Prólogo - Devil

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PALERMO, SICÍLIA, ITÁLIA.

O homem deixou um suspiro escapar do fundo de sua garganta e tirou os óculos escuros que escondia um pouco de seu rosto. Com um sorriso no canto dos lábios, levantou a cabeça e encarou o sol brilhante com os olhos estreitos, era bom sentir uma temperatura mais quente.

Há quanto tempo não sentia um sol tão quente — comparado à Inglaterra, onde vivia — esquentar-lhe o corpo daquela forma rápida e deliciosa? Era relaxante. Ainda mais depois de tudo o que vivera e sentira.

Férias. Isso, ele precisava de férias. Precisava afastar-se de todo aquele mal que o cercava. Por isso estava ali, em Palermo; para tirar férias, livrar-se de todos, sentir-se bem, recuperar-se. Tinha sequelas de coisas de alguns meses atrás e eram coisas que ele pretendia esquecer.

Queria focar em outra coisa — pelo menos nos próximos dois anos —, estava cansado de se esconder, de passar-se de infeliz por aí a fora. Queria viver! Ser feliz! Queria sorrir normalmente, queria conhecer as praias, passear pelos campos, sentir o cheiro do mar, correr na areia, jogar bola, tomar sorvete e brincar como nunca tivera direito antes.

Quem sabe, depois disso tudo, passar no Vaticano e conhecer as Igrejas tão bem arquitetadas. Conhecer alguma mulher interessante o suficiente para esquecer-se dos amores do passado também seria uma boa ideia.

As italianas eram lindas e ele se sentiria honrado em conseguir uma para si.

Uma moça parou em seu lado e, com um sorriso angelical nos lábios, fitou-o com curiosidade.

— Olá — ele disse em um tom de voz calmo, o qual nem ele mesmo reconhecera. Desde quando era tão sereno?

O que uma mulher bonita não faz...

— Olá — ela respondeu no mesmo tom de voz, abrindo mais seu sorriso. — Seja bem-vindo.

— Obrigado — ele mordeu o lábio inferior e pegou as malas no chão. — Isso é tudo...

— Nosso? — ela o interrompeu e soltou uma risada fraca, mas melodiosa. — Sim, nosso. Quando digo nosso — ela o encarou por mais alguns segundos e virou-se para o portão novamente ao voltar a falar: — É nosso de verdade!

— Certo. Você é a... — ele murmurou arqueando uma das sobrancelhas e a garota riu, novamente.

— Amanda. Amanda Jeon. — Ela sorriu e jogou os cabelos loiros para o lado. — Não me conhece porque eu era um bebê na última vez que você veio aqui — ela sorriu novamente, com seus lábios rosados e bem desenhados, atraindo a atenção do mais velho.

— Creio que sim — ele murmurou mordendo o lábio inferior e pouco se importando se a pequena italiana ali era sua prima.

Até um ano atrás nem sequer sabia que ainda tinha parentes por aí. Pouco importava se eram parentes ou não, aquela garota era linda. De verdade.

— Papá!¹ — a garota gritou assim que cruzaram o enorme portão de ferro do local. — O primo inglês chegou! — ela gritou novamente, com seu italiano soando de uma forma tão perfeita e serena que, naquele momento, o homem sentiu-se perdido e com uma enorme vontade de aprender o italiano para falar tão bem quanto ela.

O sotaque era tão lindo, na voz suave de Amanda, então...

— Oh! — o mais velho exclamou enquanto caminhava calmamente na direção do rapaz e da filha. — Bem-vindo! — exclamou novamente, enquanto sorria e puxava o homem para um abraço caloroso, fazendo-o torcer o nariz disfarçadamente.

Não gostava de calor humano. Não era chegado a abraços.

— Obrigado — agradeceu, timidamente.

Não entendia italiano perfeitamente bem, mas sabia que o velho havia lhe dado boas-vindas.

O velho soltou os ombros largos do mais novo convidado e passou a caminhar ao seu lado, ainda sorrindo. Família feliz, pensou, enquanto corria os olhos por todas as pessoas que surgiram no local assim que ele fora anunciado.

Gostava de público. Público sempre fora seu forte. Público lembrava poder, que lembrava passado, que lembrava tudo o que ele queria — ou teria de — esquecer que viveu. Mas, claro, não podia nem iria negar que ele estava no poder agora.

Ele era o chefe. Não chefe de uma coisa qualquer, não se mudaria para Itália somente por querer um pouco de paz e felicidade. Isso seria somente nos próximos dois anos. Uma trégua, talvez.

Uma trégua de algo que aquela família nem sequer desconfiava. É o que todas as mães dizem para seus filhos: Não confie em estranhos.

O homem deixou um sorriso se formar no canto de seus lábios quando conseguiu observar algo brilhar no topo do telhado da casa, uma coisa tão... escondida. Ninguém ali seria capaz de notar o que ele notou, nem mesmo o melhor segurança daquela casa!

Um leve aceno de cabeça. Bastou isso.

Silenciosa, rápida e fatal.

Essas são as três palavras que definem o que viria a seguir.

Silenciosa.

Rápida.

Fatal.

Mais um sorriso disfarçado.

Aquilo fora o suficiente. Em questão de segundos, o velho, pai de família, estava caído ao chão com uma das mãos sobre o peito, enquanto respirava ofegante. Horror era o que rondava aquele quintal.

Todos tinham olhos extremamente arregalados e gritos desesperadores escapavam de suas gargantas. O homem, convidado, como estava mais próximo do mais velho, ajoelhou-se o mais rápido que conseguira e se aproximou do homem, engolindo em seco ao observar o que havia sob a mão do mais velho.

Sangue.

Era sangue o que havia sob a mão do velho! Fora um tiro certeiro e quase impossível de se notar, se não fosse pelo sangue que jorrava com força e um pouco mais de rapidez que o normal.

As mulheres presentes tinham os olhos arregalados e lacrimejantes, gritos e mais gritos eram ouvidos. Desespero. Medo. Pavor. Escuridão. Gritos.

Morte. Poder.

Há quanto tempo ele não via aquelas palavras e sensações? Um ano? Fora o suficiente para sentir saudades. Pose de bom moço não era para ele. O velho estava fora do caminho. O poder era dele.

A verdade, bem, a verdade não viria à tona. Só se o velho revivesse. Mas isso não era possível.

Era tudo dele. Mas precisava confessar: estava morrendo de pena de ver os olhos de Amanda — tão azuis, tão bonitos, intensos e brilhantes — derrubarem tantas lágrimas desesperadas daquela forma.

Ela ficava tão mais bonita sorrindo! Mas quem se importava? Ele não... nem quem estava com ele.

Uma das mulheres se abaixou ao seu lado, mostrando tanto medo e desespero quanto as outras, mas algo nela a diferenciava. Uma pequena tatuagem no dedo indicador, talvez fossem seus olhos extremamente verdes e traiçoeiros.

Ou pelo simples fato dela ser uma antiga conhecida e ninguém sequer desconfiar, assim como não desconfiaram do atirador no topo da casa.

— Bem-vindo, Jeon — ela sussurrou antes de levantar-se e secar as lágrimas.

Pull Me In - Fire (Liskook) - Livro 2Where stories live. Discover now