Capítulo 2

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Faltava pouco mais de dez minutos para que o relógio desse sua última volta completa naquele ano. Em cada canto daquela casa havia riso, satisfação e deleite. Todos se encontravam eufóricos, esperando animados a chegada do novo ano.

A mesa estava farta e os corações também. Mesmo depois de um ano cheio de contratempos e reveses, ali estavam eles juntos, unidos e não só por que queriam manter uma tradição, mas porque o companheirismo e a união eram uma das coisas que mais presavam.

Yolanda, a matriarca dos San Roman, não conseguia esconder a emoção de ver todos os seus juntos, e nem queria. Suas filhas, seus netos, bisnetos, e ainda tinham os agregados, que ela fazia questão de demonstrar seu afeto como se tivessem seu próprio sangue.

Yolanda se considerava uma mulher afortunada por, sem fazer o menor esforço, conseguir juntar seus familiares para aquele festejo, e todo ano, ali estavam eles reunidos na casa de Fany, sua filha mais velha e mãe de quatro dos seus nove netos.

Para a senhora de setenta e tantos anos, não havia dinheiro no mundo que comprasse momentos como aquele.

— Semana passada, durante a ceia de Natal, me perguntei: será que a beleza da minha esposa ainda vai conseguir me surpreender? Hoje tive a resposta: sim – Eduardo, galante, comentou com o rosto a centímetros do rosto dela.

Maria riu.

Depois de passarem algum tempo daquela noite jogando conversa fora com os outros convidados, os dois resolveram se afastar do aglomerado.

No jardim, onde tudo estava mais calmo, eles podiam se ouvir sem esforços, além de apreciarem a presença um do outro.

— Semana passada – Maria, rodeando os braços em seu pescoço, seguiu a mesma linha de raciocínio – quando você disse isso, me perguntei: será que um dia a bobeira do meu marido vai deixar de me surpreender? Já tenho a resposta e é não.

Eduardo deixou uma gargalhada calorosa escapar.

— Nem acredito que este ano está terminando – continuou ele mais sério, depois de ter controlado a crise de riso – foi um ano daqueles, mas cá estamos, às portas de iniciarmos tudo de novo.

Maria o fitou durante um tempo, sorrindo. Eduardo era do tipo que gostava de filosofar sobre a vida, e ela amava ouvi-lo.

— O que você deseja para esse novo ano? – indagou, com os olhos fixos nos dele, quase inexpressivos.

— Nada – deu de ombros, ajeitando suas mãos que estavam ao redor da cintura da esposa.

— Nada? – encrespou o cenho.

— Nada. Para quê vou querer algo se a única coisa que preciso está diante de mim?

Maria tentou, mas não conseguiu resistir que um sorriso convencido tomasse conta dos seus lábios.

Estava com Eduardo há algum tempo, mas ainda não se acostumara com a forma que ele a deixava com as pernas bambas apenas dizendo algumas palavras.

Maria não tinha como rebater aquele comentário, então a coisa mais sensata que poderia fazer era beijá-lo, só que Yolanda apareceu de repente, cortando todo o clima.

— Vocês acreditam que Fany está que nem um sargento vigiando a mesa e está praticamente rosnando para quem se aproxima dela? – despejou a senhora sem rodeios e nem um pouco satisfeita.

O casal se desvencilhou, passando a olhar a mais velha de frente.

— Pensei que já estivesse acostumada, vó – Eduardo disse, se segurando para não rir. – A senhora sabe que tia Fany só nos deixa comer à meia noite.

Arde Outra Vez Where stories live. Discover now