°•Capítulo 10•°

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°•Dragões•°


ATENÇÃO!
Esse capítulo pode conter sérios gatilhos! Violência doméstica, agressão física, suicídio, estrupo, terror psicológico e manipulação.
Por favor, caso for sensível a algum desses gatilhos, NÃO LEIA! Preserve sua saúde mental.

Eu não sei por quanto tempo exatamente eu dormi, na verdade, nem sei se realmente cheguei a dormir. Eu sentia dores fortes por todo o meu corpo, agulhadas entravam e saiam do meu braço, meu pescoço latejava, assim como meus joelhos e minha barriga. Eu não lembro de ter sentido uma dor de cabeça tão forte quanto a que senti durante esses longos dias. Eu lembro de abrir meus olhos algumas vezes. As luzes brancas os machucavam de tal forma que não me deixava os abrir, e novamente eles eram fechados. Um dia, eu acordei, eu finalmente acordei. A abrir meus olhos pude jurar ter visto uma mulher, suas íris rubis me deixaram marcado por dias, eu não as tirava de minha cabeça, apesar de tê-las visto por apenas alguns segundos, já que a mulher só se deu o trabalho de colocar rosas vermelhas ao meu lado, e me desejar um "Boa noite". Sua voz estava calma e depressiva, eu podia sentir o peso de suas palavras me invadirem como facas. Ela voltava todos os dias, sempre após o relógio bater pela 2° vez. Ela chegava, depositava rosas ao meu lado, e se despedia com um "Boa noite". As vezes com um "Agora você pode descansar". Ela nunca notou meus olhos levemente abertos, não se importou com minha respiração, que apesar de fraca, ainda existia. Ela nunca percebeu que meus dedos se mexiam nas tentativas falha de tocar seus cabelos loiros. Ela nunca percebeu. Ou percebeu e ignorou, pois suas palavras pareciam uma despedida, como se ela soubesse que eu iria morrer. E ela realmente sabia. Todos sabiam. Exceto eu. Mitsuki Bakugou, a mulher das belas rosas era mãe de Katsuki Bakugou, a melhor, e talvez única amiga da minha querida mãe, Inko Midoriya. Elas viviam juntas, e foi um grande choque quando Inko descobriu que o filho de sua melhor amiga fora tragicamente morto em um acidente de carro, e sua mãe ficou gravemente ferida. Inko não pode comparecer ao enterro de Bakugou, tampouco ir sequer uma vez visitar Mitsuki no hospital, mas não era sua culpa, afinal, possuía muitas preocupações em sua própria casa. Após a Morte de Bakugou, Mitsuki se isolou de tudo e todos, Inko tentava conversar com ela, fazia o que podia para ajudar sua amiga, a ligava o tempo todo e levava comida pelo menos 3 vezes no dia, afinal, ela ainda era sua melhor amiga. Quando raramente a loira saia de sua casa, ficava nítido o quão terrível era sua situação. Suas olheiras antes inexistentes, agora estavam fundas e roxas. Seu olhar antes alegre, agora estava frio e assustado. Suas roupas velhas, fedidas e amassadas. Seu corpo magro, pele fina e ralada. Eu lembro quão assustador foi para uma criança de 12 anos ver sua tia amada em sua atual situação, ao mesmo tempo que sofria pela perda de seu melhor amigo. Era difícil. E só piorou após Inko assumir um relacionamento de quase 3 anos que estava escondendo por algum motivo, talvez para que ninguém desconfiasse que seus ematomas diários possuíam uma origem mais sombria do que um simples "Eu esbarrei na cama", ou "Eu acabei tropeçando enquanto vinha para cá". Agressão. Minha mãe era agredida por seu namorado, e as coisas só pioraram após o mesmo se mudar para nossa casa. As brigas eram diárias, a maioria das vezes por Inko ter saído de casa mais cedo, ou não ter colocado água para gelar. Na cabeça do monstro, aquela era uma boa justificativa para a espancar. Foi assim por 5 anos, 5 longos...longos anos. Eu chegava do colégio e ia direto para o quarto. Já não bastava o bulliyng que sofria, ainda teria que aguentar aquele maldito inferno criado pelo monstro. Eu pensava em me matar a cada 12 segundos, e a cada 6 eu pensava em como o mataria caso necessário. Eu já escutei os gritos de minha mãe diversas vezes, quando descia para ver o que estava acontecendo, eu via o monstro abusando da minha mãe...Sua naturalidade era o que mais me irritava, mas o que podia fazer? Não possuía uma individualidade, não possuía nada, não podia defender minha própria mãe. Como já pude sonhar em ser um herói desse jeito? Eu passei a odiar a cor azul, eu colocava a culpa da minha covardia naquela cor, pois era a coloração que jazia nos olhos frios do meu padrasto. Do monstro. Mas eu sabia maquiar esse meu ódio muito bem. Na escola eu conseguia fazer alguns amigos, apesar de todo o bulliyng. Claro que nenhum de meus amigos era realmente relevante, apenas serviam para me dar o mínimo de conforto durante meus piores dias. Ou seja, eu chamava suas atenções frequentemente. Minha mãe gostava muito de ler, e ela nunca perdeu esse seu brilho. Ela gostava de contar histórias durante nosso jantar, onde apenas eu e ela ficavamos no chão, já que o monstro não nos achava dignos de nos sentarmos a mesa. Esse era o único momento em que e podia proveitar da presença de minha mãe. Eu lembro que ela sempre se desculpava, e deixava lágrimas saírem de seus olhos quando era chamada pelo meu padrasto para mais um de seus estrupos. Nesses 5 anos, eu nunca senti o toque de minha mãe. Ela não chegava perto da mim, não me abraçava, e nem sequer encostava em mim. Ela se achava suja, indgna, nojenta. O jogo psicológico do monstro funcionava muito bem contra Inko. Ele a rebaixava e fazia com que fizesse parecer que ela precisava de si para sobreviver. E ela, como o amava, acreditava. Mitsuki parou de nos visitar, eu não a via mais, de jeito nenhum. Minha mãe, fez o mesmo e se trancou em casa. Eu só saia de casa para ir ao colégio, mais nada. Mas tudo chega ao fim, e esse inferno, chegou ao fim da pior forma que poderia. Eu possuía 18 anos quando, como sempre cheguei da escola e fui direto para meu quarto. Eu descansei a cabeça na cama, aproveitando o tempo que me restava antes de ambos meus pais chegarem em casa após irem juntos comprar comida, -Já que ele não deixava minha mãe sair sozinha-. Não demorou muito para que eu escutasse as palavras desesperadas da minha mãe na tentativa de explicar algo para meu pai. Ele rebatia com mais gritos, fazendo minha mãe ficar ainda mais assustada. Até que eu escutei o grito estridente de minha mãe. Uma garrafa foi estraçalhadas contra o provável balcão da cozinha. Eu corri, corri com toda a velocidade que podia. Eu tropeçava nos degraus da escada, que pareciam mais escorregadios naquele dia em específico. Eu nunca vou esquecer, seus olhos azuis sombrios fitando meu rosto apavorado com tanta naturalmente, mesmo que aos seus pés minha mãe sangrasse até a morte com cacos de vidro afogados em seu sangue. Eu nunca vou me esquecer a tranquilidade que ele demonstra quando começou a andar em minha direção com sua garrafa de vidro que estava suja com o sangue de minha mãe. Eu nunca vou esquecer quando eu me senti ser puxado contra minha vontade e ter aquela mesma garrafa revestida contra minha cabeça. Tudo ficou preto. Eu acordava e novamente desmaiava dentro da ambulância. Eu não sei o que aconteceu com o monstro, e sinceramente, não faço nenhuma questão de saber. Mas desejo de todo coração que ele esteja sendo torturado em algum lugar. Eu entrei em coma. Eu me via em um limbo, onde se repetia um filme de minha vida. As vezes, quando minha visão clareava, eu conseguia ver médicos e as paredes brancas do hospital. Mitsuki passou a me visitar e me entregar flores. Eu odiava essas flores. Eu as odiava com todo meu coração. Elas me lembravam os olhos de Bakugou e o sangue de minha mãe. Mesmo assim, ela continuava há trazê-las. Todos os dias, no mesmo horário. A segunda batida. Até que ela parou. Não por ter se cansado, e sim porque não poderia levar flores para um morto. Como ela falou, agora eu finalmente podia descansar. Mas nunca esqueceria daquela voz. A última voz que ouvira. Meu médico.

You again //BakuDeku-KatsuDeku//Onde histórias criam vida. Descubra agora