Quando encurtamos a distância

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O fim de dezembro passou depressa. Adele comemorou o Natal com a família, que a via com cada vez menos frequência, e o Ano Novo com Julia e André. Ela e Carla ainda estavam mantendo uma certa distância física, porém a troca de mensagens se tornou frequente. Qualquer um podia notar o quanto Adele estava mais alegre, agora que se via livre de drama, pelo menos por enquanto.

Ela não perguntava como Carla estava lidando com o término, e Carla escolhia não abordar o tópico por vontade própria. Era melhor assim. Se conversassem sobre isso, talvez tivessem que conversar sobre outras coisas que nenhuma das duas estava pronta para encarar. Adele não tinha expectativa de ter algo a mais, porque sabia que poderia terminar em desastre, mas mentiria se negasse ter uma pontada de esperança. Felizmente, ninguém a forçava a mentir.

Foi numa tarde de janeiro, deitadas no chão de azulejos da sala de Adele em sentidos opostos, que elas se viram conversando sobre tudo que queriam falar há meses.

— Eu sempre quis saber quando você se assumiu. — Adele confessou enquanto as duas ainda riam de uma piada.

— Ah, bom. — Carla fez um esforço para puxar a memória. — Todo mundo já sabia antes de eu estar pronta para dizer, então eu nunca disse nada, apenas parei de negar.

Adele ainda não havia satisfeito a curiosidade.

— E garotos? — Ela olhou para Carla, que negou devagar com a cabeça. As duas riram. — Imaginei.

— Você?

Elas se olharam de novo.

— Eu sou lésbica, definitivamente.

Carla encarou o teto. Adele sentia que talvez ela ainda não estivesse confortável com a palavra, já que nunca a ouviu usando. Carla sempre teve mais dificuldade com essa questão, por causa da mãe. As duas não estavam se falando muito agora que Carla morava com o pai.

— Como foi a sua vida depois que você trocou de colégio? — Ela perguntou para Adele enquanto ainda encarava o teto e seus dedos se ocupavam com um cordão em sua blusa.

— Um pouco conturbada. — Adele confessou. — Eu estive miserável no começo.

Ela buscou a reação de Carla, que parecia um pouco surpresa, mas mantinha a expressão contida.

— Entrar pro time de vôlei me fez bem, mas não era a mesma coisa. Eu nunca tive a mesma conexão que eu tinha contigo em quadra. Você praticamente lia meus pensamentos.

Dessa vez, Carla não conteve um pequeno sorriso.

— Você não é a pessoa mais difícil do mundo de ler, sabia? — Ela perguntou para Adele em tom de implicância.

— Diferente de você, né? — Adele deu uma risada. — Mesmo quando eu conseguia te prever, você dava um jeito de ser imprevisível.

— Desculpa. — Carla deu de ombros.

— Eu gosto de surpresas.

Ela sorriu e cutucou o nariz de Carla antes de continuar falando.

— Queria fingir que não, mas eu nunca deixei de sentir a sua falta. Toda coisa nova que eu gostava, eu queria compartilhar com você. Eu queria minha melhor amiga de volta.

Carla virou o rosto na direção dela, com as sobrancelhas franzidas e o fantasma de um sorriso.

— Melhor amiga?

As orelhas de Adele ficaram rosa e o rosto quente. Ela estava entrando em um território perigoso.

— Eu... Eu não era sua melhor amiga?

Quando Eu Ainda Amava VocêWhere stories live. Discover now