Capítulo 13

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Ajeitando-se para dormir, o casal real deitou-se em seu leito, dessa vez, acostumados com o peso e a presença um do outro ao seu lado. Ainda não conseguiam conversar naturalmente nesse momento, havia uma barreira constrangedora. Shuri decidiu desejar boa noite e se voltar para o outro lado, Namor respondeu, sempre deitado para cima, sem se voltar para ela. Fechando os olhos, os dois dormiram.

A manhã seguinte foi marcada pelos dois por uma situação inusitada, ainda assim, uma estranha fonte de conforto. Um doce cheiro de flores inundou o olfato de Namor, sem saber direito de onde vinha aquilo, apesar do cheiro lhe ser familiar. Abrindo os olhos, procurando por respostas, percebeu algo, ou melhor alguém em cima dele, ninguém menos que sua esposa, completamente relaxada. A cabeça de Shuri estava sob seu peito, o braço esquerdo encolhido, enquanto a mão direta encostava delicadamente sob as costelas dele. As pernas dela estavam encolhidas, mas as coxas dela encostavam em seus joelhos. O braço dele estava ao redor da cintura dela, a mantendo naquela posição. Acabou reparando nos trajes dela, a camiseta confortável da superfície tinha se erguido na altura da sua barriga.

Namor foi fisgado por um pequeno detalhe ali, mas que era muito significativo. A clara cicatriz da lança que ele havia enfincado nela. Às vezes, quando estavam tão relaxados e tranquilos um com o outro, quase se esquecia que tinham quase se matado. Arrependimento genuíno inundou o coração dele naquele momento. A mulher com quem tinha lutado estava completamente vulnerável em seu peito, como se de repente o visse como uma fonte de segurança. Namor esperava ser isso a partir de então.

-Shuri - ele murmurou, numa tentativa delicada de acordá-la, se rendendo ao impulso de acariciar sua cabeça.

-Oi? - ela balbuciou confusa, começando a despertar. Mesmo recuperando os sentidos lentamente, logo percebeu onde estava e o que tinha acontecido, no meio da noite, eles se mexeram durante o sono, mesmo com medo e constrangida, acabou ficando paralisada - me desculpe.

-Por que me pede desculpas? - Namor disse sem se mexer também.

-Eu fui parar em cima de você, não costumo me mexer tanto quando durmo - ela se justificou.

-Shuri, está tudo bem, não se preocupe - ele assegurou.

-Tudo bem - ela viu que a situação constrangedora estava resolvida e se levantou com cuidado.

Não conversaram muito na refeição da manhã daquele dia, tentando lidar com o que tinha acontecido. Tinham conversado sobre espaço pessoal, mas nada daquilo tinha sido intencional, então deixaram passar. Quando isso aconteceu de novo, resolveram não se importar mais e apenas aceitar que talvez sentissem muito frio à noite e queriam se aquecer inconscientemente um ao lado do outro.

Os dias se passavam sempre no mesmo ritmo a partir de agora, tornando-se logo em meses, Namor e Shuri sempre acordavam com alguns minutos de diferença, sempre ele primeiro, compartilhavam as refeições juntos e conversavam sobre o que estava acontecendo em Talokan e as novas ideias nas quais Shuri estava trabalhando, mais as coisas novas que estava estudando e descobrindo com alguns anciãos Talokanis.

Conforme o tempo foi passando, ela se percebeu, contente, não era exatamente feliz, mas com certeza, um contentamento, acostumando-se com as pequenas, mas muitas coisas boas que estavam acontecendo.

Finalizando leituras e anotações com Griot, Shuri estava ocupada por um longo tempo, não esperando necessariamente uma visita de seu marido àquela hora do dia.

Ku'kul'kan por sua vez, estava com a mente e o coração ocupados em outro lugar, mas totalmente voltados para sua rainha e esposa.

Nos últimos dias, ele notou que era um dos seus momentos favoritos do dia a observar trabalhar. Tinha decorado as expressões de seu rosto quando estava concentrada, murmurando a si mesma, falando com a inteligência artificial, um pouco das duas coisas se misturando. O sorriso vencedor e a dancinha de comemoração quando uma coisa dava certo, os tapas raivosos que desferia na mesa mais próxima quando algo dava errado. Era de alguma forma encantadora, perfeita no que era seu elemento, o equilíbrio perfeito que ela mesma tinha encontrado entre Wakanda e Talokan.

Vendo-a tão bem assim, prometeu a si mesmo, mais de uma vez, que faria de tudo para vê-la sempre bem e feliz. Um pouco alarmado, notou que o que tinha dito em seu casamento era verdadeiro, o coração dele pertencia a Shuri, mas tinha medo do que isso pudesse implicar se contasse a ela. Sua esposa deixava claro que estava satisfeita com a amizade deles, e ele não a forçaria a nada que não quisesse.

O sentimento era novo para ele, talvez o amor em uma nova faceta, se apresentando numa nova forma. Ele amava seu povo e amava a mãe que tinha partido há muito tempo atrás, mas não sabia com certeza se o que sentia por Shuri era amor. Se algo ou alguém a tomasse de sua vida naquele momento, tinha certeza de que se sentiria vazio, sem sentido, nunca mais voltando a ser o homem que era, que a presença dela o havia feito se tornar.

Respirando fundo e de olhos fechados, ele se levantou, decidido a controlar seus sentimentos, principalmente quando estava a caminho de vê-la agora, depois de sua última refeição juntos.

-Majestade, o rei se aproxima - Griot avisou Shuri, a fazendo finalizar suas últimas anotações e análises.

-Sério? Eu nem percebi quanto tempo estava aqui... - ela murmurou em voz alta, se dando conta de quanto tempo tinha passado.

-Olá, espero não estar te atrapalhando - Namor entrou no laboratório, sentindo o sentimento de encanto e admiração crescer dentro dele ao observá-la, esforçando para escondê-lo em algum lugar em si de alguma forma.

-Não, não está, eu estava quase terminando - ela admitiu, dando de ombros e se inclinando sobre o balcão mais próximo - como é que foi seu dia?

-Tranquilo, sem muitas preocupações, vistorias e relatórios de rotina - ele explicou, sorrindo.

-Todos os dias são assim, não são? - Shuri refletiu - seguindo um certo padrão, não me entenda mal, eu gosto disso, de verdade, mas às vezes sinto falta de algumas coisas, coisas triviais.

-Como o que, minha rainha? - aquilo chamou a atenção de Namor e todo seu interesse.

-Eu não sei, assistir um filme, comer algo que não fosse frutas e peixe, não que eu esteja sendo ingrata, a comida daqui é uma delícia, são só pequenas saudades, entende?

-Sei que é difícil se adaptar a um mundo novo completamente diferente do seu, mas está conseguindo bem, se me permite dizer - ele comentou - ainda assim Shuri, se quiser visitar seu mundo, seu mundo de origem, fique à vontade.

-Não é má ideia, mas pelo jeito que você fala quer que eu vá sozinha, eu não queria, bem, ir sozinha, não quer ir comigo? - ela convidou, não querendo deixá-lo para trás.

-Eu no mundo da superfície? Bem, nunca fiquei mais tempo que necessário por lá, além disso andar como um talokani por aí chamaria muita atenção, não acha? - ele ponderou a proposta, com argumentos esquivos.

-Olha, não precisamos ir muito longe, podemos visitar o México mesmo, bem aqui perto, qualquer cidade portuária, podemos sair pra jantar, experimentar algo novo - Shuri elaborou, fixando os problemas que ele apontou - vamos, por favor, vai ser legal, eu não quero te deixar sozinho.

As palavras dela tiveram um efeito impactante no coração de seu marido, comovido em como tudo que estava claro na fala dela era que Shuri desejava por sua companhia. Querendo agradá-la mais uma vez, cedeu ao seu pedido.

-Eu irei onde minha rainha for - disse formalmente, chegando a inclinar a cabeça para ela.

-Não precisa me tratar assim, pelo menos, agora não - ela riu e então achou melhor se recompor - obrigada por isso.



A/N: Já que eu fiquei bem ausente essa semana, está aí mais um capítulo! Muito obrigada por lerem!

Grãos de Areia à Beira MarWhere stories live. Discover now