a um irmão, mas creio que se ele tiver o pensamento semelhante ao meu, podemos nos dar bem.

- E se for irmã?

- Uma mulher?

- Sim. Nunca houve muitas mulheres nas terras da escuridão. Havia Thuringwethil e Mairon quando estava em forma feminina, mas de resto, no geral, eram quase todos homens. Uma princesa em Mordor seria algo a se admirar!

Moriel assentiu, mas não demonstrou muito mais emoção do que isso. Sempre racional, sempre metódico.

Chegou a vez de Mairon falar:

- Se quer que eu faça a um corpo para ela, como seria?

- Igual ao teu.

- Como! Melkor, não tenha esse tipo de desejos por sua própria filha!

- Que besteira, Mairon! Eu não teria esse tipo de desejos nela! Apenas... queria ver nela uma figura feminina sua. Assim como Moriel é muito semelhante a mim.

O maia observou bem ao filho. Era verdade. Por toda a segunda era, ele o observava e tinha algum consolo em ver nele a figura quase idêntica à do pai - tirando a personalidade fria e os olhos dourados. E nem por isso sentia "esse tipo de desejos" em seu filho. Era apenas algo bonito... um filho muito parecido com o seu amor.

Era assim que Melkor se sentia.

- Mas quero a menina com idade de três a quatro anos - disse o vala - e os olhos verdes como os meus. Precisaremos de um ritual muito poderoso para isso, e portanto creio que deveremos mobilizar bastante energia para isso.

- Sim - disse Mairon - e eu também precisarei pesquisar os melhores materiais para fazer o corpo dela. Oh, que coisa estranha! Aule fez os anões, seus filhos, assim... agora quem fara uma sou eu...

- Pelo menos serviu pra alguma coisa ficar aprendendo com ele. E agora vamos!

Como se nada houvesse acontecido, Moriel os reverenciou e voltou a seus afazeres. A notícia de que em breve teria uma irmã menor não o afetara em absoluto nem ao bem, nem ao mal - ao menos por enquanto.

Já Mairon... embora nem estivesse "grávido", como ficara de Moriel, dessa vez voltava a sentir tudo de novo. Apreensão, pensar em como seria o futuro dela... era difícil ser mãe, mas se essa filha fosse tão boa quando Moriel, valeria muito a pena.

E Melkor foi ver os orcs, pensando em como seria o rosto de sua filha, igual ao de Mairon, finalmente uma menininha em casa.

To be continued

OoOoOoOoOoOoO

¹Reparem em fotos antigas, eles faziam muito isso. O homem sentado numa cadeira e a mulher atrás se apoiando no espaldar (encosto) da cadeira. Estava relendo "Senhor dos Anéis" e reparei que na despedida de Lórien, no barquinho de cisne, Galadriel está assim com o Celeborn.

A filha deles será Mairen, a personagem original da Vectriz Ikaros. Pronto, agora a gente trouxe o rol pras fics rssss!

Beijos a todos e todas!

O filho da escuridãoWhere stories live. Discover now