Capítulo 8

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Estevão despertava em Maria seus piores demônios, acabara de descobrir isso, descobrira também que gostava disso.

Não havia uma explicação lógica para tal. Ele simplesmente apreciava vê-la com a feição conturbada, com a face vermelha pela ira que ele havia causado. Certamente esse era um dos pequenos prazeres da vida.

Acompanhou-a com os olhos até que a perdesse de vista, e ficou pensando que havia um ponto negativo naquilo que ela o propusera (na verdade o intimou).

Se ele tivesse que ignorá-la, não poderia provocá-la, então como se divertiria às custas dela? Não se divertiria. Enfim, a vida às vezes poderia ser bem injusta.

Mas não estava pensando em passar por cima da ordem dela, mesmo que se coçasse para isso. Embora fosse um babaca (palavras dela, não dele), costumava ter palavra, e iria honrar com o acordo. 

Se tivesse pensado nos contras, talvez descartaria palavra por palavra dita por Maria, mas sua mente estava focada em apenas vê-la com o rosto em chamas. Para seu azar, aquela havia sido a última vez.

— Ouvi a conversa de vocês.

Carmen apareceu do nada, interrompendo seus pensamentos, com um ar nada feliz.

Se Estevão havia se assustado com sua entrada repentina, soube disfarçar bem.

— Mãe – disse ele, engolindo a seco. – Que bom que a senhora ouviu – tentou driblar a mãe com a voz mole. – Viu só como sua queridinha falou comigo? – ele sentou-se no sofá onde antes estava jogado, fazendo-se de vítima.

Carmen o encarou com os olhos estreitos e parou bem na sua frente.

— Estevão, estou sabendo o que andou acontecendo entre você e Maria.

— Não aconteceu nada entre mim e Maria – debochou.

— Onde você estava com a cabeça quando a levou naquele hospital? – antes mesmo de ele formular uma frase, ela já falava de novo. – Você enlouqueceu? Acaso esqueceu que ela está grávida?

— Claro que não esqueci, e mesmo se quisesse, vocês não me deixariam esquecer. Além do mais, só quis fazer uma brincadeirinha.

Foi nesse momento que Carmen esteve à beira de uma síncope.

— Brincadeirinha? Que tipo de médico é você?

Estevão perdeu a fala. Nada que dissesse seria suficiente para se defender.

— Não sei que problema você tem com ela, mas quero que saiba que Maria não é apenas uma nora para mim, ela é como uma filha.

No instante que a mãe começou com aquele discurso, ele soube que havia perdido, mesmo que não tivesse certeza de que estava em algum tipo de duelo.

— Sempre quis ter uma filha, assim como suas tias – continuou; Estevão não soube dizer se os vestígios de lágrimas nos olhos da mãe eram reais ou apenas para fazê-lo sentir culpado. – Mas não aconteceu assim. Claro que sempre fui muito grata pelos meus dois filhos, mas a vida tratou de colocar alguém no meu caminho – abriu um largo sorriso.

— Tem certeza que Maria é esse presente? Presente de grego, hein – caçoou.

Às vezes Carmen sentia uma enorme vontade de esganar o filho mais novo. Aquela era uma delas.

— Maria não está nesta casa como uma intrusa, ela faz parte desta família, e quero que ela seja tratada como tal.

— Acabou, mãe?

— Estou muito decepcionada com você, Estevão, muito – frisou, para deixar claro o quanto ele havia pisado na bola. – Não sei qual seu problema com Maria, mas tenho certeza de uma coisa.

Arde Outra Vez Where stories live. Discover now