Soco no rosto e laços quebrados

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— Tem certeza disso, meu filho? Seu irmão logo virá e pode lhe dar uma carona. - Se tinha algo que Jungkook estava certo esse algo era que não queria ver o irmão. Faziam anos que não se falavam, mas não era como se a mãe soubesse; ambos moravam em Seoul, então fingiam uma boa relação. Não que se odiassem, mas haviam brigado ainda na época da adolescência do Jeon mais novo e as mágoas ainda existiam, principalmente para Jungkook; nunca contaram sobre a briga e nem tentaram se resolver depois dela. A verdade era que Jungkook nunca quis conversar novamente com Hoseok que, por sua vez, nem insistiu e deixou o assunto por isso mesmo.

— Será uma viagem de poucas horas, não tem porque se preocupar. Eu ainda não morri. - Entendia a preocupação da mãe, mas os nervos à flor da pele não lhe deixavam demonstrar compreensão. Havia sido diagnosticado, mas não estava em estágio médio ou avançado, ou seja, ainda estava vivo; comparava a doença com a morte de si mesmo, afinal perder a consciência seria o mesmo que não existir.

Iria para Daegu, mais especificamente para um fliperama. Havia conhecido Yoongi ainda no Fundamental I, em Busan. O rapaz era uma criança quieta e muito pobre. Jungkook na época não sabia o que era ser muito pobre, mas ao crescer um pouco e lembrar do outro, percebeu que aquela criança que vivia reclusa em seu próprio mundo e brinquedos de papel e caixas de remédio, era na verdade muito pobre e que vivia numa realidade completamente diferente da sua.

Com o passar do tempo se aproximaram e Jungkook passou a preferir megazords de caixas de papelão ao invés de seus ioiôs e beyblades. Brincavam muito e se ajudavam nas tarefas da escola; Yoongi odiava as provas e vivia dizendo que era inteligente, mas que a escola não sabia fazer as perguntas certas. Foi quando o amigo tirou um 3 que entendeu que não era só a pobreza que o rapaz enfrentava: no dia seguinte foram ter educação física e no vestiário pode ver algumas marcas profundas nas costas extremamente claras do amigo; com seus oito anos achou que pudesse salvar o amigo, tanto que pediu ajuda a seus pais, mas não pôde. Três dias depois dois adultos desconhecidos entraram na sala de aula, acompanhados do pai barrigudo e a mãe extremamente magra de Yoongi; a partir daquele dia o amigo não voltou a frequentar a escola.

Quando com seus quinze anos achou uma página no Weibo que falava sobre um rapaz, que se intitulava Suga, mas tinha o nome de Yoongi, era conhecido por ser campeão consecutivo em batalhas de rap de rua em um dos bairros de Daegu, quis muito ir vê-lo. Nunca soube muito bem o porquê, talvez porque sentiu que havia criado um mundo onde apenas os dois e seus megazords existiam e sentia falta daquilo, talvez por culpa por arruinar a infância já arruinada do outro ou porque ainda se questionava se era o único que não conseguia se esquecer do que aconteceu no mesmo dia em que viu as costas de Yoongi e decidiram matar aula para ir até os contêineres abandonados da ferrovia.

Então ele fora atrás de Yoongi, em Daegu, e quando o encontrou o Min estava naquele mesmo fliperama em que Jungkook passava a entrar naquele momento.

— Oi, como posso ajudá-lo? - Uma colegial perguntava, já segurando um folder que claramente mostraria como funcionavam as vendas de fichas e brinquedos.

— Estou procurando um rapaz, Min Yoongi. - Jungkook queria encontrá-lo, ao mesmo tempo que torcia para que não estivesse e nem tivesse sido visto a tempos. Quando pensou em escrever as cartas, nunca pensou que seria tão constrangedor encarar as pessoas, pois se já estava sendo difícil lembrar do passado sem se sentir incômodo, imagina ver o passado em sua frente.

— Não sei quem é, mas posso chamar o gerente se precisar. - Com certeza era eficiente e pró-ativa, o que fez o rapaz revirar os olhos quando a garota se abaixou para guardar o folheto. Estava de mal com a vida, mesmo que jurasse que era a vida que não lhe queria bem; odiava a situação em que estava, mas odiava ainda não poder culpar ninguém sem ser ele mesmo e seus genes e funcionamento ruim. — Senhor, espera. Ah, ei, o senhor esqueceu... - Não escutou mais nada ao que saiu daquele fliperama que já não tinha mais nada de semelhante com o que era cerca de vinte anos atrás. Havia deixado 20000 won sobre o balcão; vira o celular da garota desbloqueado sobre o balcão: havia uma foto dela, seu filho - havia uma tarja escrito "my baby" em cima da cabeça do mesmo - e provavelmente sua mãe. Aquilo o fez pensar como seria ser mãe tão jovem num país tão inóspito para pessoas que não seguem todas as ridículas-condutas-morais-de-merda - como apelidava o Jeon - e seu pensamento foi além: ela ainda estudava? onde estaria o pai? o filho teria condições de ter bons brinquedos ou teria que reciclar caixas de remédios genéricos para poder ter algo com que se entreter e se prender quando sofrer bullying na escola e os professores fingirem que não viram nada? Seu pensamento parecia descontrolado, até que se questionou por breves segundos o que era bullying e então se assustou por ter esquecido o significado por trás da palavra; passou a cravar as unhas contra as palmas das mãos e então bufou.

I WILL NOT FORGET - [jikook]Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon