5. O Último Herdeiro

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Em Hutbus Island a primavera houve finalmente de chegar, transformando as pequenas camadas de gelo e neve que restaram do inverno em gotas d’águas frias que preenchiam os ambientes em umidade. Logo em breve as flores desabrocharão e o frutos pendurados meio às folhas verdes das árvores tornará tudo mais belo e vívido, somado a um clima confortável e aconchegante.

Todavia, por ora, não era assim. Dentro do castelo o “clima” era de tensão.

— Pakeos deve falar com você em breve — Klous acompanha Júdith para um salão menor, também pertencente à CIC, já que o convencional foi isolado por fazer parte da cena de um crime.

Foi deixada ali, se sentando em uma das cadeiras vazias. A solidão no local lhe pareceu hostil, outrora proveitosa.

Esperou o inerte completo e se certificou novamente que estava sozinha. Retirou de seu casaco aquele mesmo livro grosso que há alguns dias tenta decifrar. Passou seus dedos delicados nas letras douradas que compunham os nomes “Profecias do Apocalipse”.

Seus olhos cansados e sua mente exausta pediam o descanso do sono que não lhe havia sido concebido nesses últimos dias. Porém aquela mesma mente estava instigada demais com o livro misterioso para se dar esse luxo, e seu coração em luto não queria deixar de crer que as respostas estavam ali.

Recapitulou, lendo pela centésima vez a profecia que tentava compreender na noite que antecedeu a morte de sua querida mãe. O parágrafo que dizia: “e é meio ao inerte que o predador híbrido observa sua vulnerabilidade. Ele adentrou sua residência, você sequer ouviu os passos leves de seus pés grotescos. Afinal fala como ti, escuta como ti, caminha como ti, mas não vive como ti. O predador híbrido está à espreita, vigiando-te atentamente enquanto estás despercebido demais com suas superestimadas futilidades”, era o que mais lhe chamava atenção e lhe tirava o sono. Se bem interpretou, o “predador híbrido” estava em sua casa e ela não foi capaz de perceber. Afinal, apresenta comportamentos humanos, embora não seja um. Será que aparência humana também?

A profecia que sucedeu os parágrafos da noite fatídica a qual perdeu sua mãe, revelava que o Predador Híbrido faria mais vítimas. Isso se comprovou mais tarde, e segue se comprovando. O fato de nela está escrito que o ser, seja lá o que for, “mancharia de sangue as águas mágicas da primavera”, a guiou ao belíssimo The Pink River, onde acabou por ser perseguida pela figurada mascarada e não completou seu trajeto. E a profecia também se cumpriu.

Reabriu e releu o fim da mesma profecia: “Esse, portanto, é o sinal de que a lua da morte brilha como nunca, graças à glória do Leão Branco e seus três filhos malévolos”.

— Leão Branco... — se levantou e foi até a janela, observando a enorme estátua leonina.

Era o símbolo do reino, representando o poder de Hutbus Island. Mas qual sua relação com o Leão Branco citado nas profecias e, além disso, o fato de seu perseguidor estar usando a face da estátua como máscara?

Isso a balançou de forma que sua mente não podia operar corretamente.

Sim, ela conhecia a história, em parte. O Leão Branco é uma entidade divina que interage com o rei, mais especificamente com o atual rei de Hutbus Island, a ninguém mais. Em tese, ele seria o guia que instrui a majestade às melhores decisões durante seu reinado, assim como tem seus próprios princípios de como a sociedade deveria funcionar.

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