Capítulo 27

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XXVII

No começo, todos estranharam, uma vez que dos edain, mortais e de vida reduzida, a maioria não sabia como era a aparência de Melkor, uma vez que o vala não se revelava desde a primeira era. Mas acataram. E os ritos começaram com força, Melkor iniciando a matança de edain e Moriel guardando a energia deles e das almas dentro de recipientes escolhidos e guardados a dedo, sem revelar a ninguém fora da própria família. O sorriso de Melkor era sinistro e mau, como se cada morte vingasse a perda de fána de seu maia. Pior: como se todas aquelas mortes não fossem suficientes para vingá-lo. Ainda usava a imagem de Mairon, de forma que sua imagem costumeira não era conhecida dos edain. Era como se ele tivesse tomado tanto nojo dos edain, que não quisera sequer revelar sua verdadeira figura a eles.

Por anos passaram assim. Para os edain muitos anos, mas para os ainur poucos. Para eles passava muito rápido, mas mesmo assim não foi mais fácil para Melkor. Havia ainda ritos sexuais nos templos, mas Melkor deles não quis participar. Havia belas edain se oferecendo para ele, mas ele não quis. Estava viúvo, podia até mesmo tomar a liberdade de ter algumas amantes sem ser aquilo uma traição - mas não quis. Simplesmente escolheu não ter mais ninguém a não ser seu maia.

Passou muito tempo; gerações de edain e da chamada "quarta era", onde os seres humanos prosperaram, Elessar enfim morreu, os eldar em sua maioria partiram para o Oeste. Mas eles, mais uma vez, trabalhavam em segredo. O rei, e depois seus descendentes, esqueceram por completo dos povos do leste, os quais serviram para juntar toda aquela energia.

Após todo esse tempo, Moriel enfim declarou ter energia suficiente para seus propósitos. Mas era necessário energia ainu para "amalgamar" o fairë de Mairon em seu novo fána. Assim foi feito. Melkor fez o novo fána de Mairon na fortaleza de Dol Guldur, e tomando de sua própria energia, da de Moriel e da de Mairen, juntou-a à energia edain que por eras fora acumulada e colocou no corpo de Mairon. Por um tempo, nada ocorreu. Por um terrível momento, os ainur pensaram que na verdade não haveria modo de trazer a Mairon de volta. Mas após mais algumas tentativas ele foi trazido de volta. Quando finalmente abriu os olhos âmbar, o vala não pôde acreditar.

- Mairon...!

Por um tempo nada pôde dizer. Compreendera afinal a terrível emoção que tomara conta do maia quando em Númenor - e há quanto tempo já ia aquilo! - Melkor voltara afinal. Era como uma onda forte que o levava e não o deixava nem falar. Simplesmente abraçou ao maia e ali ficou, abraçado a ele, chorando sem poder conter as lágrimas. Mairon, embora ainda não compreendesse bem o que passava, o abraçou de volta. Sabia que anteriormente havia perdido a melhor essência de si; que hibernara por muitos anos e agora voltara. Mas ainda não compreendia as coisas muito bem.

Após muito tempo, conseguira enfim falar:

- Melkor, onde estamos?

- Meu bem... estamos em Dol Guldur.

- Sei. O que aconteceu em minha ausência?

Os três ainur - Melkor, Mairen e Moriel - se revezaram para contar o que ocorrera; o vala tomara novamente sua forma costumeira - homem alto, forte, de cabelos lisos e negros, olhos verdes - enquanto Mairon estava com sua forma masculina e de olhos e cabelos dourados.

Aos poucos, Mairon entendera. E quando vira o tanto de tempo que sua família gastara somente para que voltasse, quando poderiam ter feito qualquer outra coisa; quando Melkor poderia ter tido outros amantes ou ainda outros filhos ou outra família; mas eles escolheram trazê-lo de volta.

Melkor sorriu, uma vez que quando ele mesmo retornara do Vazio; Melkor pensara nele casando de novo, uma vez que poderia ter mais chance de perdão que a si próprio. Mas Mairon vivera para ele e somente para ele, assim como Melkor fazia então. Ambos compreendiam agora que o que os unia era mais duradouro e indestrutível que o tempo ou as circunstâncias.

- Melkor... fico tão feliz de ver que todo o esforço que despendi valeu a pena. Sou amado afinal... por si e por meus filhos.

- Claro que sim, meu bem...

Não resistindo, eles se beijaram e se sentiram como se nunca houvessem sido separados. No fundo, não haviam sido. Estavam ligados em suas almas e nos fios de seus destinos, desde o dia de suas criações.

Não resistindo, Mairon e Melkor se afastaram dos filhos e se entregaram a longos dias de amor, matando a sede um do outro em seus leitos privados, transando gostoso como há muito não transavam, pois aquela separação fora, de todas, a mais difícil, por ser inesperada; Melkor nunca esperara que fossem atacar direto a Mairon e não a si, pois ele era sempre o alvo principal dos demais. Mas agora estavam juntos outra vez, contra todas as expectativas.

Após terem se saciado um no outro, de todas as formas e com todas as posições que conheciam, Melkor se lembrou de algo. Quando o fána de Mairon se esvanecera em seus braços, naquele cruel momento onde tudo parecia enfim perdido, lhe sobraram as joias e as roupas. Em sua loucura destruidora, Melkor acabara com tudo, desde a torre até os objetos que Moriel e Mairen acabaram por não salvar da torre. Mas um ele guardara. Era o anel de casamento, a aliança forjada ainda na primeira era, em Angband, quando Mairon se descobrira "grávida" de Moriel e então Melkor decidira finalmente desposá-lo.

Beijando as mãos de seu maia, Melkor tomou da mão dele e nela colocou o anel em seu dedo anelar. E assim, em secreto, em suas câmaras nupciais, sem outra testemunha a não ser um ao outro, ambos reafirmaram seu vínculo esponsal. E se amaram mais uma vez antes de sair do quarto.

Quando saíram do mesmo, pareciam ter retomado toda a lucidez. Pois até então não estavam completamente lúcidos; Melkor ainda com a mente embaralhada pela ausência de Mairon; e Mairon ainda em estágio semi-letárgico, ainda não completamente retornado em mente a Arda. Mas após aqueles dias de amor, estavam ambos em sua mais plena forma. Mas mais do que plena forma, eles tinham uma coisa acima de todas as outras.

Desejo de vingança.

Mairon era paciente e calmo. Mas dessa vez a coisa extrapolara todos os limites. Ele só quisera dirigir as suas terras e cuidar da sua casa, e lhe faziam aquilo somente porque ele ainda trazia o nome de Melkor consigo. Pois agora lhes mostraria seu lado mais cruel. Estava cansado de esperar, de ser diplomático. Agora, ele não pediria para Melkor esperar. Ele agiria ao lado dele, dessa vez não para a dominação, mas para a destruição.

E foi no olhar sinistro de seus pais que Moriel, como general experiente, enfim depreendeu que a maior de todas as guerras de Arda estava para começar.

To be continued

OoOoOoOoOoOoO

Agora sim, finalmente, as Dagor Dagorath! O bom de a fic ser comprida é que tive tempo de pensar em como fazer essa guerra, pois não tinha nem ideia quando comecei a escrevê-la.

Beijos a todos e todas!

O filho da escuridãoWhere stories live. Discover now